O ministro Tiago Brandão Rodrigues é um ultra da escola pública. Nas palavras do seu compagne Pedro Nuno Santos, um autêntico fanático. Ficámos esclarecidos sobre o seu radicalismo ideológico quando, em 2016, decidiu reverter acriticamente contratos de associação entre o Estado e colégios cooperativos e privados, em prejuízo de milhares de alunos. Desta vez, confrontado com o maior desafio de sempre na educação e com o seu falhanço na preparação de uma alternativa ao encerramento das escolas, voltou a vestir a camisola estatista, encheu o peito de igualdade terceiro-mundista e decretou a interrupção de toda a atividade letiva, advertindo os privados para que “não espreitem a exceção”. Por outras palavras, estão proibidos de ensinar à distância. Ordem do ministro… da Educação.

A ideia de proibir, ainda que temporariamente, o ensino é de tal forma inqualificável, que nem precisamos de sair da esfera do Partido Socialista para encontrar oposição firme. Desde logo, Marçal Grilo, ex-ministro da Educação de Guterres, referiu-se à medida como “puro disparate”; e Maria de Lurdes Rodrigues, ex-ministra de Sócrates com a mesma pasta, afirmou que “as desigualdades existem, mas não é com proibições que os problemas se resolvem”. Estas reações demonstram bem o preconceito e o sectarismo do incumbente Brandão Rodrigues, cuja visão para o ensino está mais próxima das forças políticas radicais que seguram o Governo do que a perfilhada pelos seus antecessores socialistas. Só mais um exemplo do processo de “ortodoxização” em curso no PS.

No plano constitucional, a decisão do ministro é igualmente indefensável. O artigo 43º, número 1, da Constituição da República Portuguesa garante “a liberdade de aprender e ensinar” e apenas pode ser restringido, nos termos do artigo 18º, revestindo a forma de Lei. O decreto do estado de emergência não prevê a suspensão daquele direito fundamental, pelo que o mesmo não pode ser suspenso ou limitado por decreto do Governo. É este o entendimento de vários constitucionalistas, como Paulo Rangel ou Catarina Santos Botelho, que alegam, ainda, a violação do princípio da proporcionalidade – não só a medida não tem qualquer relação com a saúde pública, como existem soluções menos gravosas, nomeadamente o recurso ao ensino à distância para todos.

Recuemos a abril de 2020. Dizia, assim, o Primeiro-Ministro António Costa: “Aconteça o que acontecer, no próximo ano letivo estará assegurada a universalidade do acesso às plataformas digitais para todos os alunos.” Passaram nove meses, uma gravidez inteira para garantir o acesso dos alunos mais carenciados aos equipamentos necessários em caso de encerramento das escolas e recurso ao ensino à distância. Até este momento, ao abrigo do programa “Escola Digital”, terão sido entregues 100 mil computadores no primeiro período letivo e estão 335 mil por entregar (a correr bem, até final de março). Mais uma longa lista de espera que o Governo tem para oferecer às famílias portuguesas.

É no seguimento deste falhanço governativo, algures entre a ausência de planeamento e a falta de compromisso, que quem manda optou por se vingar nos privados, sendo as vítimas os alunos e as famílias. A posição do ministro Tiago Brandão Rodrigues revela o pior do pensamento socialista: nivelar a sociedade por baixo. Perante a situação ímpar que o país atravessa no ensino e a manifesta incompetência do Governo em dar resposta aos desafios que esta nova realidade coloca à escola pública, a preocupação do ministro da Educação foi garantir que todos os alunos seriam simultaneamente prejudicados.

Devemos ficar preocupados. O encerramento das escolas não é para duas semanas e ninguém sabe quando será possível retomar o ensino presencial. Neste momento, não se encontram reunidas condições para que todos os alunos possam ter aulas à distância e também ninguém sabe quando será cumprida essa promessa de abril – tantas vezes proclamada, sempre adiada. Não será, portanto, abusivo assumir que, com esta interrupção letiva nos termos em que foi decretada, o ministro da Educação é o primeiro a desconfiar do plano de compensação anunciado pelo Governo. Só assim se explica o receio de que muitos alunos possam adiantar serviço no privado, enquanto se prepara a recuperação dos tempos letivos no público. Na dúvida, em nome da igualdade, ficam todos para trás.

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