Quando eu era criança queria ser rapaz. Imaginava que seria mais livre se fosse rapaz e que faria brincadeiras mais giras que não incluíssem bonecas. Também gostava de ser golfinho. O mar sempre me apaixonou e os golfinhos davam-me uma sensação de alegria e liberdade que eu invejava. E queria mais, tendo que ser quem sou, queria ser astronauta. Mais uma vez a liberdade representava um papel importante no meu pensamento. Ser astronauta era poder ir onde não é possível ir. Era estar um passo à frente, não para ser melhor que os outros, mas para ir mais longe. E depois fui crescendo. Ser golfinho e ser rapaz ficou rapidamente fora de hipótese, já que tinha nascido humana e rapariga. Também não fui astronauta. Os livros do Tintim Rumo à Lua e Explorando a Lua eram os meus preferidos mas ser astronauta implicava muito mais do que ser um personagem dos livros do Tintim. Percebi que não era tão apaixonada por física e astronomia para dedicar a vida a esses estudos. Também me imaginava mãe de família o que requeria uma profissão que se exercesse no nosso planeta e com tempo para a família.
Os meus sonhos de criança não se perderam, porque todos tinham um traço comum: a liberdade. Foi isso que fui descobrindo com a ajuda dos meus pais. Acho que nunca souberam destas minhas fantasias, nem tinham que saber. Souberam sim ensinar-me a pensar em liberdade, a não me deixar levar por argumentos fáceis, a ir à procura da razão de ser das coisas e da verdade. Ensinaram-me que tudo se faz por amor, que a vida é uma entrega permanente, que por vezes não entendemos a nossa circunstância mas que o segredo é saber viver com ela, porque é a partir da nossa realidade que construímos o nosso futuro.
E se eu pertencesse à geração de adolescentes de agora e não tivesse os pais que tive?
Será que se fizesse uma birra sobre a minha vontade de ser rapaz, daquelas que deixam os pais doidos, que os fazem desesperar e por fim desistir, poderia vir a ser rapaz?
E porque razão, se eu dissesse que me sentia rapaz, podia passar a “ser” oficialmente um rapaz, e tal já não era possível para ser golfinho ou astronauta?
Segundo percebo os defensores da ideologia de género pretendem impor que a nossa percepção de nós mesmos vale mais do que a realidade. Tanto é assim que nem é preciso um médico para avaliar se os casos de adolescentes que querem mudar de sexo, no papel, têm a ver com algum distúrbio conhecido como disforia de género que possa ser tratado ou se nem disso se trata. Mas por enquanto só é válido negar a realidade se se tratar do sexo. Portanto ainda não somos “livres” para escolher a nossa natureza nem a nossa percepção de profissão.
Volto ao tema da educação que recebi e da minha ambição de liberdade. Ser livre não é inventar uma realidade que não existe. Isso é ser caprichoso. Ser livre não é fugir à realidade que não queremos enfrentar, isso é cobardia. Ser livre não é usar a lei para mentir sobre mim, isso é falsidade. Ser livre não é viver à custa dos pais sem lhes dever respeito e obediência, isso é abuso e prepotência dos filhos ainda que consentida pela lei.
Já muito se disse sobre a ideologia de género que nos tem vindo a ser crescentemente imposta sob o argumento da liberdade. Deixo para os juristas e para os médicos as explicações, que darão muito melhor do que eu, sobre os perigos das questões relacionadas com a vontade velada de baralhar os nossos jovens no que respeita ao seu sexo.
O tema que levanto e que proponho que seja matéria de reflexão para os pais é o da liberdade. Se educarmos os nossos filhos para a liberdade, aí sim estamos a prepará-los para não caírem facilmente nas esparrelas desta ideologia que mais não faz do que propor viver na mentira.
Entendo liberdade, não como uma “licença para a asneira” mas como uma forma de relacionamento na família, e mais tarde na sociedade, assente na confiança, no discernimento e no conhecimento. Somos livres para fazer o bem. O mal amarra-nos e, mais tarde ou mais cedo, retira-nos a liberdade porque ficamos reféns do mal que fizemos.
Quem, como eu, discorda da ideologia de género, lute pela liberdade. Será pela verdade e pela liberdade que a derrotaremos.