Ao fim de quase dois anos na estrada, numa viagem inusitadamente monótona até à chegada deste Verão, a geringonça foi à revisão pela terceira vez. Uma revisão agendada há um ano, mas que o condutor, com o beneplácito da oficina de reparação, foi adiando, seguro de que não ficaria apeado. A agenda comemorativa estava recheada. Uma lição que os romanos deixaram nestas paragens peninsulares.
Uma revisão minimalista, em contraste com aquilo que seria de esperar face aos acidentes das últimas semanas e à dureza do percurso que se avizinha. Deambular entre as curvas negociais do orçamento em época de eleições autárquicas não se afigura tarefa fácil.
Nesta ida à oficina, o condutor, certamente confiado nos dados que a aragem das sondagens lhe sopra, limitou-se, até ao momento, a autorizar a substituição de três peças. Aquelas que há muito estavam desgastadas por culpa de viagens a França. Algo que não escapou aos olhos da opinião pública, malgrado os esforços oficiais para manter a geringonça alinhada.
A devolução do benefício usufruído convenceu o Governo, que deu disso conhecimento público, mas não a justiça. A restituição não funcionou como uma lavagem destinada a remover marcas. Há que continuar a esfregar. Agora em sede de justiça.
O motorista ainda está a avaliar a possibilidade de substituir outras peças, mas já deixou claro que não está disposto a pagar muito. Mudar as peças mais caras nem pensar. O orçamento não aconselha, por muito que os apoiantes da geringonça se agitem nesse sentido e até já se considerem no direito de indicar o caminho. Não tenham tento na língua e logo verão o que lhes acontece. É só a brisa das sondagens soprar com um pouquinho mais de intensidade…
Ninguém melhor do que ele conhece o estado da máquina. Às vezes, a inquietação vem-lhe à cabeça. Coisa passageira. A memória sossega-o. Recorda-lhe um rally de Portugal em que o bólide mais aplaudido nos troços foi uma Renault 4L. Um parente pobre da geringonça que conduz.
Verdade que as sondagens que certificam a geringonça não abonam a favor do condutor, mas com isso pode ele bem. Trata-se de um arrufo passageiro. A normalidade não demorará a ser reposta.
Na sua douta leitura, se a maquineta funciona, o motorista só cede temporariamente o lugar por motivos de força maior. Como as férias, por exemplo. Afinal, um sorriso bronzeado representa sempre um bom cartão-de-visita.
Voltando à qualidade da revisão, diga-se que, para muitos portugueses, traz à memória os automóveis que, por esta altura do ano, se dão mal com as condições meteorológicas e preferem esperar pelo reboque na berma da estrada.
Nada que incomode o sorriso do primeiro-ministro. A geringonça tem a revisão em dia. Feita na marca. Na mesma oficina que avalizou a segurança das três peças agora substituídas.
Professor de Ciência Política