A certa altura do governo Passos Coelho, percebeu-se perfeitamente que as reformas estruturais necessárias para Portugal superar a crise da dívida legada pelo governo irresponsável do PS e, sobretudo, para aumentar a produtividade da sociedade portuguesa de forma a alterar o nosso vetusto modelo sócio-económico não iriam ser feitas. Foi quando o então líder do CDS decidiu demitir-se a fim de fazer cair o governo de Passos Coelho e, porventura, aliar-se ao PS de forma a impedir que tais reformas se fizessem.

Pensando provavelmente em salvar o país de uma situação semelhante àquela em que a Grécia continua depois de uma década de «austeridade», o Presidente da República e Passos Coelho impediram o líder do CDS de cumprir a sua «irrevogável promessa», mas Paulo Portas conseguiu que as reformas não fossem feitas. O governo limitou-se a partir daí a fazer os cortes obrigatórios para não ir à falência e permitiu assim que o novo líder do PS, depois das eleições de 2015, quando a economia já começara a crescer, desse o seu «golpe parlamentar» e revertesse o pouquíssimo que fora feito de maneira a aumentar o emprego estatal exigido pelo PCP e o BE…

Hoje a necessidade das reformas que não foram feitas é maior do que antes e a capacidade de as fazer menor do que nunca, sobretudo depois de os partidos da antiga coligação PSD+CDS terem levado o descaminho que se sabe, deixando-se submergir pela pseudo-euforia económica em que o país tem vivido graças à comunicação social, ao turismo e à especulação imobiliária. Tal e qual como no tempo de Sócrates, cujo julgamento ainda não está garantido… Em contrapartida, quem não espera são as reformas que teria sido necessário fazer a fim de reagir de forma positiva ao novo ciclo que aí vem de compressão económica, à desordem geopolítica e ao retraimento das trocas comerciais.

Já enumerei as reformas mais de uma vez e são de diversa ordem mas todas interligadas. A primeira é – ou melhor, seria – a constitucional: revisão da Constituição e respectivo referendo, nunca feito até hoje, de forma a restabelecer a confiança nas instituições e nos seus agentes, trazendo de novo os eleitores às urnas. Sem alteração profunda do sistema político-partidário e a revisão do sistema eleitoral, os eleitores não regressarão. A segunda é o emagrecimento da máquina estatal, mas isso seria renunciar ao clientelismo de Estado que faz viver os partidos…

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As reformas seguintes são aquelas que dizem respeito às pessoas, a saber: o declínio demográfico, o envelhecimento populacional, o agravamento das condições de saúde, a urgência da reforma do sistema de reformas e pensões, bem como a mudança do trabalho que aí vem e o equilíbrio do emprego entre jovens e menos jovens. O marasmo governativo em tudo o que é de facto vital faz com que nem sequer haja projectos de intervenção rápida nestes campos. Nem sequer há uma secretaria de Estado para a «terceira idade», mas o sistema de pensões é outra manifestação do clientelismo estatal, como se não fossem os contribuintes quem paga as pensões!

O recuo permanente das máquinas partidárias perante o medo de perder votos fá-las mentir e esperar. Finalmente, outras reformas urgentes são aquelas a que chamarei «funcionais», ou seja, aquelas onde é urgente mexer com inteligência de forma a aumentar rapidamente a produtividade do sistrema social: pela ordem do que pior funciona hoje, estão a chamada justiça, cuja disfuncionalidade é multiplicada pelos sucessivos remendos legislativos praticados pelos deputados; a seguir, os sistemas de ensino desde o pré-primário, que é mais um depósito de crianças do que um lugar onde se aprende a aprender, até às pós-licenciaturas onde continua a vigorar o espírito livresco da academia portuguesa completamente desligada, com uma ou duas excepções, da actividade prática e industriosa!

Um exemplo flagrante de sucessivas disfuncionalidades que já ninguém pode negar é o financiamento dos serviços de saúde, que são agora pagos duas vezes por muitas pessoas: 2/3 vai dos impostos para o SNS (11 mil milhões de € pagos) e o restante sai directamente do bolso de cada um (mais 6 mil milhões). Ao todo, os serviços de saúde parecem estar pior apesar de gastar quase 10% do PIB! Outro, de dimensão maior ainda, é o sistema de previdência – em especial, as reformas e pensões – onde o país gasta quase 15% do PIB (2 pontos percentuais mais do que a média europeia) e irá pagar uma percentagem cada vez maior com o envelhecimento galopante da população.

Com efeito, o índice de envelhecimento aumentou desde o início do século XXI cerca de 60%: em 2000 era 98,8, correspondendo à relação entre o número de pessoas com 65 anos ou mais e o número de jovens até aos 15; no final de 2017 já era 153,2: o terceiro mais elevado da UE! Ligados como estão o envelhecimento e a saúde, o gasto é 25% do PIB (equivalente a 50% dos impostos) e só pode aumentar se nada for feito e se mantiver a iniquidade das pensões! Não parece que estejamos a melhorar o futuro. Antes pelo contrário!