Recentemente o Tribunal Administrativo de Braga indeferiu a providência cautelar de Artur Mesquita Guimarães, que visava travar o “chumbo” dos seus dois filhos, alunos de mérito, pela não frequência da Disciplina de Cidadania e Desenvolvimento. Trata-se de um processo administrativo (e depois judicial) que se arrasta desde o ano lectivo 2018/2019, cujo confronto se repete este ano, já com antecedentes de envolvimento do Secretário de Estado da Educação, João Costa, que, intransigente, não aceita a objecção de consciência dos pais, que consideram que a disciplina vai contra o art. 43º da Constituição e do art. 26º da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Alega-se que a disciplina é inofensiva e que promoverá boas práticas de cidadania. Será mesmo? Vamos a factos! Antes de mais, impõe-se a leitura de todos os referenciais da disciplina. Depois de lidos, fica muito claro que há, efectivamente, promoção da implementação da “teoria do género”, que não tem respaldo nas ciências, razão pela qual é chamada de “ideologia de género”, da sexualização precoce das crianças e da desconstrução da Família, entre outras abordagens que denunciam o desprezo pela cultura, identidade e soberania nacionais. Não falta evidência de elementos de doutrinação e de engenharia social, dos quais se descreve apenas uma diminuta parte, com recursos escandalosamente impróprios para o Ensino, como se expõe no final da segunda parte deste artigo, em “links”.

1 Promoção da “Ideologia de Género”

Os referenciais para o Domínio Igualdade de Género ocupam 980 páginas num universo de 2360 páginas, isto é, mais de 40% de todos os referenciais destinados aos doze domínios de estudo da disciplina. Portanto, este tema assume claramente uma particular importância nas intenções (muito duvidosas) do Governo.

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Sob o pretexto da “igualdade de género” – qual cavalo de Tróia para a “ideologia de género” -, pode ler-se, em todos os Guiões para a Educação de Género e Cidadania (GEGC): «esta caracterização (…) dos homens e das mulheres em termos pessoais e sociais, a partir do conhecimento da sua categoria biológica de pertença (…) [é uma] visão dicotómica [sem] qualquer fundamento científico»; «parece-nos extremamente pertinente e útil, para uma actuação pedagógica que contrarie preconceitos e discriminações, a distinção entre sexo e género»; «não é de prever que, com três anos apenas a criança consiga (…) desenvolver uma identidade de género permanente».

No GEGC do Pré-escolar (p.52): «considerando a importância do período dos zero aos seis anos na construção da identidade de género e na formação do conceito de género, a intervenção educativa deve promover uma atitude de equidade face ao género.».

 

No 3.º ciclo: «as fronteiras antes tão bem demarcadas pelo corpo vivido e, fundamentalmente, pelo projetado (…) estão mais flexíveis, inconstantes e, a qualquer momento, reversíveis» (p. 86) ou «a definição da masculinidade, como na de feminilidade, no e pelo corpo, é um processo social em nada imutável.» (p.87).

2 Linguagem inclusiva/neutra

Com vista à implementação da “ideologia de género”, é proposta a linguagem “inclusiva”, enquanto precedente para a “linguagem neutra”: «o uso do masculino genérico (…) é uma prática de tal modo enraízada e naturalizada que o recurso a alternativas é geralmente recebido com grandes resistências, defendendo-se o modelo da neutralidade linguística.» (GEGC – 2º e 3.º Ciclos); «Neste sentido, defender a utilização de uma terminologia não sexista pode mudar a percepção dos significados atribuídos às mulheres e aos homens.»(GEGC – 2º e 3.º Ciclos).

3 Sexualização precoce das crianças

Considerando que a promoção da “ideologia de género” se faz sempre acompanhar da sexualização precoce das crianças, não faltam alusões a esta última, com objectivos no mínimo impróprios, para crianças de seis a doze anos: «compreender e respeitar a diversidade na sexualidade e orientação sexual»; e dos dez aos doze anos: «identificar os diferentes métodos contraceptivos». (Referencial de Educação para a Saúde, dos 1.º e 2.º Ciclos).

Escandaloso, também, é o exercício prático que se propõe a jovens dos doze aos quinze anos (atente-se a idade!), que visa a discussão dos papéis em matéria de sexualidade (GEGC, p. 146): «Quem manifesta primeiro o desejo de maior intimidade sexual?»; «Se for manifestada, por ambos, a intenção de ter relações sexuais, a quem cabe falar da utilização de métodos contraceptivos e de prevenção de infecções de transmissão sexuais?»; «Que princípios, então, devem pautar o relacionamento afectivo e sexual entre os indivíduos?»

4 Desconstrução da Família

Também não falta evidência da intenção de desconstrução da Família, tal como é concebida nas fundações da sociedade ocidental.

Logo no GEGC do Pré-Escolar (p. 95), consta: «Esta diversidade impõe algumas reflexões: será que tem sentido celebrar o Dia do Pai ou o Dia da Mãe como tradicionalmente se fazia? Como é que se explica às crianças esta diversidade de situações? Como é que as famílias toleram esta diversidade?».

E, no 1.º Ciclo, parece ser inclusivamente promovido o conflito de gerações (GEGC, p. 63): “Este sentimento de receio [em relação à abordagem das questões de género] é enunciado de várias maneiras: «temos que evitar o conflito!»; «Mas isso poderá entrar em conflito com as famílias…»; «Contudo, convém relembrar que há uma dimensão do conflito essencial ao desenvolvimento e à aprendizagem.».

No 3.º ciclo (GEGC, p.158), assiste-se à desvalorização da heterossexualidade, enquanto vivência da mulher: «Uma consequência destas realidades é a sobreavaliação, por parte das mulheres, da importância das relações afectivas heterossexuais associadas ao casamento, assumindo-as como uma forma de se sentirem valorizadas e adequadas ao que a sociedade espera.»

 

5 Desprezo pela cultura, identidade e soberania nacionais

Mantendo uma perspectiva de doutrinação na Disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, surge o desprezo pela cultura, identidade e soberania nacionais: «(…) se se pretende viver, compreender e promover sociedades onde a ordem e a justiça social possam coexistir num mundo plural e misto (…) é essencial que se faça uso de aspirações igualitárias de cidadania distanciando-a do conceito de nação e aceitando-se a multiplicidade de “pertenças” das pessoas» (GEGC, Pré-Escolar e 1.º/2.º/3.º ciclos); «hoje, a globalização é a expressão deste processo, assente na transnacionalização económica e em mecanismos de governação à escala global.» (Referencial de Educação para o Desenvolvimento (RED), p.12); «compreendem ainda que a um mundo mais complexo, globalizado e interdependente, corresponde uma Cidadania Global desterritorializada, fundada em valores comuns (…)» (RED, p. 13); «entender a contracultura como fenómeno potenciador da mudança social.» (RED, p. 45)

6 Mecanismos de engenharia social

Para alcançar os fins, recorre-se a propostas de “exercícios práticos”, quais mecanismos de engenharia social.

No Pré-escolar, as crianças são conduzidas a «questionar a relação entre identidade biológica e características da personalidade (ou seja, a relação entre sexo e género)» (p.71); são propostos exercícios práticos com «simulação ou jogo de papéis (role-play)» para as actividades de menino e menina (p.76); «as crianças pesquisam sobre a vida de animais com formas de expressão da sexualidade diversa da humana, tal como o caracol; e formas não estereotipadas de expressar o género, tal como a agressiva rainha das abelhas ou o cuidadoso pai castor.» (p.76).

No 1.º Ciclo (seis a dez anos), é desconcertante perceber a abordagem totalmente inapropriada de certos temas, propondo a discussão da citação: «“As mulheres são os pilares dos lares. Devem estar preparadas para ganhar o pão de cada dia se tiverem a infelicidade de arranjarem um homem que passe a vida nas tascas a jogar e a embebedar-se”, sentenciava.» (GEGC, p.74).

E, já no 3.º Ciclo (GEGC, p.196), expõe-se a carreira como prioridade na vida da mulher, desconsiderando as suas próprias escolhas noutro sentido: são apresentados seis gráficos idênticos, comparando a ocupação de quadros superiores e de direcção por estado civil, insinuando que as mulheres casadas (em particular “com registo”), em contraste com as separadas, divorciadas, viúvas e solteiras, vêem mais travado o sucesso profissional e progressão na carreira, acrescentando: «Segundo um inquérito europeu (Eurobarometer 39.0, 1993), cerca de 14,7% dos inquiridos considera o casamento como um obstáculo à vida profissional feminina e apenas 1,8% o consideram como um obstáculo à vida profissional masculina. Em relação ao nascimento dos filhos, 5,2% apontam-no como prejudicial à carreira profissional masculina, sendo que 31,1% considera o nascimento dos filhos como obstáculo à vida profissional feminina.».

 

7 Vigilância e “denúncia” das vivências familiares

E parecendo promover a confrontação dos filhos com os pais, assiste-se, à proposta de exercícios práticos que mais não são que a vigilância e “denúncia” das vivências familiares para confrontação.

 

Um dos exercícios práticos solicita às crianças para descreverem as tarefas domésticas que o pai e a mãe fazem em casa e são levados a reflectir sobre isso (GEGC, Pré-escolar e 1.º Ciclo).

Os professores são induzidos a «procurar saber: qual a constituição dos agregados familiares em causa? Existe um elevado número de mulheres trabalhadoras? Que profissões são mais frequentes? Quem traz habitualmente as crianças ao jardim de infância? Quem participa habitualmente nas reuniões e nas atividades organizadas?» (GECG – 1º Ciclo, p. 66).

8 Apologia do aborto e activismo LGBT

Nos manuais educativos da Amnistia Internacional, enquanto recursos, assiste-se à apologia ao aborto livre e indiscriminado, onde são sempre referidos os “direitos da mulher”, sem referência ao embrião/feto enquanto Vida humana a proteger.

No domínio da Sexualidade, promove-se o activismo LGBT, pela apresentação de brochuras e documentos da Rede Ex Aequo e ILGA (que constam como “links úteis”) e volta a não faltar a defesa da Ideologia de Género nos “recursos”, desde logo muito duvidosos:

Por tudo o que foi apresentado, não surpreende que, consciente do processo de aculturação e doutrinação em curso, assistamos a um pai que procura impedir que os seus filhos se vejam obrigados a frequentar as aulas da Disciplina de Desenvolvimento e Cidadania.

Famílias, pais, professores e educadores devem unir-se e insurgir-se para abolir a doutrinação no Ensino, enquanto processo inconstitucional, porque os filhos não são do Estado.

«O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer diretrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas.» – Nº2 do Artigo 43.º da Constituição da República Portuguesa

«Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o género de educação a dar aos filhos.» – Nº 3 do Artigo 26.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem.

A autora não reconhece o AO 1990.