A maioria da vergonha entrou no segundo ano. Como? A festejar as vitórias do socialismo. Quais vitórias? Principalmente estas duas:
- O aumento da pobreza em Portugal que se traduz em mais destinatários para as migalhas ocasionais da ilusão. Como sem pobreza o socialismo perde a sua razão de ser, António Costa tem conseguido dar mais futuro ao PS: há mais pobres em Portugal (já são 3 milhões) e a tendência é de crescimento.
- A culpa não é do PS. Os professores queixam-se. Mas a culpa não é do PS. Os médicos e enfermeiros queixam-se. Mas a culpa não é do PS. Os polícias queixam-se. Mas a culpa não é do PS. Os militares queixam-se. Mas a culpa não é do PS. Os oficiais de justiça queixam-se. Mas a culpa não é do PS. Os agricultores queixam-se. Mas a culpa não é do PS. Os hospitais e as escolas não funcionam. Mas a culpa não é do PS. As greves multiplicam-se. Mas a culpa não é do PS. A inflação permitiu ao Governo arrecadar substanciais receitas extraordinárias. Porém, não há dinheiro para nada. Mas a culpa não é do PS. Os portugueses estão mais pobres. Mas a culpa não é do PS. A culpa nunca é do PS.
E também não é do Governo. Os membros do Governo socialista não são responsabilizáveis. Nunca são. Mesmo que mintam e omitam, mesmo que falhem miseravelmente no cumprimento de funções, mesmo que governem por meios informais como o WhatsApp, mesmo que tenham tido conhecimento e ficado sem memória da informação. No caso de Pedro Nuno Santos e de Hugo Mendes, a Inspeção-Geral de Finanças, tutelada por Fernando Medina, avocou uma norma do Estado Novo – Decreto n.º 22 257, de 25 de fevereiro de 1933 – para os livrar das trapalhadas da TAP. Não é comovente ver o socialismo a recorrer ao fascismo?
Contudo, o ponto que considero mais preocupante é o nível da seriedade. Infelizmente, duas coisas são comprováveis sob a gestão de António Costa: nunca o PS esteve tanto à esquerda; e o nível de seriedade é baixíssimo. Ao ponto de estarem a ser abertas rachas no Princípio da Separação dos Poderes.
Quando obteve a maioria absoluta, António Costa referiu uma maioria absoluta de diálogo. Ao fazê-lo, presumi que o Primeiro-ministro se estava a referir à valorização do papel do Parlamento, pois nenhum socialista negará que o Parlamento sempre foi um fórum de discussão e de debate. Eu estava errado. Não só os debates quinzenais não voltaram a ser uma prática, como também o Primeiro-ministro não responde às perguntas de alguns deputados.
Mas há pior. Quando António Costa (representante por excelência do poder executivo) desrespeita os deputados (representantes do poder legislativo) não respondendo às questões que estes lhe colocam, o deputado líder da bancada parlamentar do PS aplaude. O desrespeito não era para ele (nem para os restantes correligionários socialistas) porque Eurico Brilhante Dias não é um deputado qualquer. Ele é o primeiro servidor parlamentar do poder executivo. E, nesse contexto, a sua função não é escrutinar o Governo. É simplesmente obedecer às ordens do chefe. E ele obedece cegamente porque sabe que se não o fizer não voltará a ser candidato a nada.
Ora, o líder de um governo maioritário, especialmente no contexto dum regime democrático, não devia opor-se ao escrutínio. Pelo contrário. Precisamente para reforçar os principais fundamentos da democracia – o Estado de Direito e o Princípio da Separação dos Poderes – é nos momentos em que a voz da oposição é mais ténue e frágil que a mesma deve ser protegida é potenciada. LORD ACTON disse que “o melhor teste para avaliar até que ponto um Estado é realmente livre é pelo nível de segurança usufruído pelas suas minorias”. Eu afirmo que num contexto de maioria absoluta, o melhor teste para avaliar até que ponto um Estado é democrático é pelo nível da prestação de contas dada à oposição.
Mas António Costa liga pouco ao Estado de Direito e ao Princípio da Separação dos Poderes. Só liga quando lhe convém. Há mais de ano e meio que está por publicar uma portaria sobre a distribuição de processos em tribunal. Entre os processos que podem prescrever estão os do agora “aldrabão”, outrora digníssimo amigo José Sócrates (com este atraso, o poder executivo impede o poder judicial de cumprir as suas funções) e manteve praticamente inalteradas as propostas que tinha apresentado para a habitação.
Entre 1983-85, enquanto Primeiro-ministro do IX Governo constitucional, Mário Soares defendeu a política de austeridade com seriedade. Claro que os socialistas, que nunca são culpados, dizem que a responsabilidade era do governo anterior liderado por Pinto Balsemão. Curiosamente, se a culpa é do Governo anterior fosse um critério válido, o PS seria a génese dos problemas porque as primeiras governações da III República foram dos socialistas. Mas isso não invalida a seriedade de Soares. Contudo, esse tipo de seriedade já morreu. Os socialistas optaram por ignorar o exemplo de Soares. Fomos à falência devido à governação de José Sócrates e os socialistas continuam a negar responsabilidades e agir sem qualquer seriedade. Convém recordar que a era das cativações começou com António Costa. Cativar é sinónimo de austeridade. Mas os socialistas agem como se cativar fosse o esplendor da abundância.
Dito isto, eis a maioria da vergonha: mais pobreza, menos riqueza; mais impostos, menos dinheiro; mais opacidade, menos transparência; mais irresponsabilidade, menos escrutínio; mais arrogância, menos seriedade.
Só posso concluir que Vasco Pulido Valente tinha razão. António Costa jamais será mais do que um cacique sem preocupação pelo futuro do país.
Portugal dispensa caciques que se julgam políticos perfeitos. O que é indispensável são políticos responsáveis e, sobretudo, responsabilizáveis.