No rescaldo da tragédia dos mais recentes, não os últimos, incêndios florestais em Portugal, temos assistido ao habitual pico de fluxo mediático que, muito mais do que informar, ajuda à ocupação de espaços noticiários. Desta forma, pela premência da catástrofe próxima, o atentado terrorista abortado na estação central de Bruxelas, os atropelamentos em Londres, as greves em perspectiva e os tremendos feitos económicos do nosso Governo passaram para segundo plano. É normal. Confrontados com o esbulho de vidas dos nossos vizinhos e compatriotas, tudo passa a ter uma dimensão que a geografia afasta de nós, como no caso de Bruxelas ou do incêndio de Londres, ou é secundarizado pelo gigantismo da morte que nos assusta e dói.
Perdeu-se muito mais do que vidas no sentido físico do termo. Foi toda uma vitalidade que se foi. Alguma coisa terá falhado. Até para o imprevisível tem de haver uma resposta ensaiada, pelo menos pensada. É na redundância, no ensaio, no treino até ao limite do enfastiante que se alcança a perfeição. Na planificação, para usar uma palavra simples, e na verificação de que tudo poderá decorrer, imediatamente, de acordo com o programado. Segurança é prevenção. E, tal como na saúde, o processo preventivo estende-se desde a criação de condições menos favoráveis aos fogos, até ao combate às chamas e tratamento de feridos.
Quando todos falam da floresta, com razão, devemos interrogar os responsáveis – os accountable, como dizem os ingleses – antes de nos confrontarmos com os responsible, aqueles que todos procuram depois das consequências. É por isso que aqui pergunto, desejoso que esteja tudo feito, programado, ensaiado, quantos hospitais e centros de saúde têm os seus sistemas de alarme para incêndios a funcionar? Há detectores de fumos? Os aspersores automáticos estão instalados e a funcionar? Os extintores estão todos verificados e localizados em locais que sejam do conhecimento de todos os interessados? As saídas de emergência estão desimpedidas? São os adequados para os diferentes tipos de ignições e combustíveis? Há equipas de resposta rápida nas instituições? O estacionamento está ordenado e as vias para os bombeiros estão desimpedidas? Têm sido feitos ensaios de evacuação e resposta ao fogo e a outros desastres?
Deve estar tudo bem. Legislação não falta, até a internacional. Não gostaria de ver o nosso ministro fardado de INEM, rever a Dra. Constança de colete protector de civis, nem assistir a mais abraços emocionados, seguramente necessários, mas inúteis para quem já morreu. Fico sempre com a sensação de que a presença das “altas individualidades”, suando de solidariedade, atrapalha quem trabalha e só serve para nos deixar a sensação de que pretendem aparentar fazer tudo o que deviam ter feito antes. Como se a visão repetitiva e cansativa da sua imagem nos garantisse o que não foram capazes de assegurar no momento em que o deviam ter garantido. Posso estar enganado. Todavia, há momentos para a política e momentos para a acção. E, ainda que em campanha eleitoral antecipada, há momentos para a reserva e respeito. Neste ponto, a oposição – e mesmo os partidos que apoiam a coligação no poder – tem sido bem melhor do que o Governo.
Não virá ao caso, agora que choramos mortos e tratamos de feridos e desalojados, mas há um episódio que ilustra bem a falta de antecipação que caracteriza alguma da acção do Estado. Há mais de um ano, numa outra publicação, alertei para a necessidade do Governo iniciar o processo de eventual “conquista” da agência europeia do medicamento para Portugal. Está em Londres e, por via da tolice do Brexit, vai ter de ser colocada noutro ponto da Europa.
Em junho deste ano, porventura muito dentro do prazo e numa altura em que as negociações do Brexit estão por começar, foi decidido que Lisboa seria a localização ideal para a candidatura Portuguesa. Parece lógico e todos pensámos que essa decisão teria sido fruto dos estudos, entretanto realizados, sobre as vantagens e desvantagens comparativas face a outras cidades nacionais e internacionais. O Parlamento aprovou. Levantaram-se logo vozes, reclamando outros possíveis locais. Houve de tudo, com especial enfoque para os que nem aeroporto possuem nas imediações.
Mas há o Porto. Porque não? Julgávamos nós que a Invicta teria sido também analisada. Ora, dando prova da ausência de estudo e planeamento atempado, o Governo, que agora tem candidato próprio no Porto, veio logo desfazer a sua decisão e demonstrar que tinha decidido por instinto. Não tinham pensado no Porto? Ou, confrontados com dificuldades na luta autárquica que se avizinha, precisavam muito de dar um tempo de antena ao Dr. Manuel Pizarro? Não podiam ter pensado nisso antes? Na localização da EMA, na prevenção e resposta aos fogos florestais e no risco de incêndio nos Hospitais e Centros de Saúde?