Tenho lido na imprensa inúmeros apelos organizados ao voto na geringonça. É uma das novidades interessantes desta campanha eleitoral: sem atacar a individualidade de cada partido, assumindo diferenças estruturais e até tecendo críticas às opções do PS no governo, o eleitorado de PS, BE e PCP passou a olhar para estes partidos como aliados num projecto político à esquerda – e, portanto, votando num ou noutro desses partidos consoante o que sentir relevante para dar força a esse projecto. Por contraste, isso não sucede à direita. Eis um dos maiores erros dos partidos à direita: não promover um entendimento semelhante do actual confronto e deixar cair em esquecimento que, apesar das diferenças entre os partidos, também há um projecto político que une todos à direita. Que projecto é esse? Travar a marcha do socialismo, a sua apropriação da sociedade portuguesa e a sua tomada do aparelho de Estado.

O último nome desse projecto político foi “Portugal à Frente” (PAF). Foi essa a identidade da coligação PSD-CDS que foi a votos em 2015 e que, mais do que isso, representou um governo que quis romper com a estatização na sociedade portuguesa – uma ruptura tão ameaçadora para a captura do poder da esquerda que justificou a sua inédita parceria. Muito antes e com outros protagonistas, mas também num momento decisivo da nossa vida colectiva, esse projecto chamou-se “Aliança Democrática” (AD). Dois momentos da nossa democracia em que a direita foi mobilizadora e forte porque enterrou as suas diferenças para celebrar as suas semelhanças: a ambição de libertar Portugal das amarras estatizantes do socialismo. Hoje, mesmo sem coligação eleitoral ou uma sigla para a nomear, essa ambição prevalece no coração político da direita portuguesa.

É, portanto, o palpitar desse coração que está no centro da mobilização do eleitorado da direita – que passou meses desmobilizado e a perguntar-se como votar no espírito da PAF ou da AD em 2019. Ora, a resposta é mais simples do que possa parecer. É votar PSD, apesar de Rui Rio, porque o motor político da direita está no PSD e só os sociais-democratas podem travar a ascensão dos socialistas – sobretudo nos distritos que bipolarizam as escolhas entre PS e PSD. É votar CDS nos círculos eleitorais onde este historicamente elege – porque o manifesto eleitoral dos centristas é o melhor guião para os próximos anos à direita e porque foi Assunção Cristas quem liderou solitariamente a oposição ao governo durante os últimos 18 meses. E é votar Iniciativa Liberal (IL), sobretudo no Porto (para eleger Carlos Guimarães Pinto), porque nesse partido está o rosto renovado da rejeição dos alicerces do socialismo – não poderá existir uma nova PAF ou AD que não o inclua.

Sim, os últimos anos têm sido particularmente ingratos para os eleitores que, à direita, buscaram na Assembleia da República a sua representação parlamentar e só encontraram vazio e abandono. Sim, houve desorientação política e, nos momentos críticos (como no dossier da “carreira dos professores”), houve até uma traição aos valores que estão no código genético de PSD e CDS. Sim, o líder do PSD rejeitou sistematicamente um posicionamento político à direita ou minimamente agregador, não lhe sendo conhecido sequer um elogio ao governo de Passos Coelho. Sim, em tempos, a líder do CDS converteu o PSD num adversário, estabelecendo como meta a sua ultrapassagem eleitoral. Sim, até a IL afixou cartazes contra o PSD, associando os sociais-democratas ao socialismo.

Sim, os erros foram muitos. Mas onde os partidos da direita falharam e não souberam construir pontes, saibam os seus eleitores mostrar-se à altura: mobilizando-se e votando PSD, CDS ou Iniciativa Liberal. Porque são esses partidos que representam (melhor ou pior) uma visão de liberdade, em confronto com a hegemonia socialista. Porque somente um projecto comum destes partidos devolverá as maiorias parlamentares à direita. E porque, com maior ou menor convicção, a mobilização eleitoral à volta destes partidos fará toda a diferença. No imediato, limitando as condições de acesso da esquerda ao poder. E, num futuro próximo, definindo a força política da direita no período-chave da sua refundação. No domingo, haverá muito mais em jogo do que a mera composição do próximo governo.

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