Algumas distinções são muito importantes, mesmo essenciais. Convém ser capaz de distinguir, por exemplo, entre o crime e a arma do crime, entre o homicídio e o instrumento1 usado na sua consecução. O homicídio é crime, mas o instrumento usado no homicídio não é maldoso, nem culpado do crime, nem causa dele. Se puder ser usado tanto para o bem como para o mal, o instrumento não é mau nem bom, é eticamente neutro. Assim, embora o homicídio deva ser sempre proibido em todas as suas variedades e circunstâncias e, quiçá, punido2, a ferramenta usada para cometer o crime, a sua posse ou uso para outros fins, pode ser razoavelmente tolerada e, possivelmente, subsidiada.

O homicídio é não só um crime, mas é um crime horrível. Nenhum outro ato humano se lhe compara em hediondez, nem mesmo a nacionalização3, o saneamento4, os salários de miséria5, a inflação ou a tributação6. A razão deve-se ao valor ontológico imenso e imensurável da vida humana, de toda e de cada uma, de todos os homens7. Sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem social ou nacional, incluindo espanhóis, escalão do IRS, idade, ou qualquer outra condição da vítima. E também nenhuma distinção de orientação ideológica, filiação clubística, profissão, incluindo as exercidas em hospitais8, grau académico, cargo político, encerebração sexual, opções dietéticas, desporto praticado ou cor das unhas do homicida atenua a torpeza do seu ato.

Por seu lado, a arma usada no crime não é, em si, má. Uma faca, por exemplo, tem múltiplos usos. Pode ser usada por um veggie para cortar uma cebola, o que não é crime por muitas lágrimas que cause, ou por um grupo de cristãos para degolar 21 trabalhadores migrantes da construção civil numa praia Líbia a 12 de Fevereiro de 2015, o que já é.9 Não faz sentido proibir facas, o seu fabrico, a sua posse ou o seu uso, pois são instrumento essencial para o bem-estar da Humanidade, mesmo que de vez em quando alguns fanáticos religiosos as usem para matar pessoas. Semelhantemente, uma solução salina pode ser usada na desobstrução das cavidades nasais, contribuindo assim para o nosso bem-estar ainda que causando algum ardor local, ou para matar um ser humano intrauterino causando-lhe um sofrimento horrível, prolongado e desnecessário, mesmo quando realizado com subsídios do estado social. Apesar das atrocidades bárbaras e cruéis que se podem cometer com o sal10, não faz sentido proibir a sua extração, venda ou posse mesmo que seja frequentemente usado por sádicos nos seus crimes contra a humanidade.

Infelizmente distinções básicas como esta parecem ser cada vez mais difíceis de fazer, até por irresponsáveis em posições de responsabilidade. Joe Biden, por exemplo, considera que um massacre em que o suspeito, com motivos aparentemente racistas, matou 6 pessoas e feriu 62 usando um automóvel durante um desfile em Waukesha, WI, não é suficientemente horrível para merecer a sua visita, nem requer um apelo à restrição da venda e posse da arma usada, veículos motorizados. No entanto, se um massacre, do qual resultaram 10 mortos e 3 feridos em Buffalo, NY, for praticado por um suspeito com motivos aparentemente racistas e realizado com uma espingarda, então old Joe já tem tempo & recursos para visitar o cena do crime e motivação suficiente para apelar à limitação da venda e posse do instrumento empregue, armas de fogo. Também o sr. arcebispo Michael Jackels, um dos exemplos mais contundentes da disneyficação11 em curso na Igreja Católica, está sempre pronto a apelar contra gun ownership de cada vez que ocorre um episódio de gun violence. No entanto, não se lhe conhece qualquer oposição à posse de facas, carros (o horroroso car ownership) ou sal, nem sequer que tenha lavrado qualquer protesto aquando de um dos muitos massacres em que estes instrumentos letais foram usados para causar grande mortandade. Será a knife violence menos má, menos frequente, menos dolorosa ou menos letal que outras formas de violence que causam a morte? Então o que é lamentável? Será a morte violenta de seres humanos, ou outra coisa?

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De modo semelhante, que pensar da recente construção em Moscovo de um monumento a honrar as bombas nucleares suviéticas? Quem são os heróis12 do socialismo? Os instrumentos, ou quem os utiliza? A foice, martelo e armas nucleares, ou os soldados e os proletários e camponeses? E que bons usos podem ser dados a bombas nucleares de modo a que possam ser consideradas, já não merecedoras de honras, mas simplesmente como instrumentos eticamente neutros, passiveis de serem usados quer para o bem, quer para o mal, tal como facas, automóveis, sal ou espingardas? Será que Putin já está tão woke como Biden & Jackels?

U avtor não segve a graphya du nouo AcoRdo Ørtvgráphyco. Nein a do antygo. Escreue coumu qver & lhe apetece. #EncuantoNusDeixam

  1. Instrumento: Implemento usado para levar a cabo um ato de opressão, como a foice, o martelo ou ainda os impostos que, segundo uma reputada economista “substituíram os lucros como instrumento mais poderoso no esbulho dos frutos do trabalho e na opressão dos trabalhadores” (Carlota Warx, Die Steuern, p. 879).
  2. Punição: celebração feita em comemoração de certos tipos de atos; distinção especial conferida a quem cumpre o seu dever social de desobedecer a lei ou regulamento injusto ou desproporcional; o processo de punição padece no nosso país de arbitrariedade, lentidão, também ela arbitrária, e favoritismo clientelar como já foi denunciado repetidamente, e muito bem, pelo sr. dr. Sócrates; enquanto no socialismo a confissão e arrependimento posterior não diminuem a punição, antes aceleram a execução, no Cristianismo basta a contrição perfeita para a remição total da pena, não só nesta vida mas também na outra.
  3. Nacionalização: roubo institucional; um dos tipos de ladroeira praticada pelo estado, especialmente durante períodos de febre revolucionária; um dos instrumentos usados na prossecução do empobrecimento dos cidadãos e da falência do estado; serrote usado numa amputação feita em violação do Direito Humano n.º 17.
  4. Saneamento: termo usado no despedimento sem justa causa quando praticado por um patrão socialista.
  5. Salário de miséria: salário praticado numa sociedade a caminho do socialismo e que irá sendo gradualmente diminuído, tal como o lucro e as rendas, até à nossa chegada à estação de destino, onde será final e totalmente abolido.
  6. Tributação: uma das 25 atividades clássicas usadas na redistribuição13; roubo; bisturi usado na ablação do rendimento pessoal, uma violação encapotada dos Direitos Humanos n.ºs 4, 5 e 17.
  7. Homem: uma das duas configurações com que que os Homens vêm a este mundo, nus para evitar confusão na classificação, verificável nos órgãos reprodutores e determinada pelo DNA; uma teoria filosófica sebosa e cerebrosa recente nega que esta divisão se fundamente corporeamente no baixo abdómen mas que se encontra realmente no córtex pré-frontal em dois neurónios de tipo x e y que determinam o sexo; pessoa com características estruturais, funcionais e comportamentais inferiores à média; no hétero-patriarcado branco, aquele que serve de sustentador e provedor, sendo classificado como ‘bom’ ou ‘mau’ com base na capacidade da mulher vestir Chanel ou outro trapo de marca; membro da espécie animal Homo Sapiens, espécie que, nos intervalos em que trabalha pela extinção dos seus semelhantes, se ocupa da preservação das outras, como sapos, cobras e lagartos; apesar de todos os esforços para se autoextinguir, a espécie prospera com tanto vigor que já infeta toda a terra habitável e a Espanha, pondo em causa a sustentabilidade ecológica da mãe terra; membro daquela espécie animal que, ao contrário de todas as outras, incluindo felinos e canídeos, se preocupa mais com aquilo que quer ter ou quer parecer do que com aquilo que deve ser; elemento da única espécie conhecida que é geradora do artificial, da artificialidade, do que não é natural e do que é antinatural, de onde se destaca o ekologismo, o warxismo e o wokismo; Humanidade, isto é, homens e mulheres, se bem que algumas escolas de pensamento, como o Budismo, considerem que só homens podem ser homens e que só eles têm acesso ao Jōdo 浄土, o Paraíso da Terra Pura, sendo que as mulheres têm que reencarnar antes como homens neste mundo para depois lá poderem serem admitidos. Como será operada a reencarnação da última mulher como homem, para poder ter acesso ao paraíso de Amida, é uma questão que ultrapassa a competência e não cabe no estreito vaso do engenho deste lexicografo.
  8. Hospital: instituição onde as pessoas são tratadas humanamente na enfermaria depois de passarem pelas sevícias dos serviços de atendimento e os horrores das salas de espera; estabelecimento onde se trata da saúde às pessoas (este lexicógrafo desconhece o nome dado às instituições onde se trata da doença das pessoas, se é que existem); serve, cada vez mais, de antecâmera ao cemitério; cancro orçamental; causa recorrente de febre noticiosa, cegueira ideológica, surdez institucional, diarreia regulamentar & legislativa, fracturação política e enjoo púbico; não confundir com hospitalidade.
  9. A narrativa pode ter sido adaptada, de acordo com princípios deontológicos geralmente aceites & praticados na imprensa internacional, para evitar possível desconforto a alguns dos srs. leitores e assim combater as fake news14.
  10. Sal: discípulo de Cristo (Mt 5, 13), de onde se pode deduzir que a tributação adicional proposta para o sal mais não seja que uma medida jacobina de perseguição à Igreja, e se poderá argumentar que é inconstitucional (cf. CRP, art.º 13º, n. 2 e art.º 41º); elemento tão essencial à vida biológica como a água; elemento tão essencial à vida social como a paz15 (cf. Mc 9, 50); aquilo que falta ao sr. eng. Costa; o poder purificador e revigorante do sal era reconhecido pelos antigos que, depois de cortarem o cordão umbilical ao recém nascido, o lavavam em água e esfregavam com sal, como testemunha Ezequiel 16,4; produto usado por vários povos antigos, incluindo os romanos, para pagar o trabalho, de onde se pode inferir que a proposta de tributação especial para o sal cai no vício da dupla tributação e se deve assumir que o Estado está a ingerir sal a mais. Ou não será a tentativa de impor a sua moral diatética aos portugueses um sinal de hipertensão estatal?
  11. Disneyficação: infantilização; nalguns casos, segunda infância, estádio transitório antes da passagem para um mundo melhor (mais infernal para os que gostam de coisas infernais, mais beatífico para os beatos); mickyzação; patetização; wokização. Capacidade de auferir isenções tributárias e receber dinheiros públicos, provindos de impostos, coletas e doações, para a prossecução de interesses pessoais e corporativos que vão contra o interesse público, tal como em “o novo Orçamento de Estado aprofunda a disneyficação da economia & sociedade portuguesa”.
  12. Heroi: o vilão na narrativa do inimigo; animal raro na cultura repressiva do hétero-patriarcado europeu, mas planta comum (do tipo urtica dioida) extensivamente cultivada no igualitarismo socialista, na União Suviética e na Cureia do Norte.
  13. Redistribuição: segundo Sofocleto Lactantius (fl. séc. 3 a.C.) são atividades redistributivas as seguintes: assalto, arrombamento, burla, confisco, concessão danosa de crédito, depredação, desfalque, desvio, esbulho, expropriação, extorsão & fiscalidade, fraude, furto & impostos, latrocínio & nacionalização, peculato, pilhagem, rapina, roubo, taxas municipais & audiovisuais, tarifas i tributação. Que esta última pertence legitimamente à categoria é-nos assegurado por François-Marie Arouet (1694—1778), um dos filósofos patronos do Warxismo, venerado sob o nome de Voltaire. Relata-se que 1 dia, viajando com 1 grupo de amigos por uma floresta especialmente densa e tenebrosa, entraram n1a estalagem à beira do caminho. Para dissipar medos, à ceia combinaram contarem, 1 de cada vez, 1a história de salteadores. Quando chegou à sua vez Arouet começou: “Era uma vez um Diretor Geral das Contribuições e Impostos.” Tendo parado aqui os amigos instaram-no a prosseguir, ao que ele respondeu: “Esta é a história de salteadores que vos tinha para contar.” O Pe. Mário Centavo, no vol. 49 da sua Opera Omnia, distingue com a sua conhecida casuística, entre redistribuição voluntária, onde inclui o comércio, o mecenato e, imagine-se!, a esmola, e a redistribuição involuntária, ou imposta, em que nos remete para Sofocleto.
  14. Fake news: notícias em que podemos confiar.
  15. Paz: período de equívocos e enganos entre dois de pancada; um dos sete horrores sociais segundo warxismo dialético, sendo os outros a prosperidade, o matrimónio, os bebés, a felicidade, a harmonia e a alegria.