As sondagens para as próximas legislativas apontam para uma vitória da Aliança Democrática (AD) ou do Partido Socialista (PS), mas, num caso e no outro, sem maioria absoluta. Um dado que remete para a necessidade de acordos pós-eleitorais, tanto à esquerda como à direita, malgrado Pedro Nuno Santos se ter comprometido, ainda que de forma não definitiva, a nem apresentar nem votar favoravelmente qualquer moção de censura no caso de perder as eleições e se não existir uma maioria de esquerda que lhe permita reconstruir aquela que foi a sua maior criação: a geringonça.
Como ao longo dos debates e das entrevistas da pré-campanha, Luís Montenegro afirmou repetidamente que não tinha qualquer intenção de se coligar ou fazer um acordo de iniciativa parlamentar com o Chega, confirmando que o seu «não» é mesmo «não», o espetro político passaria a ser constituído não por dois blocos – esquerda e direita – mas por três, uma vez que o Chega se veria afastado de qualquer solução governativa, face ao cordão sanitário traçado pelos restantes partidos com representação parlamentar.
Cordão sanitário que não representa uma estratégia nova e não se circunscreve apenas aos partidos. Por exemplo, em 2003, no dia das eleições na Bélgica, um jornal, o De Standaard, indicou cinco razões possíveis para os eleitores votarem em cada um dos partidos concorrentes, mas explicitou que não havia qualquer razão para votar no Vlaams Blok (VB), hoje Vlaams Belang, circunstância que não impediu que o partido viesse a obter 24% dos votos em 2004 e a tornar-se o partido individual com mais lugares no parlamento flamengo.
No caso português, a existência de três blocos é muito saudada à esquerda, pois vê nela a possibilidade de a direita não regressar ao Poder. Esquerda de que fazem parte dois partidos populistas – o Bloco de Esquerda (BE) e o Partido Comunista Português (PCP) – defensores do populismo socioeconómico. Aquele que bebe na ideologia socialista e concebe o povo puro como os explorados.
Porém, esse facto não impede que tanto o BE como o PCP se autoapresentem como partidos que dispõem de capacidade de coligação. Um dado que aponta para a ideia de uma das ideólogas da esquerda radical, Chantal Mouffe, para quem o populismo de esquerda é bom e o de direita constitui uma ameaça para o regime democrático.
A História mostra que não tem sido fácil o relacionamento dos partidos da mainstream com os partidos populistas, sobretudo com os culturais ou identitários. Aqueles que recebem influência ideológica do nacionalismo e identificam o povo com a Nação. As três estratégias mais habituais – cordão sanitário, desapossá-los das suas bandeiras e conceder-lhes o benefício da dúvida na integração no sistema – têm conduzido a resultados muito diferentes. Por isso, não é possível identificar uma estratégia de sucesso. Daí que alguns partidos populistas tenham logrado apoderar-se do Poder, outros façam parte ou apoiem a coligação governamental, mas em posição subalterna e outros permaneçam na oposição, podendo ou não se assumir como líderes da mesma.
Por isso a colocação do título na forma interrogativa. Algo que a esquerda, tanto na visão democrática como na radical e na versão extrema, considera desnecessário. Para o PS, BE, Livre e PCP, a frase nem sequer deveria assumir a forma declarativa. Deveria, isso sim, terminar com um ponto de exclamação.
Porém, as duas décadas que levo a analisar o discurso e a praxis política dos partidos políticos, especialmente dos populistas, e o trabalho de campo que realizei em quatro continentes aconselham-me a terminar o título com um ponto de interrogação. Uma cautela que decorre de não dar por garantido que o cordão sanitário tenha resistência suficiente para enfrentar a realidade pós-eleitoral. Uma situação de que há múltiplos exemplos a nível europeu. Uma situação que também já foi vivenciada nos Açores, ainda que com resultados pouco auspiciosos.
Face ao exposto, nada melhor do que terminar esta reflexão com nova frase do tipo interrogativo: Até quando é que os partidos da direita podem não se chegar ao Chega?