Sinto a maior solidariedade com a Ucrânia e a presente situação causa-me a maior apreensão. Todos nós vemos a vaga de genuína de amizade, solidariedade e generosidade e a forma espontânea como os povos abraçam esta causa.

Há dias fui a uma repartição pública, onde trabalha uma ucraniana. Perguntei-lhe como estava a família e disse-me que a avó vivia em Mariupol e não tinha notícia há dias. Não há energia, telemóvel, não pode sair da cidade. Disse-lhe que ia rezar pela avó (objectivamente não posso fazer mais).

A situação da Ucrania hoje faz-me lembrar o cerco de Budapeste pelas tropas soviéticas em 1944 e a revolução de 1956. Em 1944 o meu Pai estava em Lisboa e tenho a correspondência enviada e recebida durante a Guerra. Quando se fecha o cerco, nota-se a ausência de correio e de notícias, a angústia, a incerteza e por fim a alegria da primeira carta recebida após a rendição. Espero que a menina ucraniana da repartição tenha a mesma alegria.

Em 1956 os húngaros revoltaram-se contra a ditadura comunista soviética. Após uns dias de Liberdade, os tanques do pacto de Varsóvia arrasaram a revolução. Nas semanas seguintes 10 por cento da população abandonou o país.

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Hoje, 15 de Março, celebra-se a igualmente a revolução húngara de 1848 no âmbito da primavera dos povos. As aspirações à liberdade foram reprimidas pelas tropas do Czar e pelo General Radestky (o da marcha Radestky do pacifico concerto de ano novo em Viena). Os vencidos exilaram-se e em 1951 o General Kosuth foi recebido em Lisboa, sendo até publicada gravura que anexo.

Há uma enorme semelhança entre as três situações, as vagas de solidariedade foram semelhantes, a indignação internacional, o acolhimento e não posso deixar de louvar os portugueses de hoje, de 56 e de 48.

Olhando para 1956 lembro as emissões da Radio Free Europe, emitidas da RARET em Glória do Ribatejo e o incitamento à luta e resistência: “Keep on fighting we are supporting you.”. Noto a abissal diferença entre as promessas de apoio e a total ausência de apoio efectivo. Sem qualquer margem para dúvidas foram promessas falhadas, falsas esperanças… enfim.

A Ucrânia está a ser arrasada, há mortos todos os dias. Olho para as fotografias românticas de 1956 com estudantes universitários a lutar e penso na esperança, coragem, juventude, idealismo e justiça da luta. Foram literalmente carne para canhão, mas não morreram em vão. Os acontecimentos de 1948 e 1956 são feriados nacionais.

Hoje infelizmente voltamos a ter guerra na Europa e a reviver os seus horrores. Tenho medo que a atitude dos media nesta nova era seja igual à da Radio Free Europe. “Plus ça change, plus c’est la même chose”.