Há dias, o Ministro da Administração Interna anunciou, em plena entrevista ocorrida durante o Podcast Socialista ‘Política com Palavra’, que, após ter tido uma “conversa muito construtiva” com o Presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas e com a Presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, pretende contratualizar um acordo que permita às forças de segurança usufruírem dos equipamentos de instituições de ensino superior para efeitos de “realização pessoal” e de acesso aos “equipamentos de alimentação, nas mesmas condições em que acedem os Professores e alunos”. Na prática, isto significa que os agentes da PSP e guardas da GNR poderão tomar refeições nas cantinas das universidades e politécnicos.

Pode parecer pouco evidente o objetivo por detrás desta medida. José Luís Carneiro diz que “é uma forma de colocar as forças de segurança numa abordagem de proximidade e de diálogo com as instituições e com aqueles que nas instituições se qualificam”. Ou seja, proporcionar momentos de confraternização entre polícias, guardas e alunos? Mais, a medida vem, teoricamente, em auxílio da melhoria, dignificação e motivação das forças de segurança, de forma a que Portugal continue inserido na lista dos 10 países mais seguros do mundo, afirmou o Ministro. Para um jovem estudante, até pode ser interessante ter um amigo polícia ou guarda, porém, para os agentes de autoridade e militares, os benefícios desta medida são provavelmente inócuos. Ademais, o presidente da Associação Sindical dos Profissionais de Polícia, Paulo Santos, afirmou que, dada a natureza da profissão e falta de efetivos, muitas vezes os polícias nem tempo têm para almoçar.

A realização pessoal dos efetivos das forças de segurança não se atingirá com almoços grátis. Podia começar por uma revisão das tabelas salariais de agentes e guardas, medida que muito tem sido solicitada pelas associações que representam estes profissionais. Ora, justiça seja feita, pois o Ministro referiu, logo no início da entrevista, que o melhoramento da remuneração dos quadros da PSP e GNR está previsto no Orçamento do Estado para o ano corrente, tendo detalhado que um polícia ou guarda em início de carreira terá um aumento salarial entre os 90 e os 117 euros já em 2023. Sejam esses valores brutos ou líquidos, certamente são magros e insossos para um jovem PSP ou GNR.

Não obstante, o Ministro anunciou um investimento de 250 milhões de euros em novas esquadras da PSP e postos territoriais da GNR, bem como na requalificação daqueles que de tal intervenção carecem. Anunciou ainda uma alocação da mesma ordem para a modernização tecnológica das forças de segurança, para uma mais rápida deteção de ameaças e prevenção de riscos, integrando um sistema de inteligência artificial (ou “AI”, depende dos gostos) de ponta. Ainda que ambas pareçam medidas pertinentes e oportunas, é preciso ter em conta que, precisamente no mesmo dia da entrevista a José Luís Carneiro, o Sindicato Nacional da Polícia revelou números que, embora muito menos pomposos, não são por isso menos relevantes. Em 1.020 candidaturas abertas em maio de 2022 para novos agentes da PSP, só 648 candidatos iniciaram o curso de formação. Entretanto, já desistiram 52. E porque é que os jovens abandonam o curso da PSP? Porque, enquanto frequentam o mesmo, recebem propostas de emprego com salários mais atrativos, afirmou o presidente da Sinapol, Armando Ferreira.

É crucial atribuir um vencimento justo aos agentes de autoridade. Se um polícia ou guarda que não possua um curso superior consegue facilmente auferir mais noutro cargo que seja, há um problema de base que não se resolve a aumentar um pouco ao subsídio de risco, um pouco ao vencimento, um pouco aqui, outro tanto ali… muito menos com almoços grátis.

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