Os incêndios florestais, além das práticas de alterações do uso do solo para fins agrícolas e das silviculturas intensivas, dentro da União Europeia (UE), têm sido a principal causa de desflorestação e degradação florestal.

“Depois de um verão de 2023 destrutivo no sul da Europa, dentro da UE, e em uníssono, pede-se à Comissão Europeia que aumente a prevenção de incêndios florestais, já que as medidas atuais, mostram-se, cada vez mais, inadequadas.”

Enquanto a Europa do Norte e a Europa Ocidental foram mais ou menos poupadas com os incêndios florestais no ano de 2023, em comparação com o ano de 2022, os países mediterrânicos, à exceção de Portugal, sofreram grandes incêndios florestais, com a Grécia a viver o seu pior incêndio de sempre, que também foi o pior da história da UE.

Após um final de agosto fatídico, todos devemos agradecer e felicitar os bombeiros europeus que enfrentaram as chamas. O mecanismo europeu de proteção civil, enquanto Mecanismo de Resgate da UE, foi ativado sete vezes durante o verão europeu de 2023, algo inédito na sua história, mas teme-se que será rapidamente superada a marca nos próximos anos.

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Mega fogos mais frequentes e cada vez mais intensos

O mecanismo europeu de proteção civil deve ter mais recursos, não só ao nível da sua abrangência e autonomia de atuação, mas também com mais recursos financeiros. Vários estudos e relatórios salientam para a necessidade de melhorar o equipamento dos bombeiros, assim como incentivar uma maior dinâmica da UE, e entre os seus Estados-Membros, para os planos de carreira e da melhoria das condições de trabalho destes profissionais.

Para além dos meios de combate aos incêndios, os esforços devem centrar-se mais na prevenção, segundo o relatório do Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais (EFFIS), que veio, no mês de setembro de 2023, apresentar e analisar os últimos dados do Observatório.

“Não é falta de recursos. A intensidade dos incêndios é cerca de dez vezes maior do que a que pode ser combatida a partir das atuais tecnologias”, destaca o porta-voz deste relatório, Jesús San-Miguel-Ayanz, chefe da EFFIS, nas suas conclusões,

O problema não é novo, mas agora e por consequência das alterações climáticas, estamos a enfrentar ‘mega incêndios’ mais potentes, que são mais frequentes e ocorrem ao longo do ano e por territórios improváveis até aqui. De acordo com o Projeto Copernicus – Observatório Europeu da Terra, houve mais incêndios em 2023 do que, em média, entre 2006 e 2022. Havendo, um previsível aumento, em número e intensidade, no futuro.

O problema da gestão florestal

Perante esta situação, é fundamental apelar aos fazedores das políticas comuns europeias, para que se intensifique a estratégia e planos de ação de prevenção. Do total do orçamento para combate a incêndios, 90% desse orçamento da Europa (EU), é gasto no seu combate, enquanto apenas 10% é aplicado na prevenção. É preciso mudar esta matriz que já provou que se está a tornar parte do problema e a afastar-nos dos caminhos que podem levar às soluções.

Essas, passam por agir atempadamente, e tais ações, só produzem resultados se realizadas de forma criteriosa; assente em ciência (que existe), em boas práticas que tenham demonstrado resultados (que existem) e em planos integrados e coordenados dentro de todo o território da União e entre os seus Estados-Membros (para o qual, em diferentes outras matérias, a EU já demonstrou tais capacidades).

A 27 de julho de 2023, a Comissão Europeia publicou orientações para melhorar a gestão sustentável das florestas, com base na Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030. Estas orientações visam gerir as florestas numa visão e versão de políticas designadas de “mais perto da natureza”, incentivando uma maior diversidade de espécies florestais para aumentar a sua resiliência e adaptação às alterações climáticas.

Mas isso não é suficiente, é necessário ir mais longe e, olhar para as melhores práticas, por exemplo inspirar-se na lei francesa aprovada a 10 de julho de 2023 em resposta aos incêndios florestais do ano de 2022. A lei francesa exige que os proprietários limpem as suas florestas, da vegetação rasteira, e dá às autoridades locais o direito de anexar as terras privadas, se e, quando elas não forem corretamente geridas, sob o ponto de vista da mitigação de riscos.

Mas para isso é necessário um quadro de financiamento para a viabilização dessas boas práticas de gestão florestal que permita aos privados a sustentabilidade financeira dessas exigências legais, coisa que não ocorre, nem no cenário alargado da União, nem nos Estados-Membros.

Para os cientistas europeus, a gestão florestal é uma questão “essencial”. Limitar a eclosão e a propagação de incêndios significa reduzir a quantidade de combustível ou matéria orgânica no terreno, limpando terrenos e criando espaço para os serviços de emergência se deslocarem pela floresta.

A inclusão de novas espécies mais resistentes, um maior controle sobre as práticas da “silvicultura de produção intensiva”, e as monoculturas de espécies altamente inflamáveis, são bases de trabalho que estão por desenvolver de forma séria. Em Portugal e Espanha, por exemplo, muito eucalipto foi plantado muito rapidamente por razões de produtividade, e isso só agravou o problema.

Também os criadores de gado têm um papel importante nesta prevenção: o pastoreio reduz o arbusto e os excrementos de animais, além de adubar os terrenos, limitam nestes, a propagação do fogo. Os agricultores, os pastores e todos os profissionais ligados às atividades da terra, devem estar nas políticas de vanguarda da prevenção. São estes que se devem tornar no exército de primeira linha da prevenção e é nestes que o investimento maior deve ser aplicado.

Sensibilização só não basta

Precisamos encontrar um equilíbrio. É evidente que 90% do orçamento não pode ser gasto na prevenção, mas é preciso fazer mais neste domínio. Alguns dos principais pontos aqui são; a consciencialização, o incentivo às boas práticas de manejo e manutenção e uma revisão das leis que não criminalizam adequadamente os infratores.

De acordo com a EFFI, 96% dos incêndios são iniciados por pessoas, dos quais; metade é causado por mão criminosa e a outra metade por atos de negligência. A estes, juntam-se e acrescem os fenómenos de abandono, em que parte dos territórios florestais, por toda a Europa, se encontram.

As campanhas de consciencialização e sensibilização são direcionadas a profissionais como agricultores, gestores florestais e público em geral. A lei francesa, por exemplo, aumenta as penas para incendiários e proíbe fumar dentro e a menos de 200 metros de florestas.

As pessoas precisam de saber que o risco de incêndio é crítico, extremo, que não podem fazer churrascos, atirar cigarros, acender fogueiras na natureza porque estas são as causas que conhecemos dos incêndios. Mas além da sensibilização, é necessário ir mais longe e criar um quadro legislativo mais punitivo, uma vez que as consequências dos atos por dolo ou negligência, têm e terão no futuro, consequências cada vez mais devastadoras, devido à alteração das condições climáticas.

O projeto europeu FirEUrisk (2021-2025), por exemplo, está atualmente a trabalhar na sensibilização e prevenção a nível europeu e regional, reunindo investigadores, peritos e o público em geral para reduzir os riscos associados aos incêndios. A UE atribuiu um orçamento de 10 milhões de euros no âmbito do programa de investigação Horizonte 2020, como recurso a aplicar neste projeto.

No entanto, uma pesquisa feita no âmbito, deste, identificou, por exemplo, na Catalunha no verão de 2023, que pequenos proprietários de terras, não cumpriram as obrigações consignadas no compromisso do programa, significando parcelas de floresta abandonadas e um óbvio falhanço operacional. O que na teoria deveria funcionar, na prática, quando no terreno: revelam-se diferentes resultados para diferentes contextos locais, e isto tudo, dentro de uma mesma Europa, onde as questões socioculturais e políticas locais, fazem toda a diferença.

A prevenção que começou no âmbito do Horizonte 2020, precisa de muito mais. Estas políticas europeias, estão longe de ser uma solução, ou conjunto de instrumentos que estejam a mostrar caminhos de sucesso, ou sequer de resultados que sejam animadores.

Soluções precisam-se

“Soluções precisam-se”, poderia muito bem ser o título de um anúncio da Comissão Europeia para dar corpo ao atual estado de resposta e prontidão europeia para o problema da prevenção. Este título expressa com clareza a falta de resultados práticos e a urgência de boas notícias, resultando em efeitos com origem em políticas assentes em prevenção que à data, são inócuas ou praticamente inexistentes.

Precisam-se de soluções alternativas que tragam respostas que demonstrem, serem esses, os caminhos para a mitigação deste flagelo que cresce em quantidade e intensidade, à medida em que o problema climático, nos vai apresentando a conta, pela forma como temos gerido a nossa ação sobre o planeta.

O complexo e intrincado quadro legislativo, com que a Europa, está acostumada a garantir uma conformidade e uniformidade com as melhores práticas, têm de forma geral, contribuído para o êxito e progresso do projeto europeu. Mas como em tudo, existem sempre efeitos colaterais.

Temáticas como esta, da gestão florestal, de complexidade que mostram desafios multifacetados de regiões para regiões, o resultado desse excesso e de uma regulação centralizada em normas, leis, regulamentos e políticas centrais que depois, lentamente são objeto de aplicação aos Estados-Membros, tem demonstrado ser um problema e não uma solução.

A abordagem das instituições de governação europeia, aqui, deveria ser mais de legislador e regulador, e menos de protagonista, ao querer, simultaneamente desempenhar o papel operacional, deixando para o mercado, esse papel, entenda-se, sociedade como um todo; entidades locais e regionais, cidadãos, empresas, ONG´s, meio académico e científico.