Uma publicação no Facebook alega que, à boleia da vacinação contra a Covid-19, está em curso um processo de “transhumanismo” que assenta numa estratégia: “Estão colocando nanopartículas com G*R*A*F*E*N*O nas v*cin*s, nas máscaras, nos cotonetes do teste da CONVIDE 19, nos alimentos, etc.”, refere o post. Mas, mesmo sem nos determos sobre a alegada tese de transhumanismo — com a ideia de superação dos limites humanos através do recurso à tecnologia —, há um ponto central que não corresponde à verdade: as vacinas que estão a ser administradas não contêm grafeno.
Na verdade, a autora da publicação também não explica como chegou a essa informação nem de que forma ela pode ser confirmada. Mas lança um desafio: “Repare na imagem em que um um modelo masculino está desfilando, cheio de metais grudados ao seu corpo… Ela é de 2017!!! Tudo o que está acontecendo foi planejado com muita antecedência!”
Avançando para o ponto central do post (a ideia de que as vacinas contêm grafeno e que estão a ser usadas num plano de reconfiguração do corpo humano), recentemente, o Observador verificou a possibilidade de as vacinas que estão a ser administradas na União Europeia conterem algum tipo de metal ou microchip. Afastada essa hipótese (também defendida nesta nova publicação), esse Fact Check também partilhava, entre outros dados, os links para a informação sobre a composição da vacina da Pfizer/BioNTech, da AstraZeneca, da Janssen e da Moderna.
Fact Check. Teste do íman prova que vacinas contra a Covid-19 servem para implantar um microchip?
Ora, consultando a lista de ingredientes que compõem cada uma das vacinas, percebe-se que não há registo da presença de grafeno em nenhuma delas.
Isso mesmo é confirmado pelo professor associado da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa Hélder Mota Filipe. Ao Observador, o especialista reconhece que “não é verdade que estejam a ser colocadas nanopartículas suspeitas nas vacinas e muito menos que essas nanopartículas sejam de grafeno”.
Isolado pela primeira vez em 2004 pela dupla de cientistas da Universidade de Manchester, Andre Geim e Konstantin Novoselov — de resto, esse feito valeu-lhes o Nobel da Física, em 2010 —, o grafeno passou a ter várias utilizações no campo clínico.
Já em 2016 o Observador tinha dedicado atenção a este composto. Num artigo publicado em Janeiro desse ano, o físico da Universidade do Minho Nuno Peres explicava que “o grafeno é um material que tem inúmeras aplicações — dependendo das suas propriedades — na medicina, eletrónica, optoeletrónica, nas células solares ou em materiais compósitos – para produzir materiais mais resistentes.
Qual é coisa qual é ela que é mais forte que o diamante? É o grafeno
No mesmo texto destacavam-se as características mais singulares do grafeno, como o facto de os átomos de carbono estarem organizados numa estrutura bidimensional (sendo, aliás, o único material que se conhece com esta propriedade, ser o mais leve e mais forte de todos os materiais conhecidos (cerca de 300 vezes mais forte que o ferro), ser um material transparente visível a olho nu, composto por folhas maleáveis e um bom condutor de calor e de corrente elétrica.
Várias utilizações possíveis mas, como já vimos, as vacinas não são um dos fins a que este material se destina. E, ao mesmo tempo, também não é verdade que o grafeno tenha propriedades magnéticas, como defende a publicação aqui em análise.
Ao site de verificação de factos espanhol Newtral, o catedrático de Química Orgânica da Universidade de Santiago e Compostela Diego Peña garantia que, de uma forma geral, o grafeno “não tem propriedades magnéticas” como as de que se fala quando se pensa num íman de dimensões consideráveis. O grupo de que o investigador faz parte conseguiu, de facto, identificar um estado magnético numa estrutura triangular do grafeno (recordemos as suas propriedades maleáveis), mas isso decorreu em ambiente laboratorial e num nível molecular — e não é replicável em contexto quotidiano.
Conclusão
Dois pontos centrais nesta verificação: nenhuma das vacinas disponíveis na União Europeia contêm grafeno e esse material também não contêm as propriedades magnéticas que a publicação analisada lhes atribui.
O post parte desses dois pressupostos para defender a tese de que o processo de vacinação tem na sua origem um plano de “transhumanismo”, ou seja, de transformação física do corpo humano como forma de superação dos seus limites naturais. Mas os pressupostos não se verificam e, assim, a tese final também não está sustentada.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
De acordo com o sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook.