Em 5 de abril de 2022, o Conselho da União Europeia adotou a Diretiva (UE) 2022/542, que alterou a Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006 (‘Diretiva IVA’) no que diz respeito às taxas do IVA.

A Diretiva IVA inicial previa que a possibilidade de aplicação de taxas reduzidas do IVA para a eletricidade, o gás natural e o aquecimento urbano estava dependente, para evitar distorções de concorrência, de um procedimento, prévio, de autorização da Comissão, através do Comité do IVA.

No âmbito desse regime, Portugal solicitou autorização ao Comité do IVA para prever, e desde 2019, a aplicação da taxa reduzida para a componente fixa das tarifas de acesso às redes nos fornecimentos de eletricidade, correspondentes a uma potência contratada que não ultrapasse 3,45 kVA, e nos fornecimentos de gás natural, correspondentes a consumos em baixa pressão que não ultrapassem os 10.000 m3 anuais, bem como nos fornecimentos de eletricidade para consumo relativamente a uma potência contratada que não ultrapasse 6,90 kVA, na parte em que não exceda determinados consumos (tendo nessa medida sido aprovadas as Verba 2.33 da Lista I e Verba 2.8 da Lista II anexas ao Código do IVA).

Ao abrigo desta nova Diretiva, de 2022, os Estados-Membros passaram a poder aplicar taxas reduzidas e normas de isenção completa (isenção do IVA concedida a transmissões que também conferem o direito à dedução do imposto suportado nas aquisições) a uma lista mais ampla de bens e serviços do que na versão anterior da Diretiva IVA inicial. De facto, esta Diretiva 2022/542 suprimiu o artigo 102.º da redação anterior da Diretiva IVA, onde se previa inicialmente que, ‘após consulta do Comité do IVA, cada Estado-Membro pode aplicar uma taxa reduzida aos fornecimentos de gás natural, de eletricidade ou de aquecimento urbano’, passando então a prever, no Anexo III (ponto 22), a possibilidade de aplicação de taxa reduzida do IVA a estes fornecimentos.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Passou, assim, a ser desnecessária a consulta e a autorização prévias do Comité do IVA para os efeitos da aplicação da taxa reduzida do IVA aos referidos fornecimentos. Aliás, em geral, e atenta a ampliação do Anexo III da Diretiva IVA e, ainda, pela possibilidade de criação de taxas super-reduzidas, cada um dos Estados-Membros da União Europeia passou então a beneficiar de uma maior margem de manobra para rever as taxas do IVA.

Todavia, das 29 categorias constantes do Anexo III da nova Diretiva, os Estados-Membros apenas podem agora aplicar taxas reduzidas em 24 delas (salvo outros casos específicos previstos na versão atual da Diretiva IVA).

Pelos motivos expostos, parece que o Estado português não necessita de solicitar autorização ao Comité do IVA para prever uma taxa reduzida do imposto para os serviços de eletricidade e de gás natural, embora seja necessário assegurar que respeita o limite das 24 das 29 categorias do Anexo III da Diretiva IVA na nova redação de 2022.

Sucede, porém, que, com a aprovação, na Lei do Orçamento do Estado para 2022, de duas novas verbas respeitantes a taxas reduzidas do IVA (reparações de eletrodomésticos e painéis solares), Portugal poderá ter já ultrapassado o ‘plafond’ conferido pelas novas regras. Assim, sendo previsível uma revisão do sistema nacional das taxas do IVA, a decisão acerca da ampliação das atuais taxas reduzidas do IVA na eletricidade e do gás para a generalidade dos consumos será uma decisão que implica aceitar a ampliação das verbas já existentes, desde 2019, as quais se aplica já a taxa reduzida do IVA.

Ao que nos parece, atenta a atual crise desencadeada pela situação de guerra na Ucrânia, seria bem mais relevante uma decisão, por parte da Comissão Europeia, a adaptar, à semelhança do ocorrido em resposta à pandemia COVID-19 (em relação por exemplo às máscaras ou ao gel), uma decisão mais directa e transversal e que não impeça os Estados-membros de aplicar transversalmente taxas reduzidas do IVA aos produtos energéticos essenciais, ainda que, temporária e excecionalmente, tal possa implicar ultrapassar o limite ora previsto na Diretiva IVA atual.

Sempre se dirá, porém, num momento em que se fala tanto em windfall profit taxes na Europa, que os Estados, em conjunto ou individualmente e em função das receitas tributárias ‘inesperadas e excecionais’ que estão a obter, deveriam assumir a necessidade de adaptarem os seus sistemas fiscais, mormente nestes setores (energéticos) à inflação existente, atualizando, temporariamente que seja, taxas e deduções a favor dos contribuintes.