Independentemente do que venha a suceder com esta e outras greves futuras, o Governo errou ao anunciar que vai recorrer à requisição civil no caso da greve da TAP convocada para os dias 27, 28, 29 e 30 de Dezembro. Se do ponto de vista legal os fundamentos para a decisão são duvidosos, já do ponto de vista político o erro é claro, ainda que o Governo possa entender (provavelmente mal) que a decisão o favorece numa perspectiva populista.

Pela violação da liberdade individual e pela coerção que implica, o recurso à requisição civil deve ser um último recurso e estritamente circunscrito a casos extremos. Ora, sendo certo que a greve convocada pelos sindicatos da TAP para o final do ano acarreta prejuízos económicos significativos e demonstra um total desrespeito pelos clientes e pelos contribuintes portugueses, é inverosímil sustentar que se trate de uma situação limite.

O problema não é a inconsistência que alguns apontam ao Governo por invocar o interesse público ao mesmo tempo que defende a privatização da empresa. Não há nenhuma razão de princípio – antes pelo contrário – para que serviços de interesse público não possam ser fornecidos pelo sector privado, abundando felizmente exemplos em que tal acontece, não obstante o estatismo do país. A haver inconsistência, seria aliás bem mais fácil apontá-la aos defensores da manutenção dos serviços de transportes na esfera estatal que compatibilizam a sua defesa do “serviço público” de transportes com a negação sistemática do serviço de transportes ao público por via de sucessivas greves.

Em vez de anunciar um recurso injustificado à requisição civil, o Governo deveria ter chamado a atenção para o facto de esta greve constituir mais um argumento a reforçar a insustentabilidade de manter o status quo na TAP. Se há algo que a actuação da legião de sindicatos da TAP evidencia – com as suas inacreditáveis reivindicações e as sucessivas greves desrespeitando tudo e todos – é que a situação actual é péssima precisamente do ponto de vista do interesse público. O que esta greve vem mostrar mais uma vez são os pesados custos económicos, sociais e políticos de adiar sucessivamente a privatização da TAP.

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Por outro lado, a greve demonstra também que a prioridade deve ser dada à promoção da concorrência e do aumento das opções dos consumidores. Qualquer greve da TAP tem hoje em dia felizmente consequências bem menos gravosas do que no passado por haver mais concorrência. O interesse público correctamente entendido não passa por aplicar a requisição civil aos trabalhadores da TAP, mas sim pela completa desestatização do sector e pelo aumento, por via do mercado, das alternativas à disposição do público.

Proteger o interesse público implica garantir que os portugueses não continuarão no futuro – como tem lamentavelmente sucedido até agora – a ser forçados a sustentar a TAP. A única questão em aberto face à gravíssima situação a que chegou a empresa é se o interesse público será melhor servido por uma imediata privatização ou pela liquidação da empresa. Face aos vícios acumulados ao longo de anos na TAP, às necessidades de recapitalização da empresa e às dificuldades orçamentais do Estado português, é bem possível que a liquidação seja preferível à privatização.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa