A menos de dois meses do início do Mundial, a Seleção Nacional cometeu novamente a proeza de não atingir um objetivo ao qual se propunha, sendo já de certa forma perturbador o facto de ter acontecido exatamente da mesma forma. 3 jogos em casa, 3 derrotas contra França, Sérvia e Espanha. Jogos que podiam perfeitamente ter sido tirados a papel químico, tal foi a incapacidade gritante de Portugal assumir as rédeas de encontros onde jogava com dois resultados. Contudo, já sabemos o apreço especial do selecionador nacional pelo X do Totobola, que tantas alegrias nos deu em França. Depois da derrota de terça-feira, espero que se possa começar a chegar a um consenso de que o Estádio da Luz não foi o grande culpado de não termos chegado diretamente ao Catar, mas sim mais uma vítima da pobreza de jogo apresentada por Fernando Santos e não pelos seus comandados, como é habitual dizer-se. Esses são meros peões inseridos numa falta de estratégia e de aproveitamento do melhor conjunto de jogadores alguma vez à disposição de um selecionador nacional.

Em Braga, assistimos a mais uma evidência do navegar ao sabor do vento da Seleção e, sobretudo, da gestão da FPF. O conjunto liderado por Fernando Gomes (e não Santos) assumiu uma atitude tipicamente identificável em dirigentes de altas instituições, encostando-se à sombra de um sucesso passado, cada vez mais longínquo e totalmente incapaz de criar um projeto alicerçado nessa vitória, neste caso o histórico Europeu de 2016. Não teve capacidade porque adotou a mais perigosa das posturas, isto é, a da arrogância em torno da sua própria pessoa e órgão que dirige, não sendo sequer possível questionar as suas opções, correndo o risco de cometer um crime lesa-pátria, visto que Portugal nunca tinha conquistado uma competição internacional. Assim sendo, Fernando Santos (agora sim) passou a ser tratado como intocável, na cegueira constante da vitória, nunca querendo analisar como tinha surgido esse mesmo triunfo, assente numa ideia resultadista, “pragmática” como afirmam os seus defensores e que tem os seus efeitos práticos a médio/longo prazo, como se vai chegando à conclusão com os sucessivos desaires aos quais temos de assistir.

Pelo contrário, a Espanha de Luis Enrique, que vai paulatinamente fazendo o seu caminho, derrotou Portugal sendo fiel aos seus valores, ao plano de jogo de um selecionador, arrasado constantemente pela imprensa que gosta da espuma dos dias, mas se esquece que a La Roja esteve às portas de Wembley ainda no verão passado e que vai passando pelos pingos da chuva, numa fase de transição muito complicada pela qual está a passar, na ressaca da melhor geração de sempre do futebol espanhol. Foi justiça poética para uma seleção do país vizinho (e uma federação) que olharam para a Liga das Nações como ela é tão bem descrita por Kevin de Bruyne: um conjunto de amigáveis glorificados, que devem servir precisamente para preparar as grandes competições, testar jovens jogadores, ambienta-los ao grupo de trabalho e ser capaz de trabalhar um modelo ou, pelo menos, alguns processos coletivos capazes de potenciar uma equipa.

Na seleção portuguesa, há uma necessidade constante de querer provar que a vitória em França não foi um mero acaso, numa busca frenética pela chegada ao topo, não entendendo que é preciso trabalhar a base. Porque esta base de 2022 está a léguas de qualidade comparativamente à de 2016 e necessita de uma abordagem diferente, por respeito ao nível dos jogadores que temos à nossa disposição. E quando essa necessidade é posta à frente de tudo o resto, torna-se clara a falta de argumentos de quem dirige a FPF, que deve fazer uma reflexão muito séria daquilo que tem sido o seu trabalho nos últimos anos, a transbordar de operações e galas de pura cosmética proporcionais à pobreza do futebol apresentado pela equipa sénior.

Enquanto reinar a gratidão eterna, estaremos presos a um mero ideal de seleção fortíssima, com uma geração de ouro e jogadores que jogam nas melhores equipas do mundo que parece não querer ser feliz, resignando-se a ser aquilo que a Grécia foi em Portugal 2004: um oásis no deserto.

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