Com o início do ano letivo, milhares de alunos começam mais um ano educativo num contexto que cada vez mais preocupa os encarregados de educação cujos educandos frequentam a escola pública.
As notícias recentes sobre a falta de professores nas escolas públicas, principalmente onde existe mais população estudantil, sublinham o contínuo degradar da prestação de uma educação com qualidade.
Mas talvez haja um indicador que melhor ilustra a descrença cada vez maior no ensino público. Se olharmos para a evolução da percentagem de alunos que estudam em instituições de ensino privadas, iremos perceber a continua fuga de estudantes do ensino público e o número cada vez maior de famílias que escolhem investir do seu bolso, muitas vezes com grande sacrifício, envolvendo não só pais, mas também avós, na educação dos seus filhos.
Se não vejamos, em 1991 cerca de 7,9%1 dos alunos do ensino básico estudavam numa instituição de ensino privada e em 2021 essa percentagem é 12,6% – um crescimento de 59%. Se olharmos para o ensino secundário a tendência é semelhante, em 1991 estudavam no ensino privado 8,5% e em 2021 são já 24,3% – um crescimento de 186%.
Embora este facto seja um tributo à liberdade de escolha que os portugueses têm, devido à oferta privada que existe, não nos podemos esquecer que a oferta privada está concentrada onde existe maior população estudantil, o que implica que existem famílias que não têm a mesma oportunidade de escolher outro tipo de educação mesmo que queiram e possam.
É neste contexto que os municípios têm uma oportunidade de ouro. Existem neste momento 125 municípios de um total de 278 do continente que aceitou a descentralização de competências no âmbito educativo2. Mas educação não são apenas infraestruturas ou transportes (algo que historicamente tem sido a principal preocupação do poder local) que embora importantes não são determinantes para a educação dos nossos filhos. Com a descentralização de competências os municípios têm a capacidade, em articulação com as escolas do concelho, de investir de forma complementar em projetos educativos.
No entanto a cultura de gestão tem de mudar, e em vez de se fazerem planos de acordo com “achismos” ou o que fica bem nas notícias, é necessária uma cultura de recolha e análise sistemática de dados da realidade educativa tendo em conta os contextos sócios económicos.
Por exemplo, é essencial que se tornem públicos, em cada um destes 125 municípios, o grau de absentismo de professores e alunos, um dos indicadores importantes para entender os resultados escolares.
É preciso que se explique o que se tem feito nas escolas com melhores resultados e que lições podem ser aplicadas noutros contextos. Por exemplo, a escola Salesianos de Manique, localizada no concelho de Cascais, que é uma das 30 escolas do país com acordo de cooperação com o Ministério da Educação, apresenta os melhores resultados do concelho junto dos alunos que têm Apoio Social Escolar (estamos a falar dos alunos com maiores carências económicas).
Além disso, tem de existir transparência de como tem sido a evolução do ranking das escolas do concelho quando comparado com os concelhos adjacentes.
Relativamente aos projetos de apoio à família e competências socio-emocionais, qual o grau de adesão da população escolar e nível de absentismo? Ainda sobre este tema, como se compara o custo destes programas quando confrontado com o equivalente oferecido pelo ensino privado (estou a falar de extensões de horário ou atividades extracurriculares)?
Em suma está nas mãos dos municípios apresentar as evidencias e atuar nas reais causas do degradar do ensino público, para permitir a todos tomar as melhores decisões em prol da educação do seus filhos e filhas.
1 Fonte: Pordata
2 Fonte: Portal Mais Transparência