Especialmente em Portugal, onde o modelo multipartidário reflete uma vasta gama de opiniões e políticas, é essencial abandonar uma visão redutora e ultrapassada que se limita a enquadrar a política em dois polos opostos: esquerda e direita.

Origem dos Conceitos de Esquerda e Direita

Os termos “esquerda” e “direita” têm as suas origens na Revolução Francesa de 1789. Na Assembleia Nacional, os deputados que apoiavam a revolução e as mudanças radicais sentavam-se à esquerda do presidente da assembleia, enquanto os defensores da monarquia e da ordem estabelecida se sentavam à direita. Desde então, estas designações têm sido usadas para distinguir diferentes posições políticas.

A Complexidade dos Partidos Políticos

A realidade é que os partidos não podem ser facilmente classificados apenas como “esquerda” ou “direita”. Tomemos como exemplo a posição sobre os direitos LGBTQIA+ ou à morte assistida. Em Portugal, encontramos partidos de direita que são firmes defensores dos direitos LGBTQIA+, como a Iniciativa Liberal, como partidos de esquerda que são mais conservadores em relação a outros direitos individuais como a eutanásia.

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Como podem ter lido no meu ultimo artigo sobre transparência politica, gosto de propor desafios aos leitores. O desafio para este é o seguinte:
Vou deixar 4 excertos de programas políticos ou posições de diferentes partidos sobre questões sociais e gostaria que tentassem identificar os partidos e se acham que são de “esquerda” ou “direita”.

[A] defende uma sociedade onde cada um seja livre e responsável de viver a sua vida como quiser, com quem quiser, (…) [fonte]
Família natural. [B] respeita outros modelos diferentes de partilha de vida comum, porém considera a família natural, baseada na relação íntima entre uma mulher e um homem. [fonte]
[C] – Falamos de liberdade, é claro, quando falamos de proteção e garantia de direitos cívico-políticos, como os direitos à liberdade de expressão (…), como de direitos sociais (…), como o direito ao reconhecimento de identidades de género alternativas, (…) [fonte]
O [D] afirma a sua oposição a legislação que institucionalize a provocação da morte antecipada seja qual a forma que assuma – a pedido sob a forma de suicídio assistido ou de eutanásia –, bem como a eventuais propostas de referendo sobre a matéria. [fonte]
As repostas encontram-se na conclusão deste artigo.

Os Quatro Quadrantes Políticos

Para compreender melhor a política moderna, é útil recorrer ao modelo dos quatro quadrantes, que distingue as posições políticas em dois eixos: o eixo económico (esquerda-direita) e o eixo social (liberal-conservador). Esta abordagem oferece uma visão mais detalhada das diversas combinações de ideologias que podem existir:

Esquerda-Liberal: Defende políticas económicas progressistas e promove liberdades sociais. Exemplo: Livre.
Esquerda-Conservadora: Defende políticas económicas progressistas, mas mantém uma abordagem conservadora em questões sociais.
Direita-Liberal: Defende políticas económicas de mercado livre e promove liberdades sociais. Exemplo: Iniciativa Liberal.
Direita-Conservadora: Defende políticas económicas conservadoras e mantém uma abordagem conservadora em questões sociais. Exemplo: Chega.

Esquerda e Direita: Foco na Política Económica

A tradicional classificação de esquerda e direita é mais apropriada para descrever as posições económicas dos partidos. A esquerda tende a favorecer uma maior intervenção do Estado na economia, promovendo a redistribuição de riqueza e programas sociais. Basicamente, um Estado mais protecionista/paternal assume que é mais eficaz na gestão dos recursos económicos dos cidadãos, acreditando que pode garantir melhor o bem-estar da população melhor que ela própria.

A direita, por outro lado, geralmente defende a liberdade de mercado, a privatização e a redução do papel do Estado na economia. Esta visão de mercado parte de um princípio de confiança e responsabilização dos indivíduos, dando as ferramentas necessárias e acreditando que as pessoas são capazes de gerir os seus próprios recursos e tomar decisões que melhor atendam às suas necessidades e interesses.

Conclusão

Em primeiro lugar, vamos às respostas ao desafio.

[A] – Iniciativa Liberal – Direita

[B] – Chega – Direita

[C] – Livre – Esquerda

[D] – PCP – Esquerda

Como podemos ver, temos dois partidos de “esquerda”, um com ideias mais conservadoras (PCP) sobre a eutanásia, e o Livre com políticas mais liberais no que diz respeito à ideologia de género. O mesmo acontece nos partidos à “direita”, onde por um lado temos o Chega com ideologias mais conservadores sobre o conceito de família, e no espectro oposto temos a Iniciativa Liberal que defende abertamente o conceito de liberdade individual.

O espectro político português não pode ser adequadamente compreendido através de uma visão redutora que apenas considere “esquerda” e “direita”.

Como vimos acima, só porque ambos partidos são de “direita” não podemos assumir que ambos têm visões sociais remotamente semelhantes, o mesmo podemos aos partidos de “esquerda”.

A política, afinal, é muito mais do que uma simples dicotomia; é um campo vibrante e complexo que reflete a diversidade de pensamento e valores da sociedade.

A meu ver, temos a sorte de viver num país que conta com um sistema multipartidário; temos de o saber aproveitar.