Se o designo nacional é aumentar a produtividade, temos que parar de falar da disciplina de Cidadania. É um conselho justificado.

Quando se fala do tema, imagina-se uma cave, em qualquer C+S do país, onde um professor maquiavélico lava os cérebros de inocentes crianças com doutrinas de sabor alienista. Mas, na realidade, se a disciplina de Cidadania é aquilo que sempre foi, e só substituiu em designação a saudosa “Formação Cívica”, lamento ser desmancha-prazeres, mas realmente a discussão é inútil. Acreditem. É desperdício de tempo.

De facto, se, ao que me dizem, ela continua a ser o que já era no início do século, Cidadania só serve para falar sobre os problemas da turma e, se o professor estiver muito condescendente, para estudar para um teste que se tem no dia seguinte. Trata-se daquelas disciplinas em que toca sempre antes de haver oportunidade para a lecionação da “matéria” sumariada. Mas, com um bocado de sorte, a professora de Físico-Química fala sobre as mulheres cientistas e o professor de Português aborda a escravatura, por causa do Sermão de Santo António aos Peixes, e já se podem riscar “Os direitos humanos” e “Os direitos das mulheres” dos objetivos por cumprir.

Eis, pois, a lista exaustiva dos temas que, na minha imoral passagem pelo ensino obrigatório, abordei na disciplina de Cidadania, então denominada como Formação Cívica: a) as raparigas estão a demorar muito tempo no banho; b) agora são os rapazes que estão a demorar muito tempo no banho; c) o Luís anda a ser gozado e isso é mau; d) a professora de Biologia quer dar o aparelho reprodutor e não consegue porque a turma está sempre a rir. Fim.

A disciplina de Cidadania é tão importante que tem uma carga letiva de 45 minutos, geralmente em tempos pouco produtivos do dia, e é tão decisiva que nem conta para a média. Diz-se que a escola serve para formar bons cidadãos. Mas não deixa de ser curioso que a disciplina onde se reflete sobre isso não tem real valor académico.

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No fundo, acontece com a discussão sobre a Cidadania, aquilo que acontece na cena do Hipódromo nos Maias: há quem esteja muito entusiasmado com as apostas, com os gritos e os palpites, mas, na verdade, nem um terreno decente existe para a corrida começar com o mínimo de condições.

Claro que há ideologia metida no meio. Resta é saber o que é que o termo ideologia quer dizer. Para uns, ideologia são os direitos das mulheres. Para outros, a matriz cristã da Europa. Se calhar é melhor fazer uma disciplina sobre isso. Mas não se matem muito a pensar num programa. Como assim, a nota não conta e o objetivo é falar das faltas de material a Educação Visual.

Ps: Eu sei que ontem saiu uma nova encíclica papal e que o normal seria um texto sobre o assunto. Mas achei melhor não fazer com o Papa aquilo que se faz, todos os anos, com o Nobel da Literatura. Quando, um dia depois da Academia Sueca anunciar o vencedor, já há artigos de fundo e especialistas na obra premiada.