Em 1992, um muito jovem Bill Clinton decidiu concorrer à Presidência contra o incumbente George Bush pai — e a campanha estava a correr tão mal que parecia um desastre, embrulhado numa tragédia, dentro de uma catástrofe. A equipa de assessores do candidato democrata estava dividida, estava desfocada e estava perdida. Nessa altura de máximo descontrolo, Clinton teve um golpe de fé que se transformou num golpe de sorte: contratou um assessor chamado James Carville e, confiando totalmente nele, entregou-lhe as chaves da campanha. Podia ter corrido mal, podia ter corrido bem — correu muitíssimo bem. A primeira decisão que Carville tomou foi ocupar uma sala, a que chamou “gabinete de guerra”, que centralizaria toda a informação da campanha e que daria o nome ao lendário documentário “War Room”. A segunda decisão foi colocar no centro do “gabinete de guerra” um quadro branco onde escreveu a seguinte mensagem:
“Regras:
— Mudança vs. Mais do mesmo
— A economia, estúpido
— Não te esqueças do sistema de saúde”
Num livro de memórias, outro assessor, George Stephanopoulos, lembrou que, a partir daquele momento luminoso em que passaram a ter “um manifesto eleitoral resumido em 16 palavras”, “todos os discursos, todos os eventos, todos os ataques, todas as respostas tinham que dizer respeito a um daqueles três mandamentos”. E deu exemplos: “Há novas estatísticas sobre o desemprego? Emitam um comunicado — é a economia, estúpido. Bush repete uma acusação absurda de que Bill Clinton foi um instrumento dos soviéticos quando era estudante universitário? Essa é difícil, mas olha para as regras e segue-as: ‘O Presidente está outra vez a fazer mais do mesmo, a usar táticas de campanha negativas’. Há uma controvérsia sobre os apoios à cultura? É tentador responder, mas ignorem. No nosso mundo, o único pecado mortal era desviarmo-nos da mensagem”.
Vêm aí as duas semanas mais importantes da vida de Luís Montenegro e o líder do PSD não tem que inventar — só precisa de seguir o manual de instruções da equipa de James Carville. As “regras”, há 22 anos e agora, são exatamente as mesmas. Clinton tinha como adversário os republicanos, que estavam há onze anos no poder, e Montenegro tem como adversário os socialistas, que estão há nove anos no poder? Então, a escolha dos eleitores é simples: ou querem a “mudança”, ou querem “mais do mesmo”. O PS defende que, para manter o monstro estatal a funcionar, é necessária uma carga fiscal gargantuesca que impede a descida dos impostos? Então, os assessores da AD nunca se devem esquecer: “É a economia, estúpido”. Os socialistas defendem um SNS onde não há consultas, não há cirurgias, não há hospitais e não há médicos? Então, Luís Montenegro deve repetir para si mesmo, sempre que faz a barba de manhã: “Não te esqueças do sistema de saúde”.
Para conseguir fazer uma campanha desta forma, o mais importante é ter disciplina para evitar os iscos e as armadilhas dos adversários. Esta semana, Pedro Nuno Santos decidiu que a mensagem exclusiva do PS devia ser sobre os cenários pós-eleitorais. E, fatalmente, Luís Montenegro não resistiu a responder-lhe. Para usar a expressão de George Stephanopoulos, era “tentador” entrar na discussão — mas o líder da AD devia, simplesmente, ter ignorado o socialista em vez de se embrulhar num tema de campanha lançado pelo adversário. Cometeu o “único pecado mortal” do mundo da política: “desviou-se da mensagem” e permitiu que outros controlassem o tom e o ritmo da semana.
Luís Montenegro precisa urgentemente de um assessor que escreva num quadro branco o mesmo que James Carville escreveu no “gabinete de guerra” de Bill Clinton. Aquelas 16 palavras foram suficientes para ganhar umas eleições improváveis. Por isso, seguramente que, pelo menos, mal não fazem.