Em meados do passado mês de junho, era anunciada uma corrida de toiros à portuguesa (ou seja, com cavaleiros, forcados e sem toiros de morte) em Ferreiró, freguesia do concelho de Vila do Conde, marcada para o dia 23 de julho. Aparentemente, a Associação #JuntosPeloMundoRural (AJPMR) e o empresário tauromáquico Paulo Pessoa de Carvalho, promotores do evento, tinham reunidas todas as condições para o levar avante, porém, o espetáculo acabou por ser adiado para o dia 7 de agosto e, na véspera deste último dia, novamente adiado sem nova data prevista para a sua realização.

A razão da suspensão sucessiva da tourada deveu-se a uma não concessão do licenciamento do terreno onde a mesma se iria realizar. Em Ferreiró, não existe praça de toiros fixa, por isso os promotores ergueram uma itinerante para o efeito em terreno privado. A ausência de autorização por parte da autarquia para a construção da arena no terreno localizado no Largo da Trindade levou a que a corrida não fosse levada a cabo.

Em declarações a um dos principais canais nortenhos, o Presidente da Câmara Municipal de Vila do Conde, Vítor Costa, afirmou que “Vila do Conde não é uma terra de touradas”, não tem “qualquer tradição tauromáquica” e “nunca houve qualquer realização” de corridas de toiros em Vila do Conde, pelo que irá manter a posição de que não deve ser realizado o evento, já que entende “que é isso que os vilacondenses sentem”. Não há dúvida de que a cultura tauromáquica é menos expressiva no Norte do país, mas tal não justifica a ausência de touradas ou a recusa da realização das mesmas na região. Aliás, muitos haviam comprado ingressos, uma vez que os promotores já organizaram uma devolução do valor dos mesmos, e, alegadamente, a corrida em questão servia para homenagear as praças de Viana do Castelo e Póvoa de Varzim, históricas e encerradas há anos para a realização de touradas.

Sem entrar nos detalhes jurídicos e trâmites legais que levaram aos adiamentos da tourada em Ferreiró, é inquestionável a “má-fé” e a manifesta oposição da autarquia vilacondense, na pessoa do seu Presidente, ao espetáculo que (esperemos) ainda virá a ser realizado pela AJPMR e por Paulo Pessoa de Carvalho. O ataque à tauromaquia é nítido e este é mais um episódio para juntar ao fim da transmissão de corridas de toiros na televisão pública e à taxa de IVA discriminatória de 23% sobre os bilhetes de touradas e outros espetáculos tauromáquicos. Lembre-se que a taxa de Imposto sobre o Valor Acrescentado é de 6% para a maioria dos restantes eventos culturais.

É errado o cancelamento de uma expressão cultural como a tauromaquia, que faz parte da cultura portuguesa e está consagrada na lei. Só em agosto, serão realizadas, em média, cerca de duas corridas de toiros por dia e, até ao final do ano, o número de touradas realizadas atingirá as duas centenas, ultrapassando os níveis pré-pandemia. A primeira atividade taurina em Portugal data de 1258 e, desde então, ganhou expressão e está hoje enraizada na cultura lusitana. Lisboa conta com a catedral mundial do toureio a cavalo, a Praça Monumental do Campo Pequeno, e consagrados cavaleiros e matadores de toiros lusos carregam, com exemplo e profissionalismo, a nossa bandeira mundo fora. Ainda que cada vez menos popular, a tauromaquia conta com inúmeros aficionados (ou seguidores) que merecem ser respeitados e livres de exercer o seu direito de realizar e assistir a corridas de toiros, tal como respeitam a liberdade de quem não é da mesma opinião.

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