O arrendamento de espaços para eventos ou festas particulares não parece estar nas regras gerais ou sujeito a legislação, excetuando questões de ruído. Os pavilhões e salas têm cobertura, o seu telhado, em fibrocimento ou simplesmente têm uma zona exterior com um telheiro também de fibrocimento com amianto. Estes são apenas alguns daqueles onde facilmente se conclui a presença de amianto havendo tantos outros materiais mais dissimulados e tão ou mais perigosos. Ninguém parece dar por estes nem pelos outros e, rodeados por todos, os pais conversam e as crianças brincam, desconhecendo que respiram fibras de amianto que podem alojar-se nos seus pulmões provocando danos irreversíveis e até fatais.

Se calhar nas conversas dos pais está um discurso sobre a vantagem de se ter tirado o amianto das escolas e de isso ter sido tão positivo para a vida de todos, afinal, nas escolas estão os nossos filhos, o futuro do país e do mundo, e as coisas mais preciosas das nossas vidas. Toda a comunidade escolar também é gente e, já agora, que se protejam os professores e auxiliares que, no exercício da sua profissão, ficam condenados a esta exposição a sua vida toda.

Fossem só as escolas que continham materiais com amianto e o caminho para nos vermos livres deste material estaria perto do fim. Infelizmente, como tem sido tantas vezes dito e repetido, está em todo o lado. Pode estar nas escolas, nos hospitais e centros de saúde, nos edifícios públicos, nas oficinas mecânicas, nos pavilhões de armazenamento e logística, no teatro, nas nossas casas, pasme-se, sim, nas nossas casas, e potencialmente e m todos os edifícios, equipamentos e instalações anteriores (e por vezes posteriores) a 2005 (data da proibição do amianto em Portugal).

O problema, no entanto, é ainda mais grave. Nas escolas onde já se iniciou este trabalho de descontaminação, não foi o amianto que se retirou. Apenas se retirou o fibrocimento (um dos materiais que contém amianto) das escolas públicas entre o Jardim de Infância e o Ensino Secundário, deixando de fora outras tipologias de escolas, e talvez mais importante, outros tipos de materiais.

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Olhar para a questão do amianto como sendo um problema apenas associado ao fibrocimento, é não (querer) perceber a dimensão deste problema. O amianto foi inserido em mais de 3000 produtos e em Portugal foi utilizado sobretudo desde os anos 60 até ao ano de 2005. Pode existir em materiais fora deste período quer antes, quer um pouco depois. Não podemos deduzir que o fibrocimento, por ter sido o produto com amianto mais fabricado em Portugal, ou um dos mais fabricados, seja o único que inclui amianto na sua composição. Talvez até em algumas escolas o fibrocimento seja o único material contendo amianto, no entanto, só poderemos afirmá-lo após análises concretas a todos os materiais passíveis de ter este elemento tóxico na sua constituição.

E aqui reside o problema. Qualquer exercício de identificação de materiais contendo amianto deve necessariamente começar com uma análise exaustiva aos materiais que apresentam esse risco. Estes materiais não podem ser selecionados pelo dono de obra, nem pelo empreiteiro, nem pelo governo como sendo os mais perigosos, ou até os mais numerosos, mas sim por empresas especializadas e acreditadas para o efeito, que identificam os materiais e procedem à sua análise, cumprindo a legislação. Sem este procedimento prévio nada do que se faça nos poderá livrar do amianto.

O trabalho que a ZERO[1] e o MESA[2] fizeram e que resultou na remoção, e bem, do fibrocimento em muitas das escolas públicas, também alertou, em diversos momentos, para o facto de o levantamento deste tipo de material ter sido incompleto. Além disso, conforme explicado em cima, existem mais escolas que não foram previstas neste plano. Afirmar que não há amianto na escola, neste momento, é algo que ainda não podemos fazer.

E então continuaremos a frequentar espaços, lugares, edifícios e equipamentos que ainda têm materiais contendo amianto. Se calhar nalguns o fibrocimento é bem visível, noutros estará mais dissimulado, se calhar alguns de nós conseguirão perceber o potencial perigo de certos materiais, outros até nas atividades mais corriqueiras estarão expostos e a expor os outros a este carcinogénico.

Enquanto isso, mais festas de aniversário, de Natal, entre outras, irão acontecer, e mais pessoas estarão, naturalmente, expostas. Entre este pessoal estão as crianças que correm despreocupadas; o pessoal de limpeza e manutenção que por desconhecimento se expõe ou expõe outros; os pais que acompanham os filhos; o pessoal da animação da agência; o dono do espaço que por desconhecimento ou falta de meios continua a operá-lo sem levar a cabo uma completa remoção.

A lei deverá ser específica nesta exigência de ausência de materiais contendo amianto em todos os espaços abertos ao público, sejam de cariz público ou privado, ou para começar, talvez fosse um bom primeiro passo solicitar a apresentação de análises à qualidade do ar percebendo assim o número e o tipo de fibras que estamos sujeitos a inalar de cada vez que vamos a um evento ou uma festa. E se é para respirar amianto o melhor é mesmo não ir.

[1]    ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável
[2]   MESA – Movimento Escolas Sem Amianto