Em Portugal, há cerca de novecentas mil pessoas a receber o salário mínimo nacional, o que corresponde a 24,6% da população ativa, segundo dados do Ministério do trabalho. Ou seja, um quarto das pessoas que trabalham, recebe um valor mensal miserável com o qual não é possível satisfazer as necessidades mais básicas de um ser humano, desde a habitação até um cabaz de bens essenciais, hoje custando 205,26 euros, segundo a DECO. O Governo disponibilizou recentemente a “fortuna” de 60 euros de apoio extraordinário para as famílias mais vulneráveis, o que não é mais do que uma medida de propaganda que a imprensa mainstream engole como se fosse caviar.

Por sua vez, o salário médio é 1361 euros, segundo o INE, sendo que vai até aos 1912 euros na função pública. Não é preciso ser um perito em matemática para se constatar a grande assimetria salarial que é preciso haver para que o salário médio seja o dobro e o triplo de um quarto dos trabalhadores. Finalmente, aquilo que dá mais dores de cabeça à direita populista: no final do ano passado havia 207 mil pessoas a receber o rendimento mínimo de reinserção, com o valor de 189,66 euros, perante um valor médio de 119,58 e 260,96. Gostaria que cada um dos críticos do RSI vivesse com este valor, nem que fosse por um único mês.

E quem é que em Portugal recebe o salário mínimo? Com certeza uns mandriões que pouco valem para as empresas. Não, errado. É o trabalhador fundamental nos setores cruciais da economia portuguesa: o operador fabril no mobiliário e no calçado,  o empregado na restauração, ou qualquer mão-de-obra intensiva. Na verdade, o pobre é o melhor trabalhador, mas o menos reconhecido. Sustenta a empresa com um esforço diário que vai até aos limites humanos, mas com um salário miserável. É enganado por sindicatos e explorado por patrões. No final, são considerados substituíveis por gestores que se acham insubstituíveis. No entanto, bem vistas as coisas, são a jóia da coroa das empresas portuguesas: sem eles não haveria emprego para o gestor de recursos humanos, o gestor de marketing, o gestor de contas, o gestor de operações – afinal estes sim, os verdadeiros supérfluos, facilmente substituíveis e muitas vezes inúteis na hierarquia das organizações.

Numa sociedade imensamente estratificada e polarizada por um novo-riquismo ignorante, o problema dos trabalhadores que recebem o salário mínimo é não utilizarem termos em inglês ou complicados para dizer coisas simples, não se podem dar ao luxo de serem woke, choramingas ou vitimistas, não lêem livros irrelevantes de gurus comportamentais, não frequentaram um ensino superior nacional em crescente decadência e inadaptado à realidade empresarial. De resto, são o motor de uma economia que sobrevive à custa do baixíssimo custo do fator trabalho. E no final de cada dia têm de se mostrar agradecidos aos patrões por terem feito duas ou quatro horas a mais, no conjunto todo o valor acrescentado que enriqueceu os seus sagrados donos um pouco mais. Concluo com este pensamento: não é qualquer burro que pode puxar a carroça, com força e resiliência e contra tudo e contra todos, mas qualquer burro pode estar em cima da carroça com o chicote na mão.

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