Sim, elas também têm dias maus. Sim, e não andam tão distraídas como parece. Sim, e entendem os dramas dos pais, e as dificuldades e os conflitos da família. Sim, elas nem sempre são lidas, por dentro, considerando tudo o que nos dizem; comuniquem por palavras, por gestos, por olhares ou doutra forma qualquer. Sim, às vezes não há como não se sentirem quase minúsculas, tal é o modo como, tão depressa são “o centro das atenções” como, a seguir, alguns comentários ou atitudes das pessoas crescidas em relação a elas as sobressaltam, intimidam ou, mesmo, as magoam. Muito! Sim, nalguns momentos, sentem-se sozinhas e desconsideraras, porque aquilo que se passa consigo parece ser enigmático ou completamente obscuro para quem as devia entender e ter gestos de carinho para com elas. Sim, há alturas em que pedem ajuda e, na volta, são repreendidas, são castigadas ou, mesmo, atropeladas pelo nosso enfado, pelo mau humor ou pelos azedumes que nos transfiguram. E sim, a nossa dificuldade de aceitar que as crianças se deprimem passa por não tolerarmos que elas se sintam infelizes. Mesmo quando lhes damos “tudo” para que riam. Para que tenham uma vida boa. E para que sejam – sempre! – mais felizes.

Mas, tal como nós, as crianças também estão tristes. E, de forma idêntica à nossa, quando é assim, ocupam menos espaço. Murmuram. “Apagam-se”. Tornam-se, estranhamente, boazinhas. E deixam de ser refilonas e atrevidas. E, em muitos momentos, a sua tristeza é tão discreta que nos passa ao lado. E os seus apelos acabam por ser tão delicados ou, mesmo, tão subtis que, a seguir a estarem tristes, vão registando a nossa dificuldade de chegarmos a elas. E, de desamparo em desamparo, vão vivendo com um naturalidade desconcertante uma tristeza que se vai tornando familiar. Primeiro, parecem ser tristonhas. Depois, deprimidotas. E, finalmente, assume-se que se nasceu assim. Uns são mais expansivos. Outros, mais atormentados. E deixamo-nos andar.

A depressão das crianças existe! E não depende exclusivamente dos falhanços dos pais. Mas a nossa atenção é indispensável para que a infelicidade duma criança não se banalize. E para que, à custa disso, a vida delas não se estreite aos seus olhos.

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Mental é uma secção do Observador dedicada exclusivamente a temas relacionados com a Saúde Mental. Resulta de uma parceria com a Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD) e com o Hospital da Luz e tem a colaboração do Colégio de Psiquiatria da Ordem dos Médicos e da Ordem dos Psicólogos Portugueses. É um conteúdo editorial completamente independente.

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