Deparo numa rede social com um vídeo assustador de uma igreja em chamas em França. A Igreja da Imaculada Conceição de Saint-Omer, um templo inaugurado em meados do século XIX no nordeste da França, foi consumida por um incêndio na noite de domingo dia 2 de Setembro. Ao que parece uma tragédia que se vem repetindo naquele país, um fenómeno que mereceria um trabalho jornalístico sério, tanto mais que os comentários ao referido post são bastante alarmistas, com acusações aos imigrantes e a conspirações muçulmanas. Não parece ter sido esse o caso. Incêndios em Igrejas acontecem, sempre aconteceram, mas este caso foi de fogo posto, o incendiário chama-se Joël Vigoureux, é francês, e, confrontado pelas autoridades, afirmou: “Je n’ai pas de problème avec les églises”. O teor da frase parece mais vinda de um louco demasiado afectado pelos profetas laicistas da Revolução Francesa, cuja ideologia nos nossos dias refinada, tem demasiada influência no discurso e legislação daquele país.
Constato por aí que há muitos cristãos que se satisfazem com a tese de vitimização, duma suposta perseguição e silenciamento da Igreja, que perde a voz por culpa da imigração e do desleixo das autoridades na protecção dos seus interesses e património, por contraste ao tratamento tolerante dado às outras culturas e religiões que se vão afirmando por essa Europa fora. A minha questão é: estamos dispostos a acreditar que vamos preservar a cultura cristã e os nossos templos através do favorecimento de leis e da vigilância do Estado aos vândalos invasores? De que servirá reclamar o bom tratamento aos católicos, certamente merecido, se as igrejas por essa Europa afora vão sendo encerradas e votadas ao abandono pela ausência de novas gerações de crentes? Há quanto tempo deixámos de levar os nossos filhos à igreja?
Percebe-se bem o cuidado de Roma de progressivamente privilegiar a atenção às igrejas em África e na Ásia onde crescem as comunidades católicas fecundas, mesmo em ambientes sociopolíticos adversos, e desse modo carecem desse olhar, desse conforto. É disso sinal a visita do Papa Francisco à Indonésia, Papua-Nova Guiné, Timor-Leste e Singapura naquela que será a mais longa visita pastoral de sempre, em distâncias e tempo, de um Sumo Pontífice.
Como cristão e português, entristece-me muito a decadência da nossa cultura, a crescente perda de peso dos católicos na vida das nossas cidades. Não falta muito que por cá também comecem a arder igrejas por mero abandono ou vandalismo. Uma coisa convida a outra. Não falta muito para as nossas igrejas abandonadas se tornarem lugares de diversão nocturna, como já acontece em muitos lugares por essa Europa do Norte. Não é preciso fazer muitas contas ou desenvolver complexas teorias para constatar o crescente número de igrejas fechadas por falta de fiéis e sacerdotes em Portugal, não obstante as honrosas exceções das inúmeras paróquias dinâmicas, de clérigos carismáticos e leigos dedicados a remar contracorrente. Mas definhamos. O excesso de conforto, uma vida entretida e fútil não desafia a dúvida existencial. Adicionando a crise de natalidade, criámos o ambiente perfeito para a decadência da nossa cultura, desvanecimento da nossa identidade.
Por tudo isto não me venham com teorias da conspiração e bodes expiatórios. As pessoas deixaram de frequentar as igrejas e a “culpa” não é dos estrangeiros, é nossa. Sem que tenhamos a coragem de nos olharmos com atenção ao espelho nunca enfrentaremos os verdadeiros desafios. Como refere o maior dos Mestres, “Porque reparas tu o cisco no olho de teu irmão, mas não percebes a viga que está no teu próprio olho?” (Mateus 7:3-5).
Entretanto, que sirva de consolo o crescente desejo de Salvação das fecundas comunidades cristãs nas novas centralidades do Mundo Cristão. Nós por cá, burgueses e anafados, definhamos… de dedo em riste.