Acontecimentos recentes na Ásia Central mostraram que o chamado Estado Islâmico se prepara para combater activamente numa nova região, para onde se irão mudar muitos dos terroristas dessa organização caso sejam expulsos da Síria e do Iraque.

No artigo publicado por João de Almeida Dias no Observador: “E se o Estado Islâmico estiver a desaparecer” , cita Nick Wittney, antigo diretor da Agência Europeia de Defesa e atual investigador sénior do European Council on Foreign Relations: “Aos poucos, começamos a assistir à decadência do Estado Islâmico. Mais tarde ou mais cedo, eles vão perder Raqqa às mãos de alguém. Resta apenas saber quem é esse alguém. Mas pelo que vemos hoje, dou-lhes mais dois anos na Mesopotâmia e outros cinco na Líbia. Depois disso, vai ser complicado para eles”.

Porém, esta afirmação parece ser demasiadamente optimista e não ter em conta as graves realidades que poderão ser criadas pelos terroristas na Ásia Central e noutras regiões do planeta.

No passado 5 de Junho, um grupo de homens armados atacou duas lojas de vendas de armas de fogo e um quartel militar em Aktobe, cidade do Cazaquistão situada na parte ocidental desse país e apenas a 200 km da fronteira com a Rússia. O objectivo do grupo era claramente apoderar-se de armas para alargar o raio das suas acções.

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Segundo as autoridades cazaques, os confrontos entre as forças de segurança e os atacantes provocaram a morte de 13 terroristas e de 7 civis e polícias. O ataque não foi reivindicado, mas alguns analistas russos apressaram-se a suspeitar que por detrás dos terroristas estão os Estados Unidos.

Rostislav Ischenko, analista da agência noticiosa oficiosa russa “Rossia segodnia”, escreve: “O levantamento na Síria desestabilizou todo o Médio Oriente. O levantamento na Líbia desestabilizou o Norte de África. Ambos esses levantamentos, bem como o golpe de Estado na Ucrânia, criaram sérios problemas à Rússia e à União Europeia. Tendo isso como pano de fundo, o levantamento no Cazaquistão completaria esse quadro, mergulhando no caos todo o centro da Eurásia e destruindo completamente os laços económicos e comerciais entre a Europa e a América”.

“Tendo isso como pano de fundo – conclui o analista -, os projectos americanos das zonas de comércio livre Transatlântica e Transpacífica tornar-se-iam propostas sem alternativa. Por isso, estou convencido que em Aktob aconteceu a primeira, mas não a última tentativa de desencadear uma guerra civil num país fulcral da Ásia Central”.

Porém, Nussultan Nazarbaev, Presidente do Cazaquistão considera que por detrás desse ataque estão “seguidores de correntes pseudo-religiosas radicais”, que “receberam instruções do estrangeiro”.

O Cazaquistão é um dos maiores e mais ricos países da Ásia Central. Governado há mais de 25 anos por Nazarbaev, a sua economia começou a ressentir-se com a queda do preço dos combustíveis no mercado internacional (a base das exportações cazaques), o que tem provocado a queda brusca da moeda local, o aumento rápido dos produtos alimentares e a deterioração de vida da população. O alto nível da corrupção também não contribui para a melhoria da situação económica e social.

Esses factores são utilizados por grupos radicais islâmicos para se infiltrarem nesse e noutros países da Ásia Central que outrora faziam parte da URSS e, actualmente, são vistos por Moscovo como sua zona de influência. Por isso, o Kremlin decidiu, logo após o ataque em Aktobe, reunir a Organização do Tratado de Segurança Colectiva, que junta países como a Rússia, Cazaquestão, Arménia, Quirguízia e Tadjiquistão, a fim de serem tomadas medidas para “combater o terrorismo”.

Então, Nikolai Borduja, secretário-geral dessa organização, anunciou que cerca de 10 mil homens originários dos países membros combatem na Síria ao lado das “forças extremistas”, não excluindo a possibilidade de eles regressarem às suas terras. Por forças extremistas na Síria as autoridades russas subentendem o Estado Islâmico e a Frente Al-Nusra.

Também é sabido que o Exército Islâmico tenta ganhar terreno aos talibãs no Afeganistão, país que se pode transformar numa base de apoio operacional do EI na Ásia Central. Em Abril passado, Zamir Kabulov, representante especial do Presidente Putin para o Afeganistão, assinalou que o número de terroristas do EI no Afeganistão é de cerca de 12 mil, acrescentando: “Isso impressiona-nos e deve impressionar os nossos aliados na Ásia Central, visto que a ala afegã do EI está claramente apontada para a Ásia Central”.

Nesta situação, Moscovo já prometeu fornecer novos armamentos ao Cazaquistão e apoiar o Tadjiquistão no reforço da sua fronteira com o Afeganistão.

Tendo em conta o poder de mobilidade dos grupos terroristas islâmicos, não se pode descartar a possibilidade da Ásia Central vir a ser mais um dos palcos de actuação do Estado Islâmico. Se tal vier a acontecer, é duvidoso que a Rússia consiga acudir a todos os pedidos de ajuda e espera que a China se junte a este combate, pois, como é sabido, ela tem extensas fronteiras com países da região e tem problemas com grupos islâmicos radicais no seu território.