“A Terra pode ficar um ano inteiro sem Internet.” O aviso é partilhado por várias publicações nas redes sociais, que explicam que a razão para isso acontecer seria o Sol. Ou, de forma mais detalhada: a NASA terá enviado um “equipamento de análise” que recolheu informações sobre o Sol, informações sobre “ventos solares” capazes de causar uma “tempestade magnética” na Terra. E o efeito seria cortar a “Internet e linhas telefónicas” em todos os aparelhos eletrónicos e até em satélites.
Mas há algum fundamento para a teoria que está a circular nas redes sociais? A NASA lançou em 2018 a sonda Parker Solar Probe, que se tornou a primeira sonda espacial a “tocar” no Sol, ao explorar a camada externa da atmosfera da estrela, que é mais quente do que a superfície. A NASA explica que é dessa superfície que saem partículas energéticas, como eletrões e protões, que podem “afetar comunicações e satélites”.
Ainda, assim e apesar de não ter sido o objetivo da missão da NASA na atmosfera do Sol, haverá ou não risco de a “Terra ficar um ano sem Internet”? Os receios de haver um corte nas comunicações, por causa de “tempestades solares” não é desprovido de contexto. A NASA tem avisado, desde 2009, para o risco de ventos e explosões na atmosfera solar poderem causar estragos nas redes elétricas do nosso planeta. Tal já aconteceu em 1859, quando uma “tempestade solar” desencadeou uma reação eletromagnética forte o suficiente para cortar linhas de comunicação e começar incêndios. Ora, a Internet apenas viria a ser inventada mais de 100 anos depois e, lendo os avisos da NASA, não encontramos qualquer menção do risco de um corte, de um “apagão” ou de um “apocalipse” da Internet, como é sugerido nas redes sociais.
E o que dizem os especialistas? O astrónomo José Augusto Matos estuda o espaço há quase 30 anos e não tem dúvidas. O risco de “ventos solares” cortarem o acesso à internet no planeta Terra “não faz grande sentido”. E reduz a teoria que circula nas redes sociais a “fake news” e “fantasias sem qualquer evidência científica“. Ao Observador, José Augusto Matos explica que o planeta Terra está protegido pelo campo magnético terrestre da grande maioria das partículas emitidas pelo Sol. Podem existir algumas perturbações, mas nunca no cenário “catastrófico” que é apontado por algumas publicações no Facebook.
As preocupações com um “apagão” na Internet começaram a surgir depois de o estudo “Solar Superstorms: Planning for an Internet Apocalypse“, escrito por um investigador da Universidade da Califórnia, ter sido publicado. O estudo sugere que uma grande tempestade solar poderia “danificar gravemente os cabos da Internet” — especificamente os cabos debaixo do mar que ligam continentes e ajudam a alimentar a Internet global.
Em declarações ao jornal norte-americano The Washington Post, a autora deste estudo, Sangeetha Abdu Jyothi, lamentou ter utilizado o termo “Apocalipse da Internet” pela atenção que suscitou nas redes sociais. Voltamos a recorrer à explicação de José Augusto Matos, que aponta que, apesar de o estudo ter sido apresentado em 2021, não chegou a constar em “nenhum periódico revisado por pares“, ou seja, não é subscrito por nenhum outro especialista nem é aceite como universalmente válido na comunidade científics.
Conclusão
Não há nenhuma sustentação para a teoria que está a circular nas redes sociais. “Tempestades” e “ventos solares” existem, como sempre existiram e já causaram fortes impactos no planeta Terra. Uma possível perturbação nos serviços de comunicação é admitida pela NASA e por especialistas ouvidos pelo Observador, mas tal não deve ser confundido com um “apocalipse da Internet”.
Apenas uma académica, Sangeetha Abdu Jyothi, admitiu essa possibilidade. Mas veio, pouco mais tarde, lamentar ter escolhido a expressão “apocalipse da Internet” pela atenção que ganhou nas redes sociais.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.