“Talvez ele cuide de mim quando eu for mais velha” é uma frase que vou escutando com  frequência em alguns pais de adolescentes. Reconheço que o “talvez” me incomoda. Mas só a dúvida de que esse cuidar possa não acontecer me deixa boquiaberto.

Ao mesmo tempo, já escutei de muitos filhos, adolescentes e mais crescidos, que deixarem os pais num lar e nunca mais os irem ver parece ser uma hipótese de se “vingarem” dos pais que têm. Alguns ousam dizer-lhes isso. Dir-se-á que pode ser uma fúria do momento. Eu acho que sim. Mas só a ousadia de isto se afirmar me preocupa.

Há uma diferença entre o “mau feitio” e a “má criação”. E parece-me que os pais, na sua bondade, hoje desculpam algumas “más criações” porque alguém lhes sugeriu que a autoridade dos pais traumatiza as crianças. Porque elas têm “baixa auto-estima”. Ou porque a adolescência  é uma idade “parva”. Ou, mesmo, estúpida. Ou, quando eles são mais velhos, porque se têm de concentrar na carreira, que é uma forma de aceitar que se descuidem em relação aos pais.

O que a mim me preocupa é que se tenha convencionado eleger a teimosia, o “eu é que sei!”,  o egoísmo e a vaidade como imagens de marca da “personalidade forte”. Como se isto tudo fossem os antídotos da “baixa auto-estima”. E como se a “baixa auto-estima” fosse uma espécie de epidemia atípica contra a qual os pais vão cedendo nas exigências de cuidados que os filhos têm de ter.

É verdade que eu alerto os pais para o desejo, legítimo, dos filhos serem bons “a tudo”. E recordo-lhes que, quando eles não se sentem bons a tudo”, acabam numa lamúria pegada que os leva a concluir que “não prestam para nada”. Mas haverá alguém que, sendo pequenino, estando a aprender, vivendo debaixo duma exigência de resultados escolares que não é meiga, e repartindo a seu crescimento entre escola e quase um sem-número de actividades extracurriculares seja a bom a tudo?… Terão sido, já agora, os pais bons a tudo? No entanto, à cautela, eu digo (porque é verdade) que tenho nada contra as boas notas. Desde que os miúdos tenham, também, boas notas como filhos, como netos, como irmãos, como amigos, com boas pessoas, etc.

Ora, quem é bom aos 8 ou aos 9, aos 14 ou aos 15, ou aos 20 e aos 25? Porque diabo passamos a vida a dizer aos nossos filhos que eles, escolham o que escolher”, têm de ser bons (é uma forma de lhes dizermos, com timidez, que esperamos que sejam os melhores…) nalguma coisa? Porque não hão-de eles começar por ser, antes de tudo o mais, boas pessoas? É, por acaso, incompatível eles serem briosos naquilo que fazem e cuidadosos em relação a quem os ama? É, por acaso, pecado exigirmos que eles sejam sempre bons filhos?

Não, não é suposto que os filhos só tratem dos pais quando eles forem “velhinhos”. É suposto que eles tratem sempre BEM dos pais! Assim os pais tenham tratado deles com todo o amor e carinho. O que, valha a verdade, acontece tantas vezes que falarmos com medo da solidão na velhice nos devia levar a zangar. Muito!

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