É difícil de justificar que não se tenham aprendido as lições retiradas do primeiro confinamento, em que a actividade judicial e arbitral esteve meses parada e, muito menos, no concreto, não é nada fácil agora aceitar que não se evitem as consequências, nefastas e irreparáveis, que o Estado de novo se prepara para determinar sem qualquer aprimoramento relevante.
O Governo apresentou uma proposta de lei na Assembleia da República contendo medidas, ditas excecionais e temporárias, com vista a uma nova suspensão de prazos judiciais. A versão a que tivemos acesso não define o termo do regime proposto. E a regra é a da suspensão de prazos em processos e procedimentos que corram nos tribunais administrativos e fiscais, no tribunal arbitral (CAAD) e nos órgãos de execução fiscal. Decidiu ainda o Governo, restringir a suspensão dos prazos em matéria tributária, como regra, à dedução de impugnação judicial e à apresentação de reclamação graciosa, de recurso hierárquico e de quaisquer outros procedimentos de idêntica natureza, bem como aos atos processuais ou procedimentais subsequentes. Estarão suspensos, ainda, os prazos para a apresentação de pedido de revisão oficiosa, de revisão da matéria tributável, de correção de erros materiais, ou de segunda avaliação de um prédio, bem como, aqui também, os atos processuais ou procedimentais subsequentes.
Por outro lado, a limitação da aplicação da regra da suspensão a atos de natureza impugnatória implicará que os contribuintes devam continuar a praticar todos os outros nos prazos legais estipulados, não ocorrendo aqui qualquer suspensão. Por exemplo, no âmbito da inspeção tributária e na sequência da notificação de um projeto de relatório de inspeção, se o contribuinte quiser exercer o seu direito de audição prévia. Não estarão, assim, suspensos, tal como no anterior confinamento, os prazos para o exercício do direito de audição no âmbito de um procedimento de inspeção tributária, o de resposta a pedido de esclarecimentos, para a apresentação ou a notificação de elementos em falta, a comunicação da afetação de prédios, o da formação do indeferimento (por exemplo, reclamações graciosas ou recursos hierárquicos) ou do deferimento (por exemplo, pedidos de informação vinculativa urgentes ou reclamação contra pagamentos por conta) tácitos, ou para a inscrição enquanto residente não habitual. E também não estará suspenso nenhum procedimento de liquidação de impostos, nem de inspeção tributária, nem quaisquer outros atos praticados neste âmbito.
Do lado da administração tributária, prevê-se que fiquem suspensos apenas os atos a realizar em sede de processo executivo, elencando-se (de forma não taxativa) as vendas, os concursos de credores, as entregas judiciais de imóveis, as diligências de penhora e seus atos preparatórios que a administração tribuária não pode promover.
É caso para perguntar, afinal, de que serviu a desmaterialização dos processos e a informatização nos tribunais e dos processos tributários? E o SITAF? Por que razão não conseguem os tribunais tributários transformar-se e adaptar-se definitivamente ao teletrabalho, às novas tecnologias e às novas formas de comunicar e de trabalhar? Porque não é o legislador quem cria um simples e justo impedimento, legal e transitório, para todas as situações que exijam a presença física, concretamente identificáveis, sem que se suspenda, por tempo indeterminado, a Justiça tributária? E como se entende que sejam os próprios advogados, os solicitadores e os funcionários, judiciais e administrativos, a exigirem uma suspensão (tão) generalizada dos prazos judiciais?