O setor da segurança privada em Portugal enfrenta uma crise de qualidade, e as consequências dessa deterioração são preocupantes. As críticas vindas de empresas e profissionais do setor têm sido constantes, apontando para um problema estrutural que precisa de atenção imediata.
A entrada de novos vigilantes sem as qualificações mínimas necessárias tem se tornado uma prática comum, o que reflete tanto na formação deficitária quanto na falta de fiscalização adequada sobre os profissionais que ingressam na profissão.
Uma das causas centrais deste problema é a qualidade questionável das formações para a função de vigilante. Muitas destas formações não garantem o nível de preparação técnica e comportamental necessário para a responsabilidade que a função exige. Existe ainda o grave indício de que alguns indivíduos conseguem adquirir o cartão de vigilante sem sequer frequentar a formação completa, o que agrava ainda mais a situação. Assim, surge a preocupante questão da integridade do processo de certificação: como é possível que candidatos que não falam fluentemente português ou que, em alguns casos, nem sequer sabem ler ou escrever, conseguem ingressar no setor?
Outro ponto fundamental e muitas vezes negligenciado são os exames de aptidão psicológica. Trabalhar em segurança privada requer mais do que apenas força física ou conhecimento técnico; é necessário ter um perfil psicológico adequado, com capacidades como autocontrolo, empatia, e habilidades de comunicação. No entanto, tem sido cada vez mais comum encontrar vigilantes que claramente não possuem estas competências, o que pode ser perigoso. Pessoas excessivamente agressivas ou sem habilidades interpessoais adequadas não deveriam ser autorizadas a trabalhar diretamente com o público. A falha em garantir a aptidão psicológica dos vigilantes afeta diretamente a qualidade do serviço e pode resultar em situações potencialmente perigosas para o público e para os próprios profissionais.
Além dos problemas de formação e certificação, outro fator que afasta profissionais qualificados do setor é a deficiente remuneração. Muitos vigilantes recebem salários que se aproximam do salário mínimo nacional, o que é insuficiente para a responsabilidade e os riscos inerentes à profissão. A falta de valorização salarial afasta trabalhadores mais experientes e competentes, o que leva ao declínio na qualidade dos serviços prestados. Assim, estamos a assistir a um êxodo dos profissionais mais antigos, que procuram alternativas de trabalho onde possam encontrar melhores condições de trabalho e respeito pelas suas funções.
O descontentamento dos profissionais mais experientes com as empresas de segurança privada também é um fator agravante. Além dos salários baixos e cada vez mais próximo do salario mínimo, há uma recorrente falta no cumprimento das obrigações contratuais por parte das empresas de segurança privada, que agrava ainda mais o ambiente de trabalho. Esta má postura empresarial tem contribuído fortemente para a falta de atratividade da profissão e promove a entrada de profissionais menos qualificados, que aceitam as condições indevidas que muitas das empresas oferecem. Incentivando os bons profissionais a procurar outras alternativas de trabalho.
É urgente que se tomem medidas para retificar esta situação. Primeiro, a fiscalização sobre as formações de vigilantes precisa ser intensificada. As entidades responsáveis devem garantir que os cursos oferecidos sejam de qualidade e que o processo de certificação seja transparente e rigoroso. Em segundo lugar, é imperativo que os exames de aptidão psicológica sejam levados a sério e realizados por profissionais qualificados, de modo a garantir que os candidatos têm o perfil adequado para a profissão. Por fim, mas não menos importante, deve haver uma valorização salarial e um cumprimento mais rigoroso das obrigações contratuais por parte das empresas de segurança, de forma a atrair e manter profissionais competentes e experientes no setor.
A segurança privada desempenha um papel crucial na proteção de bens e pessoas, complementando o trabalho das forças de segurança pública. Se não forem tomadas medidas urgentes para melhorar as condições deste setor, corremos o risco de colocar em causa a segurança de todos. A qualidade do serviço deve ser uma prioridade, e isso só será possível através de uma mudança significativa na formação, na fiscalização, nas condições laborais e no respeito pelos profissionais da segurança privada.