Portugal discute novamente a eutanásia. Torna-se, por isso, importante objetivar esta problemática, uma vez que o debate prós e contras tem sido apaixonado e pouco (ou nada) esclarecedor. Os argumentos de ambas partes sucedem-se e os portugueses perguntam quem tem razão. Então é necessário ir aos números, uma vez que números não mentem. E quem não olha aos números, não olha ao sofrimento.

Desde a legalização da eutanásia na Holanda, em 2002, a Regional Euthanasia Review Committees (RTE) informa que o número de mortes por eutanásia neste país aumentou 225% em 2018 comparativamente a 2002 (6126 versus 1882 mortes). Isto não se deve apenas ao aumento do número de casos reportados, mas também é secundário ao aumento do número de pedidos de eutanásia e ao aumento de pedidos aceites. (Referência 1)

Comparativamente a 2013, regista-se em 2018 um aumento do número de casos de eutanásia por cancro de 10.6% (4013 casos). Em relação às doenças não oncológicas, em igual período de tempo verificou-se também um aumento do número de casos de eutanásia por demência em 33.6% (146 casos), de 37.3% na doença psiquiátrica (67 casos), de 7.9% nas doenças pulmonares (189 casos) e de 3.5% nas doenças cardiovasculares (231 casos). (Referência 1)

Estima-se que morram de eutanásia cerca de 1000 cidadãos holandeses por ano sem terem assinado previamente consentimento explícito para a eutanásia (Referência 2). Em virtude deste abuso subjacente à lei da eutanásia, a United Nations Human Rights Committee já criticou internacionalmente por duas vezes o governo holandês (Referência 3 e Referência 4), no entanto não foram efetuadas alterações à prática da eutanásia neste país. Um outro aspeto preocupante da prática da eutanásia na Holanda é a utilização da sedação terminal contínua, com intensão de abreviar a vida de doentes. Esta prática é utilizada sem consentimento explícito e explica o aumento do número de mortes por sedação observado neste país (de 18.8% de mortes em 1990, para 36.4% de mortes em 2010) (Referência 5).

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A eutanásia sem consentimento explícito é também prática corrente na Bélgica, bem como a sedação terminal com intenção de abreviar a vida (Referência 6 e Referência 7). Estudos recentes mostram que, na Bélgica, não há redução do número de casos de eutanásia sem consentimento explícito (Referência 8).

O suicídio assistido na Suíça é praticado desde 1982 pelas organizações EXIT e Dignitas. Neste país, em 2018 houve 248 mortes (7.8%) por suicídio assistido sem causa médica aparente (Referência 9). Um estudo recente mostrou que a taxa de suicídio assistido por doenças não fatais aumentou de 22% para 34%, de 1990 a 2004. Por outro lado, o “cansaço de viver” ou o medo de perder o controlo são suficientes para que o pedido de suicídio assistido seja validado e executado pela EXIT (Referência 10).

Neste país as razões subjacentes aos pedidos de suicídio assistido nem sempre se associam a sintomas físicos. Conceções distorcidas sobre os cuidados paliativos também estão na origem de pedidos de suicídio assistido (Referência 11). Em 2018 a EXIT reportou 1200 mortes por suicídio assistido, mais 617 comparativamente a 2014 (583 mortes).

Estes números obrigam o legislador português a pensar. Cautela e prudência com esta novidade legislativa…

5 de Fevereiro de 2020