Ontem, em Roma, o Papa Francisco houve por bem consagrar a Rússia e a Ucrânia ao Imaculado Coração de Maria, durante uma celebração na Basílica de São Pedro, em comunhão com os Bispos de todo o mundo.
No dia 25 de Março celebra-se liturgicamente a solenidade da Anunciação do Anjo São Gabriel à Virgem Maria, precisamente nove meses antes do Natal. Ontem foi também o aniversário da consagração feita em Roma, em 1984, diante da imagem original de Nossa Senhora de Fátima, por São João Paulo II, com a participação do episcopado mundial, em cumprimento do pedido feito pela Mãe de Jesus à Irmã Lúcia e que ainda não tinha sido realizado validamente, não obstante as consagrações feitas pelos Papas precedentes e, até, pelo próprio Karol Wojtyla.
A Conferência Episcopal Portuguesa, através de um comunicado do passado dia 18, não só se uniu,“em profunda comunhão com o Santo Padre”, à consagração da Rússia e da Ucrânia ao Imaculado Coração de Maria, como anunciou que Francisco enviou “a Fátima, como Legado Pontifício, o Cardeal Konrad Krajewski, Esmoler Apostólico”, o qual fez, em simultâneo com o Papa, a mesma consagração na Capelinha das Aparições, na presença dos Bispos portugueses e de alguns milhares de peregrinos.
Na aparição de 13 de Julho de 1917, na Cova da Iria, Nossa Senhora disse aos pastorinhos: “Deus quer estabelecer no mundo a devoção ao meu Imaculado Coração. Se fizerem o que eu vos disser, salvar-se-ão muitas almas e terão paz. A guerra vai acabar, mas, se não deixarem de ofender a Deus … começará outra pior. (…) Para a impedir, virei pedir a consagração da Rússia a meu Imaculado Coração e a Comunhão reparadora dos primeiros sábados. Se atenderem a meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz; se não, espalhará seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja; os bons serão martirizados; o Santo Padre terá muito que sofrer; várias nações serão aniquiladas. Por fim, o meu Imaculado Coração triunfará. O Santo Padre consagrar-me-á a Rússia que se converterá e será concedido ao mundo algum tempo de paz.”
De facto, a primeira Guerra Mundial terminou pouco depois, em 1918, e, em 1939, começou “outra pior”. Porque não se fez a pedida consagração ao Imaculado Coração de Maria, a Rússia espalhou os “seus erros pelo mundo promovendo guerras e perseguições à Igreja” e “várias nações” foram efectivamente “aniquiladas”.
Embora já a 13-7-1917 Nossa Senhora tenha aludido à consagração da Rússia ao seu Imaculado Coração, quando ainda nem sequer se tinha dado a revolução bolchevique dita de Outubro, mas que, segundo o nosso calendário, aconteceu em Novembro desse ano, também então disse que só mais tarde pediria essa consagração, o que efectivamente aconteceu em Tuy, a 13 de Junho de 1929.
Com a implantação da República em Portugal, os bispos diocesanos foram desterrados das suas dioceses, os feriados religiosos foram suprimidos e as ordens religiosas foram expulsas do país, nomeadamente a Companhia de Jesus, que já o tinha sido antes, pelo Marquês de Pombal. Por este motivo, Lúcia, a sobrevivente das aparições de Fátima, teve de emigrar para a vizinha Galiza, para aí poder professar como religiosa doroteia. Também em Tuy lhe apareceu Nossa Senhora.
No dia 13 de Junho de 1929, estando a Irmã Lúcia a fazer a sua oração noturna na capela do seu Convento, foi testemunha de mais um acontecimento sobrenatural: “De repente, iluminou-se toda a capela com uma luz sobrenatural e sobre o altar apareceu uma cruz de luz que chegava até ao teto. Em uma luz mais clara, via-se na parte superior da cruz uma face de homem com o corpo até à cinta (eterno Pai), sobre o peito uma pomba de luz (Espírito Santo) e pregado na Cruz, o corpo de outro homem (Filho).”
A Irmã Lúcia disse que, nesta ocasião, “suspenso no ar, via-se um cálix e uma hóstia grande, sobre a qual caíam algumas gotas de sangue, que corriam pelas faces do crucificado e duma ferida do peito. Escorrendo pela hóstia, essas gotas caíam dentro do cálix.” A hóstia é a partícula de pão não fermentado que, na celebração da Eucaristia, se converte verdadeiramente no Corpo de Cristo. Inúmeros milagres eucarísticos atestam, cientificamente, esta inexplicável presença real, verdadeira e substancial de Jesus Cristo na hóstia consagrada.
A vidente de Fátima viu também que, “sob o braço direito da cruz, estava Nossa Senhora com o seu Imaculado Coração na mão … Sob o braço esquerdo umas letras grandes, como se fossem de água cristalina que corresse para cima do altar, formavam estas palavras: ‘GRAÇA E MISERICÓRDIA…’ Depois, Nossa Senhora disse-me: ‘É chegado o momento em que Deus pede para o Santo Padre fazer, em união com todos os Bispos do mundo, a consagração da Rússia ao meu Imaculado Coração, prometendo salvá-la por este meio’.”
Esta consagração da Rússia, pelo Papa São João Paulo II, foi feita em Roma, a 25-3-1984, “em união com todos os Bispos do mundo”, e teve um efeito espectacular: duas semanas depois, a 11-4-1984, Mikahil Gorbachov foi eleito segundo secretário do Partido Comunista soviético e, um ano depois, a 23-4-1985, com a morte de Chernenko, passou a líder da URSS, como primeiro secretário. Começou então a ‘perestroika’ (reforma) e a ‘glasnot’ (transparência), que levaram à extinção do comunismo na Rússia e à sua reevangelização: desde então, foram baptizados milhões de russos e construíram-se mais de 20 mil igrejas. À implosão do comunismo soviético seguiu-se a libertação de todos os países do pacto de Varsóvia. Quis a ironia do destino ou, melhor dizendo, a Providência divina, que o regime que, supostamente, se propunha construir um mundo novo através do proletariado, fosse derrubado pelo proletariado: o sindicato Solidariedade, chefiado por um operário, Lech Walesa, que levou à queda do comunismo na Polónia e, depois, na Rússia e em todo o Leste da Europa.
É particularmente significativo que essa repentina mudança, ou conversão, tenha acontecido, graças a Deus, sem violência. É igualmente de realçar que, à época, nenhum politólogo ou comentador previu a queda dos regimes comunistas da Rússia e do Leste europeu. A natureza pacífica dessa transformação e a sua absoluta imprevisibilidade abonam, certamente, a favor do seu carácter sobrenatural.
A 13-7-1917, Maria tinha dito: “O Santo Padre consagrar-me-á a Rússia que se converterá e será concedido ao mundo algum tempo de paz.” Se a conversão da Rússia é a sua libertação do jugo comunista, já ocorreu, mas se for o seu regresso à comunhão eclesial católica, de que se separou no fim do primeiro milénio da era cristã, ainda está por acontecer. Também ainda não se alcançou o tão desejado “tempo de paz”, pelo que não será temerário desejar que esses venham a ser os efeitos da consagração da Rússia e da Ucrânia, ontem realizada pelo Papa Francisco, em Roma e em Fátima, em união com o episcopado mundial. Queira Deus que, graças a esta consagração, se alcance o fim da guerra entre a Rússia e a Ucrânia, bem como a sua conversão, e a nossa também, à única Igreja de Cristo.