Ainda o aeroporto de Beja não tinha entrado em funcionamento (lá para 2010, talvez), discutia acesamente com um colega meu de trabalho no Politécnico de Setúbal, durante o almoço, as ‘virtudes’ de um aeroporto internacional em Beja. Para mim sempre foi absolutamente incompreensível tal projecto e era evidente que, passado o entusiasmo, cedo se tornaria um aeroporto fantasma. Já para o meu interlocutor, isso eram patranhas: era absolutamente óbvio que Beja iria servir como ‘hub’ para as ‘low-cost’, para o progresso da região, e muitas outras fantásticas e coloridas maravilhas para Portugal. Para mim, havia um único argumento que matava de uma só estocada toda a ideia do projecto. Quando o slogan de Beja era o de ser alternativa ao aeroporto da Portela (actual aeroporto Humberto Delgado), havia uma razão simples, que não precisa de pareceres técnicos de espécie nenhuma, que sempre me pareceu ser necessária e suficiente para abafar por completo todas e quaisquer outras boas razões que se pudessem invocar: a distância. A distância, senhoras e senhores, crianças e graúdos, entre Lisboa e Beja, caso não saibam, é (ribombar de tambores)… 174 km! Quase 2 horas pela auto-estrada! É a mesma coisa que tentarmos conversar com uma pessoa a 1 metro de distância (isto é, sem ser ao ouvido) numa discoteca ao lado da coluna, enquanto passa David Guetta, na esperança de que alguém nos perceba: ninguém nos vai ouvir, porque o som das colunas é tão alto que abafa e se sobrepõe a qualquer outro som – isto pode ser demonstrado pela adição de decibéis. Exemplo prático: se numa conversa emito um nível de pressão sonora de 70 dB (decibel) e a coluna ao meu lado debita 100 dB, quanto é 70 dB+ 100dB? Se não sabem, façam a conta nesta calculadora e surpreendam-se com o resultado (spoiler alert #1: não dá 170 dB! spoiler alert #2: não, a calculadora não está avariada!).
No caso dos aeroportos, a distância é a coluna de som, que deve estar a um nível óptimo para que faça sentido: nem muito alta como foi dito, nem muito baixa, pois proximidade a mais cria os problemas que todos sabemos em Lisboa. Mas também toda a gente sabe o que aconteceu a Beja. E não vale a pena falar mais nisso (seria melhor esquecer, já que as responsabilidades, que as há com enormes custos para o contribuinte, ficam, como sempre, por atribuir).
Santarém, sendo uma opção menos… (como dizer sem insultar ninguém?), vá lá, menos criativa, menos distópica, traz outra vez consigo a mesma impossibilidade – que é matemática e dos meandros da lógica, exmos. senhores governantes – que faz dela uma hipótese inviável em Portugal: a distância entre a cidade onde se pretende colocar o aeroporto e a cidade que se pretende servir (certo: do ponto de vista da Física essa impossibilidade não existe, pois podemos encurtar o tempo de viagem entre dois pontos usando mais tecnologia, mas quanto custa, qual é o impacto ambiental, e quem paga por isso?).
Sem querer alongar-me mais porque pouco mais há a dizer (lembrem-se, tal como o som muito alto de uma avião abafa o som de uma conversa ao ponto de termos que nos calar até que o avião passe, também a distância nesta equação abafa qualquer outro argumento – até que se encurte a distância e, aí sim, os outros argumentos sejam já audíveis), deixo que o caro leitor conclua por si mesmo a inexequibilidade desta solução. Para isso, e utilizando uma metodologia ‘rigorosíssima’ (consulta no Google Maps), listo na figura abaixo as distâncias entre os centros de algumas cidades (algumas são capitais, outras são cidades com relativa importância) e dois dos seus aeroportos internacionais para que se ganhe consciência da dimensão do problema Físico, de Engenharia e Económico (deslocação de um corpo entre dois pontos no mais curto espaço de tempo, com o menor consumo possível de energia, e pelo menor custo possível) que Portugal terá que resolver se optar por fazer um aeroporto em Santarém para servir Lisboa. Mais uma vez, Portugal à frente! Algo me diz que a acontecer, vai ter em Beja semelhante exemplo e destino. E nós, assim continuaremos, Portugueses brandos e ledos.