1 Devia ser proibido — sim! — que os pais sejam amigos do Facebook dos filhos. Tão proibido como eles vigiarem todos os seus recreios ou colocarem um programa-espião a esmiuçar todo o seu correio electrónico.

2 Devia ser, igualmente, proibido que as crianças de 13 anos tenham dados no seu telemóvel sem que os pais — sempre que entendam que é recomendável, e em presença dos filhos — não acedam aos lugares pelos quais eles “navegam” de modo próprio. Até porque é frequente que, mal coloquem mais de 100 likes num conjunto de conteúdos a que acedam, haja quem lhes envie convites para sites com conteúdos muito próximos da pornografia e haja quem, fazendo-se passar por pessoas pouco mais velhas, as convidam para castings de moda e sessões (mais ou menos ousadas) de fotografia que, depois, acabam mal.

3 Se já é grave que muitas crianças com menos de 13 anos tenham um perfil no Facebook, mais grave se torna quando ele é criado pelos pais, muitos antes dessa idade. E mais grave, ainda, quando pais e professores são amigos de Facebook das crianças e partilham fotografias e comentários “a pisar o risco” que faz com que, a seguir, não fique muito claro, para os mais pequenos, se o bom senso é uma característica dos mais crescidos ou, se pelo contrário, ela parece ficar ameaçada mal se põe o pé nas redes sociais.

4 É claro que todos compreendemos a preocupação dos pais em relação aquilo que se passa no Facebook dos filhos. Justamente por isso, é compreensível que eles queiram criar o perfil dos filhos, para prevenirem quaisquer “excessos de adolescente” que ele possa ter. E aceita-se, ainda, que, na ânsia de nada se passar nele à margem do seu conhecimento, que queiram ser seus amigos de Facebook. “Pedido de amizade”, aliás, que os filhos adiam aceitar até não poderem mais. Porque, não podendo rejeitar esse pedido (para não magoarem os pais) entendem — e bem! — que os pais se tornam um bocadinho intrusos junto de todos os seus amigos, o que faz com que um adolescente seja motivo de chacota, sobretudo quando os pais colocam “likes” a preceito. E quando fazem um ou outro comentário que transformam a sua presença “indetectável” no Facebook como a daqueles agentes secretos que vestem gabardina e põem um chapéu e óculos escuros e ficam mais ou menos sem jeito quando todos os desmascaram sem que eles percebam porquê.

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5 Talvez porque essa “amizade de Facebook” entre pais e filhos seja muito constrangedora para os filhos, percebe-se (mas não se aplaude) que os filhos criem um segundo perfil, mais reservado, um bocadinho à margem de um certo “estou numa relação difícil” que a presença dos pais no seu “perfil oficial” devia merecer.

6 A internet, as redes sociais e os dados a que os nossos filhos acedem, livremente, são um admirável mundo novo; sim! Mas considerarem o telemóvel como “uma parte do corpo” dos seus filhos e demitirem-se, em absoluto, de se assumirem como “entidade reguladora” quando se trata de os proibirem (!!) de usar o telemóvel ou o tablet depois do jantar, enquanto estudam, ou quando vão ao restaurante já não se entende. Como não se entende que as escolas permitam que eles os usem dentro do espaço escolar. E não se pode senão reprovar que os pais lhes passem um iPad ou um telemóvel para a mão, nos restaurantes, para que eles estejam quietos e calados. Porque, na verdade, passamos a vida a permitir-lhes doses tóxicas de consumo de écrans e, depois, achamo-nos vítimas, sempre que eles ficam “agarrados” a eles.

7 A dependência de internet entre os nossos filhos é tão inquietante que faz com que as “cruzadas”, de antigamente, contra os desenhos animados “violentos” tenham, hoje, um estatuto semelhante ao de um paraíso E isso é — mesmo! — muito mau!! É claro que ter, em 15 dias, 150 novos amigos sabe bem. Pode-se não ser o mais popular da turma. Mas ninguém pára a sensação de se ter um perfil de sucesso. Enquanto isso, 25% dos nossos filhos passa mais de 6 horas na internet, de segunda a quinta-feira. Passam 25 horas por mês em frente do YouTube. Mais de 60% consideram-se “dependentes” da internet. E mais de metade dormem menos do que o recomendado, por causa disso.

8 Os pais preocupam-se quando os filhos são influenciáveis; mas regozijam-se quando são “influenciadores”. Preocupam-se com as “más companhias” mas vivem com indiferença o facto deles serem, simplesmente, “seguidores”.

9 Os pais passam a vida a querer saber os lugares que os filhos frequentam e quem são os seus amigos (e os pais dos amigos). Mas não sabem o nome dos “amigos” de Facebook, os “amigos” do Instagram, do YouTube ou do TicTok. Sobretudo quando, por exemplo, em relação ao YouTube, eles têm “carta branca” para andarem nos sites para bebés, para verem desenhos animados, para se instruirem com programas de ciência sem que, no entretanto, os pais se preocupem com inúmeros youtubers que, em condições normais, nunca seriam amigos deles. Por mais que os filhos os “consumam” horas a fio, todos os dias.

10 Desculpem: eu acho muito importante que uma adolescente pergunte aos políticos do mundo: “Como se atrevem?…”, quando se trata de todos destruirmos o planeta. Já fico sem jeito quando vejo o ar quase embevecido de alguns, como se estivessem mais satisfeitos por parecerem “cabeças abertas” do que propriamente a escutassem. Mas definir uma regra com bom senso e, sempre que os nossos filhos “pisam o “risco, haver quem lhes diga “Como te atreves?!…”, é que parece que deixa os pais com calafrios. Seja como for, a propósito da dependência em relação aos écrans ou às redes sociais, acho que os pais confundem ser-se “fixe” com serem bons pais. E é diferente! Quanto mais “fixes” temos a ilusão de ser mais os nossos filhoses tornam atrevidos. E isso não é mau; é, mesmo, um perigo, sobretudo para eles.

11 Por tudo isto, ser “fundamentalista” em relação ao “purismo” com que entenda interditar o acesso do seus filhos às redes sociais não é razoável. Mas demitir-se de definir regras de utilização em relação a elas também não é melhor. Nem em relação às redes sociais queira ser só “amigo” deles. Também aí, os pais definem regras. Fazem-nas cumprir. Repensam-nas. Aprendem com os seus erros. Mas não podem viver debaixo de ânsia de serem só “fixes”. Até nas redes sociais os pais são pais! E os pais têm de assumir uma ideia do que entendem correcto e protector. Não podem ser como aqueles pais que — seguramente, bem intencionados — dizem “Yah!” ou “Bué”, muitas vezes, e, depois, nem sequer conhecem os filhos, não sabem o nome do director de turma ou sabem quem são os melhores amigos dos seus filhos.