A falta de coragem das pessoas para mudar o mundo é um tema recorrente e preocupante. É fácil ficar na zona de conforto e ignorar as injustiças, mas será essa a postura correta a adotar? Será que devemos ficar parados e deixar que o mundo continue a ser injusto? A resposta é clara: não. Precisamos de coragem para mudar o mundo e combater as injustiças que nos rodeiam.
A moral da fábula do colibri é inspiradora e pertinente para esta discussão. Nela, o colibri está a tentar apagar um incêndio na floresta, levando pequenas gotas de água no seu bico. Quando questionado sobre a futilidade da sua ação, uma vez que é impossível apagar um incêndio sozinho, o colibri responde que está a fazer a sua parte. Esta fábula ensina-nos que todos devemos fazer a nossa parte para mudar o mundo, por mais pequena que seja.
No entanto, muitas pessoas sentem-se impotentes perante as injustiças e acabam por se conformar com a situação. José Saramago, que era crítico desta postura, demonstrou-o na sua obra Ensaio Sobre a Lucidez. Nesse livro, a população de uma cidade decide votar em branco nas eleições, como forma de protesto. Contudo, quando o número de votos brancos ultrapassa o número de votos válidos, a cidade é forçada a repetir as eleições, o que leva a uma crise política. Saramago questiona se a população terá coragem de enfrentar as consequências do seu protesto, ou se acabará por se conformar novamente.
O comodismo é um inimigo da mudança e é, muitas vezes, justificado pela perceção de que uma única pessoa não pode fazer a diferença. No entanto, o filósofo Eduardo Lourenço afirmou numa entrevista que “a responsabilidade começa no indivíduo, e não na sociedade ou no Estado“. A mudança começa por cada um de nós e é preciso acreditar que podemos fazer a diferença. Como dizia o ativista Mahatma Gandhi: “Seja a mudança que você quer ver no mundo.”
A mudança não precisa de ser radical ou imediata. Podemos começar por pequenas ações, como o colibri da fábula. A escritora Agustina Bessa-Luís afirmou que “a bondade é a única revolução que vale a pena“. Pequenos gestos de bondade e solidariedade podem ter um grande impacto nas pessoas que os recebem.
Contudo, é importante não nos contentarmos com pequenas ações. Precisamos de ser corajosos e agir para mudar o mundo de forma mais significativa. Como disse o filósofo francês Albert Camus, “a verdadeira revolução é a revolução da consciência“. Precisamos de despertar a consciência para as injustiças e agir em conformidade. Não podemos continuar a olhar para o lado quando vemos algo de errado a acontecer. Em certos casos, pode ser necessário recorrer à denúncia para combater as injustiças. A denúncia é uma forma importante de agir contra a discriminação e outras formas de injustiça que afetam a sociedade.
Porém, muitas vezes há receio de represálias por parte dos indivíduos ou instituições envolvidas na situação denunciada, o que pode impedir as pessoas de agir.
É importante lembrar que a denúncia não é apenas um direito, mas também um dever cívico. Todos temos a responsabilidade de agir contra a injustiça e a denúncia pode ser uma forma efetiva de fazê-lo.
Infelizmente, muitas vezes a denúncia só é ouvida e tratada com seriedade pelas autoridades quando é chocante o suficiente para chamar a atenção dos órgãos de comunicação social e da opinião pública em geral. É lamentável que as autoridades nem sempre ajam de forma diligente e eficiente, mas a realidade é que a denúncia pode precisar de algum “choque” para ser levada a sério.
Em Portugal, assim como em muitos outros países, existem várias questões sociais que precisam de ser abordadas. A falta de meios para a concretização do Decreto-lei 54/2018 é uma delas. A maioria das pessoas está ciente destes problemas, mas poucas são as que efetivamente se revoltam. Mesmo que todos nós adotemos a postura de querer fazer omeletes sem ovos e termos o espírito missionário no nível máximo, a verdade é que a responsabilidade máxima de alocar verbas e meios para incluir verdadeiramente é do Estado. Por essa razão, devemos ser corajosos e agir de forma ativa para mudar a nossa sociedade. Como dizia Sophia de Mello Breyner Andresen “o que faz a diferença é a coragem de assumir a responsabilidade por tudo aquilo que somos“. Temos a responsabilidade de agir para melhorar a vida das pessoas à nossa volta, Se fossemos muitos a denunciar a farsa que é o decreto-lei 54/2018 e falássemos da quantidade de alunos que, por falta de meios, ficam em condições de enorme fragilidade, talvez o decreto hoje já não estivesse em vigor. Se a sociedade civil tomasse consciência das condições que muitas escolas (não) têm para acolher alunos com necessidades especiais de saúde, talvez este tema fosse colocado no centro da discussão política. Mas o que interessa é fingir que está tudo bem, fingir que se inclui, mesmo sem condições mínimas para o fazer, o que, como se sabe, acaba por excluir os demais.
A falta de coragem para tentar mudar o mundo também está relacionada com o medo do desconhecido, de enfrentar situações desconfortáveis. No entanto, é importante lembrar que a mudança pode trazer novas oportunidades e experiências valiosas. Como dizia Fernando Pessoa, “o que nos falta é coragem para sermos loucos“. Às vezes, é preciso ser um pouco “louco” e arriscar para fazer a diferença.
Outro fator que pode estar a contribuir para a falta de coragem para se falar deste tema é a sensação de impotência para mudar seja o que for. É fácil sentir que não temos controlo sobre estas questões, mas isso não significa que não possamos fazer a diferença. Em conclusão, a falta de coragem para mudar o mundo é um problema preocupante, mas não insuperável. É preciso ter a coragem de enfrentar as injustiças e agir para mudar a sociedade. Podemos começar por pequenas ações e, gradualmente, trabalhar para alcançar mudanças significativas. Como o colibri da fábula, cada um de nós pode fazer a sua parte para apagar o fogo da injustiça. É hora de assumirmos a responsabilidade por aquilo que somos e agir para tornar o mundo um lugar melhor.