“É a falar que a gente se entende.” Este nosso ditado, como tantos outros, consegue dizer tanto com tão pouco. Para além de servir de balde de gelo quando as emoções quentes estão à flor da pele, ele consegue reunir a essência da liberdade de expressão: só através do diálogo, do debate aberto e da troca de ideias é que podemos construir uma sociedade melhor.
Quando não conseguimos falar, quando esta liberdade é atacada, não nos conseguimos entender. E quando não nos conseguimos entender, o pior de nós vem ao de cima. Não tenho em mim estudos nem dados na ponta da língua para suportar isto que vou dizer, baseio-me apenas na minha humilde intuição (e na minha liberdade de expressão), mas sinto que muita da crescente violência que vemos entre nós é consequência dos diálogos suprimidos em várias vertentes do debate social e político. De uma forma geral, nos últimos anos, várias narrativas foram tidas como supra-sumo por si só e, por consequência, protegidas de qualquer discussão e escrutínio sério.
A liberdade de expressão é um direito fundamental que separa as democracias dos regimes totalitários. A censura, seja ela imposta por governos ou empresas privadas, é um veneno que corroí o que de melhor há no Ocidente. Quando olhamos para o passado, vemos os paralelismos com regimes autoritários que usaram a censura e o controlo da informação como meios de consolidar o poder e eliminar a dissidência. Hoje, nos países que se orgulham de ser defensores das liberdades e direitos fundamentais, essas tácticas ecoam de forma alarmante. A linha que separa a liberdade de expressão da censura está a tornar-se cada vez mais ténue, e a desculpa de combater a desinformação é frequentemente usada para justificar medidas que, na realidade, limitam o debate e suprimem vozes dissidentes.
Nos últimos dias, a notícia de que Mark Zuckerberg, CEO da Meta, cedeu a pressões governamentais para censurar conteúdos relacionados com a COVID-19 nas suas plataformas veio confirmar medos passados de várias vozes que foram caladas violentamente e apelidadas de negacionistas e “malta das teorias da conspiração”. Esta revelação expõe uma realidade que muitos já temiam: a influência dos governos na moderação do discurso público através do controlo da informação. Quando o governo dita o que pode ou não ser dito, estamos perigosamente perto de uma realidade distópica, onde a verdade é fabricada e o pensamento crítico é suprimido. Durante a pandemia, dois mais dois sempre foi cinco.
No Brasil, o juiz Alexandre de Moraes proibiu recentemente a rede social X (antigo Twitter), alegando que a plataforma não estava a cumprir ordens judiciais para remover conteúdos que considerava ilegais. Esta intervenção directa é uma reminiscência das práticas de censura nos regimes totalitários, onde a informação era rigidamente controlada para manter a ordem e o bem-estar social (traduzido para “totalitário” lê-se sede de poder). Assim como na União Soviética, na Alemanha Nazi ou em outros exemplos onde a liberdade de expressão foi sacrificada em nome da ideologia do Estado, o Brasil está a traçar um caminho perigoso ao silenciar plataformas que permitem a livre circulação de ideias. Imaginem que isto acontecia no tempo do Bolsonaro? Qual seria a reacção geral? Não é assustadora a resposta?
A lei francesa contra as “fake news” durante campanhas eleitorais, aprovada em 2018, é outro exemplo de como o controlo da informação pode ser disfarçado de protecção do público. O governo francês, ao decidir o que é verdade ou mentira, coloca-se na perigosa posição de árbitro da verdade, uma posição que nenhuma instituição democrática pode ocupar. A recente prisão de Pavel Durov, criador do Telegram, em Paris, e a pressão sobre Elon Musk antes da sua entrevista com Donald Trump são outros sinais claros de que da fragilidade da liberdade de expressão.
Sob pena de grandes retrocessos civilizacionais, a liberdade de expressão tem de ser tida como sagrada e inegociável. Qualquer ataque a este direito é um ataque à própria essência da democracia. A meu ver, os paralelismos com regimes autoritários do passado são inegáveis, e é nosso dever, como cidadãos, resistir a qualquer tentativa de censura, de controlo da informação, e de supressão do debate. A censura vem sempre de manso, como um lobo na pele de cordeiro.
A história ensinou-nos que a liberdade de expressão é a primeira a ser sacrificada quando o autoritarismo se instala. Não podemos, sob nenhuma circunstância, permitir que isso aconteça novamente. Nem vale a pena brincar ou arriscar.
Não é só a liberdade de falar, é o dever de ouvir!
Não é só a liberdade de expressão, é o sagrado da discussão!
A liberdade nunca será só. A liberdade é tudo!
É a falar que a gente se entende!
É no diálogo que a paz se estende!