Com as eleições autárquicas à porta, avizinha-se um resultado onde o vencedor é sempre o mesmo: a abstenção. Sim, os cidadãos abstencionistas têm representado, em termos percentuais, quase o mesmo do que aqueles que se deslocam às urnas. A razão permanece uma incógnita. Não existe informação suficiente para aferir o motivo para a deficiente mobilização às urnas. Estarão as pessoas descontentes com um sistema em que não acreditam? Não sentem necessidade de se deslocarem para exercer o direito do voto? Na minha ótica, o problema reside no facto de considerarmos o voto um direito, ao invés de um dever.

As medidas para combater a abstenção têm sido poucas ou mesmo nenhumas, o que beneficia os partidos maiores, os “vencedores” crónicos. Durante décadas, aquando da ditadura, muito se falava em falta de liberdade. Mais tarde, quando o Estado Novo sofre o golpe final e se instaura, finalmente, uma democracia, Portugal acomodou-se e deixou cair o dogma que mobilizou os revolucionários, o sufrágio universal que é a maior expressão de liberdade. Os direitos absolutos de cada um de nós ficaram consagrados numa Constituição, porém esquecemos o que significa ser livre.

Hoje entendemos um pouco mais de como se faz política, seja numa mesa de café ou em casa com familiares. Essa possibilidade foi-nos conferida pelos que acreditaram numa democracia. Assim sendo, permanece por responder uma questão fundamental. De que serve a política de café se no momento de a concretizar não nos deslocamos às urnas?

Num mundo ideal todos votariam, mas todos sabemos o irrealismo que tal premissa acarreta. Neste âmbito, há que criar rotinas políticas nos mais jovens e explicar-lhes a importância de escolher o “nosso” candidato. Uma das formas mais acessíveis e propícias de produzir resultados, seria ensinar nas aulas de cidadania o que acarreta ser cívico. Desde cedo, mostrar às crianças não em quem votar, mas sim o porquê de votar. Francamente, em termos temporais, não estou muito distante dessas mesmas aulas do segundo e terceiro ciclo e devo dizer que é assustador o tipo de conteúdos abordados e explorados nesta disciplina.

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Por outro lado, existe uma segunda opção mais drástica e impactante na vida de todos nós, o voto obrigatório. Muitos retratam esta modalidade como uma violação de direitos. Ora, não seria uma violação de direitos se fosse um dever. O sentimento de pertença e o amor à nação têm de se refletir no exercício da escolha do seu representante. Não só para representar os interesses dos Portugueses em Portugal, mas também além-fronteiras.

O voto compulsório, ao contrário do que muitos apregoam, é um meio eficaz e presente na política de países desenvolvidos. Existem vários graus desta modalidade: (i) apresentar uma justificação válida para não ter votado, ou sujeitar-se a sanções; (ii) pena de multa; (iii) possível pena de prisão; (iv) perda de direitos; (v) entre outros. Levar ao extremo, com uma possível pena de prisão, será uma forma exagerada de proceder, sendo o intuito desta medida a sensibilização para o voto e não a promoção do medo de não ir votar.

Importa agora entender quais e quão bem sucedidos são os países em que vigora esta obrigação. Inicialmente irei utilizar o “Democracy Index 2020”, conduzido pela revista The Economist, no qual estão espelhados os índices democráticos de todos os países. Alguns dos países onde vigora o voto obrigatório são: Austrália, Bélgica, Brasil, Luxemburgo e Uruguai. Estes têm, respetivamente, a classificação de 9º; 36º; 49º; 13º; 15º. No mesmo ranking, Portugal ocupa a 26ª posição, porém, no critério do processo eleitoral e pluralismo, todos estes países obtiveram uma pontuação igual ou superior a Portugal. Ou seja, implementar uma medida como esta é tudo menos antidemocrático.

Quanto às sanções aplicadas nestes países quero ressalvar algumas como a perda do direito de votar durante 10 anos, a criação de desvantagem em concursos públicos para quem não exerce o voto, ou a pena de multa, a qual é meramente residual.

Resta avaliar o resultado produzido por estas medidas, no momento eleitoral. A abstenção, nas últimas eleições realizadas nestes países traduziu-se nos seguintes valores: Austrália – 8,1%; Bélgica – 11,6%; Brasil – 20,2%; Luxemburgo – 10,33%; Uruguai – 9,87%. Perante estes dados podemos compreender a gravidade da situação portuguesa, onde a abstenção nas legislativas rondou os 48,57%, ou seja, mais do dobro do que em qualquer um dos países referidos.

Olho com pesar para estes números e pondero o que será melhor para o nosso país. Perder alguma liberdade no dia das eleições, ou dar a nossa liberdade de escolha a outros Portugueses. Talvez com medidas drásticas se crie o sentido de pertença, nacionalismo e de luta pela liberdade, sentido esse que morreu e foi enterrado a 25 de abril de 1974. Nestas eleições autárquicas, vote, não deixe a escolha do seu governante para os outros.