Caros concidadãos.
Antes de mais, como vossa concidadã, mas também como médica, gostava de vos agradecer pela responsabilidade e civismo com que heroicamente têm lutado contra esta pandemia, ficando em casa e protegendo os vossos e os meus entes queridos.
Vem agora uma nova etapa, já anunciada pelo governo, em que não podemos vacilar.
Penso que de facto agora será fundamental sermos muito racionais e sensatos na reabertura gradual, tão necessária para a retoma da economia do país. Podemos aproveitar para aprender com os exemplos dos países que começam a abrir as suas sociedades ao retomar da sua vida coletiva, ver como se concretiza o seu plano e, após uma análise bem ponderada, verificar se o seu exemplo se pode, ou não, aplicar a Portugal.
Se nos precipitarmos podemos cometer erros fatais que custarão um preço muito alto com mais perdas de vidas humanas, sendo que uma só vida que seja é sempre um preço elevado a pagar pelos erros cometidos.
Partilho convosco a minha perspetiva de um futuro diferente.
É preciso que tenhamos consciência que o nosso limiar para que esses erros resvalem numa catástrofe, dadas as caraterísticas de Portugal, é bem menor do que o da nossa vizinha Espanha. Não esqueçamos que temos muito menos capacidade de resposta no nosso SNS, logo, estamos obrigados a um pensamento crítico mais exigente, quer ao nível do planeamento político estratégico para a saúde pública, como no que diz respeito à sua operacionalização em todo o sistema.
Creio ser igualmente fundamental, antes da retoma gradual, levar a cabo uma campanha nacional de alerta e sensibilização, com recurso a uma metodologia de comunicação mais “agressiva” e necessariamente mais eficaz, com o objectivo muito concreto de promover uma verdadeira mudança de mentalidade, levando a população a compreender que não terá outra alternativa que não seja a mudança de hábitos e comportamentos no que alude às suas práticas quotidianas de higiene, prevenção e profilaxia de combate às doenças infecto-contagiosas, como no que respeita aos seus modos de interacção social.
Revela-se essencial passar a mensagem que a nova realidade não é transitória e, até que surja, entretanto, a tão almejada vacina e fármacos que nos permitam controlar e mitigar os efeitos da Covid-19, vamos ter que nos habituar a lidar com esta ameaça por tempo indeterminado.
Vamos precisar de inculcar nas pessoas a utilidade das medidas que devem passar a fazer parte da nossa rotina: máscara sempre que saímos à rua, como se coloca, como se remove, higiene das mãos, distanciamento social. Neste combate só venceremos se formos muito cuidadosos na adoção rigorosa e disciplinada destes comportamentos. O que temos feito até aqui vamos ter de continuar a fazer, mas ainda com maior atenção, com mais cuidado e rigor, para não deitarmos tudo a perder e não sermos surpreendidos por um eventual surto que nos apanhe desprevenidos ou relaxados por algum excesso de otimismo.
Apesar de acreditar que neste Natal já poderemos oferecer presentes tangíveis aos nossos familiares e amigos, tomando todas as precauções, creio, no entanto, que alguns de nós, pelo trabalho que exercemos e pela impossibilidade de garantirmos que a nossa presença será segura para os nossos familiares, só poderemos partilhar todos a mesma mesa lá para o Natal de 2021. Se cada um de nós continuar a ser responsável e cumprir bem a sua parte, a esperança de nos sentarmos todos à mesa nessa partilha será uma esperança coroada de felicidade.
Não tenhamos ilusões, o combate a esta pandemia global é uma longa maratona que temos de percorrer com paciência, muita paciência, e sem baixar a guarda por um segundo que seja.
Estou absolutamente convicta que, se Portugal conseguir provar à Europa e ao Mundo como o seu povo é capaz de viver com responsabilidade, civismo e capacidade de resposta a desafios prolongados e exigentes, daremos coletivamente testemunho de um país organizado, disciplinado, seguro e confiável. Se formos capazes de dar este exemplo à comunidade internacional, estou confiante que Portugal será um dos primeiros países a recuperar a sua economia, fazendo jus à sua História de 9 séculos.
Não tenho dúvidas que os nossos governantes e todo o sistema político, em que a oposição em geral tem sido inequivocamente responsável e solidária com as instituições e a comunidade nacional, saberão galvanizar os portugueses para esta mudança tão necessária, para que o sistema de saúde possa retomar a resposta a outras patologias extra Covid-19 e continuar a cuidar da saúde dos portugueses com eficiência e eficácia, quiçá, mais robustecido, coeso e dotado de melhores meios do que até aqui.