Circula nas redes sociais uma publicação que alega que existe uma relação entre a administração de vacinas e o recente aumento do número de casos de monkeypox (Mpox). “A vacina ativando a doença do macaco”, lê-se na publicação. “Quem tiver contacto com infetado deve-se vacinar.”
“Todos estão quase vacinados, os não vacinados terão contacto com os vacinados e isso significa que os não vacinados serão obrigados a tomar vacina”, diz ainda a publicação. “É uma boa jogada, OMS.”
A publicação segue a mesma linha de milhares de outras publicações que propagam uma teoria da conspiração bastante conhecida: a de que existe a intenção por parte de uma suposta elite global (representada neste caso pela OMS) de administrar vacinas à generalidade da população mundial para a controlar. Vários mitos sobre vacinas já foram amplamente desmentidos pela comunidade científica, incluindo os de que as vacinas alteram o ADN, servem para implantar microchips nas pessoas ou, no limite, destinam-se a matar pessoas.
Neste caso em concreto, a publicação parece sugerir que existe um efeito circular: a vacina contra a Mpox foi concebida para ativar a doença nas pessoas para que, depois, mais pessoas sejam vacinadas (já que existe a recomendação de que a vacina deve ser administrada a quem tem contacto com infetados).
Contudo, trata-se de uma alegação ilógica.
Vejamos: as publicações sobre a Mpox têm surgido nas últimas semanas, na sequência das notícias recentes em torno do surto da doença identificado num conjunto de países africanos. O mais recente surto da doença foi inicialmente detetado na República Democrática do Congo — com 27 mil casos registados e mais de mil mortes. A OMS decidiu este mês classificar este surto como emergência internacional de saúde pública, depois de a doença ter começado a disseminar-se para outros países, tanto em África como fora daquele continente.
Contudo, ao contrário do que aconteceu com a Covid-19, a Mpox é uma doença conhecida há várias décadas. A comunidade científica investiga este vírus há vários anos e existem há muito tempo tratamentos e vacinas para ele.
Neste momento, a indicação da OMS é a de que não haja vacinação em massa contra a Mpox, mas apenas sejam vacinadas as pessoas em que é identificado um risco específico — nomeadamente pessoas que tenham de viajar para zonas onde haja um surto ativo ou que tenham tido contacto próximo com pessoas infetadas.
A OMS explica também que a imunização demora várias semanas a fazer efeito e que a vacina não impede uma pessoa de apanhar o vírus, embora reduza a gravidade da doença. As vacinas contra a Mpox têm efeitos secundários bastante bem documentados pela literatura científica — nenhum deles é o desenvolvimento da própria doença, embora alguns possam coincidir com sintomas da doença, incluindo dores de cabeça, vermelhidão, náuseas, entre outros.
Ao mesmo tempo, a afirmação é ilógica por outra razão: ao contrário do que aconteceu com a Covid-19, não existe uma campanha de vacinação em massa contra a Mpox. O número de pessoas vacinadas contra a Mpox situa-se nos milhares, dezenas de milhares ou centenas de milhares, consoante as regiões do mundo, muito longe da ideia de uma vacinação global em todo o planeta. Em Portugal, por exemplo, nos últimos dois anos tinham sido apenas vacinadas 9300 pessoas.
Por outro lado, esta publicação parece ser uma versão modificada de uma outra publicação viral que correu as redes sociais nas últimas semanas, alegando que a Mpox era provocada pela vacina contra a Covid-19. Essa publicação terá tido origem numa entrevista de um médico alemão em 2022 — que deu origem a uma das afirmações falsas mais disseminadas dos últimos dois anos. A informação já foi desmentida várias vezes, como pode comprovar aqui.
Conclusão
Não é verdade que a vacina contra a Mpox esteja a causar a própria doença como parte de uma conspiração para aumentar o número de infetados e, por conseguinte, o número de vacinados. A literatura científica é abundante sobre os efeitos secundários da vacina da Mpox. Além disso, a estratégia de vacinação atualmente em vigor não é compatível com a ideia de uma vacinação em massa da população mundial. Por outro lado, não é a primeira vez que surgem informações falsas sobre a Mpox como resultado de uma vacina: antes, tinha sido difundida a ideia falsa de que a vacina contra a Covid-19 provocava a Mpox, uma informação também desmentida.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.