Numa paródia moralista, “conscienciosa” e “correcta”, um humorista australiano “criou” uma linha de apoio telefónico para adultos que se irritam com a pequena Greta. É uma ideia. E uma linha de apoio para adultos que levam, ou fingem levar, a pequena Greta a sério?
Eu próprio reconheço que a pequena Greta não é uma adolescente comum. Os adolescentes comuns dizem disparates comuns. A pequena Greta emite barbaridades com impressionante frequência, o que no caso dela é compreensível. Afinal, estamos a falar não só de uma adolescente, mas de uma adolescente que falta às aulas, que sofre de um problema mental devidamente diagnosticado e que é explorada pelos pais com fins económicos. Sem instrução, sem juízo e sem uma família decente, é natural que a pequena Greta não dê uma para a caixa. E, nos tempos que correm, é natural que as pessoas corram a ouvi-la.
Também é verdade que não houve muitos a correr, ou a conduzir veículos poluentes, para a doca de Alcântara ou lá onde é que foi que a pequena Greta atracou, escoltada por uma resma de lanchas “verdes” da GNR. Tirando os repórteres, alguns deputados da esquerda e da extrema-esquerda, aquele autarca de Lisboa e uma trupe de saltimbancos liderada por um genro do conselheiro de Estado Francisco Anacleto Louçã, não havia ninguém.
Por mim, estranhei a ausência de cegos e paralíticos em busca da bênção (a dra. Joacine marcou presença e, que se saiba, continua gaga). E estranhei a ausência de público em geral. É possível que os cidadãos se tenham revisto na carta que o ministro do Ambiente enviou previamente à pequena Greta, e achassem que a interacção com a moça se esgotara aí: em matéria de ridículo era difícil conseguir melhor. As televisões tentaram. Eu, que estava num hotel, liguei o televisor às oito e meia e uns nove canais transmitiam a chegada em directo. Quatro horas depois, num café, a transmissão da chegada, ainda não concretizada, prosseguia. Por pudor, não reproduzo os comentários dos “jornalistas”. Por pirraça, noto que a crise dos “media” é inteiramente justificada. Entretanto, a pequena Greta já rumou a Madrid, para uma Cimeira do Clima em que todos os participantes viajaram em meios alternativos – alternativos aos respectivos discursos sobre a “pegada ecológica”.
Eis a grande questão: quem são os fiéis da pequena Greta? Há diversas tendências, que às vezes se sobrepõem. Em primeiro lugar, temos os pasmados. Os pasmados inscrevem-se numa longa linhagem. São os descendentes em linha recta dos chalupas que passavam a vida à espera do regresso de um profeta qualquer e gritavam “Lá vem ele! Lá vem ele!” sempre que Matias, o bêbado da aldeia, dobrava uma esquina aos tropeções. São indivíduos carentes de um santo que os salve da exacta calamidade que o santo anunciou.
Em segundo lugar, temos os alarmistas. São os que não apenas compraram a versão blu-ray do “documentário” de Al Gore como viram aquela pessegada. Estão convencidos de que o degelo destruirá a Terra em 2030 com o fervor com que se convenceram de que o degelo destruiria a Terra em 2010. E se não é o degelo é a seca. E se não é 2030 é 2045. Garantido é que isto vai tudo pelos ares.
Em terceiro lugar, temos os activistas. Diferem dos alarmistas na medida em que evitam os “documentários” e outra “informação” disponível acerca do clima e saltam logo para as teses finais: a culpa é do capitalismo, em particular dos EUA (menos os EUA de Obama), de Israel, do Ocidente, das democracias representativas e de Pedro Passos Coelho. Se terraplanássemos a modernidade, com excepção dos telemóveis deles e dos carros deles e dos voos deles, o problema ficaria resolvido. São os valentes que protestam contra o muro “de Trump” mas fecham a porta de casa à chave. Face ao apocalipse iminente e indiscriminado, propõem o apocalipse imediato e selectivo.
Em quarto lugar, temos os oportunistas. Os oportunistas são que aproveitam aberraçõezinhas do calibre da pequena Greta para espalhar o pânico e ganhar dinheiro ou prestígio no processo. Não estou a criticar a energia eólica, por exemplo: estou a dizer que a defenderia com maior empenho se fosse accionista de uma empresa de ventoinhas com compinchas no poder.
Em quinto lugar, temos os socialistas. Da forma que costumam descobrir no que calha, do turismo (a “preservação da identidade histórica”) aos refrigerantes (a “educação para a saúde”), os socialistas descobrem nas “preocupações ambientais” uma oportunidade – para aumentar impostos.
Vigarices e alucinações à parte, a falta de competência técnica levou-me nos últimos anos a fugir aos debates acerca do aquecimento global, perdão, das alterações climáticas, perdão, da emergência climática. Hoje, acabei por arranjar uma posição convicta. Devo-a ao famoso consenso. Se criaturas como a pequena Greta, o eng. Guterres, o dr. Costa, o prof. Marcelo, o arquitecto Louçã e o genro do arquitecto Louçã acham que o homem está a influenciar o clima, o bom senso manda concluir que o homem, seja ele quem for, não tem nada a ver com isso. A pequena Greta e os seus fiéis fizeram-me acreditar: agora acredito que a hecatombe por via do CO2 é capaz de ser uma pantominice pegada. Logo, se as criaturas se afligem, eu ando descansado.
Mesmo que, por hipótese absurda, uma vasta quantidade de gente que nunca teve razão na vida tivesse razão nesta história em particular eu continuaria descansadíssimo. Desde já, porque bandas do gabarito dos Coldplay prometeram não voltar a tocar até que inventem concertos amigos do ambiente (estas coisas é que não se inventam). E depois porque, no limite, dar cabo de um mundo que venera a pequena Greta não me parece uma decisão excessivamente lamentável.