Nem é necessário procurar nas agendas das assembleias municipais: discute-se constantemente e em todo o lado. O problema da habitação arrasta-se há décadas, interessa à República como aos municípios, presta-se a tratos de polé na retórica dos demagogos e, em parte, mantém-se porque o deixámos permanecer nas mãos erradas. A esquerda sempre criou problemas e até hoje nunca resolveu nenhum. Esta semana, o PS votou contra a Carta Municipal de Habitação, impedindo que o documento fosse aberto a consulta pública e que, assim, os cidadãos discutissem uma estratégia a 10 ou 15 anos para a habitação em Lisboa. Os pergaminhos do PS incluem uma média de 17 casas novas de habitação pública construídas por ano na última década. Incluem também uma secretária de Estado que, em Setembro de 2022, declarava na Assembleia da República que “toda a gente tem o direito a viver nas zonas mais caras de Lisboa e do país”, logo sossegando os deputados com um salto de fé no aparelho do Estado, uma vez que, na interpretação da devota à honradíssima palavra do PS, “cabe ao Estado assegurar essa possibilidade”. O chefe da seita fez dela ministra. Mas enfim, a senhora produziu aquelas declarações e não outras. E até pela promoção que mereceu, vale a pena examinar esta penosa idiotia.

Lisboa tem quase 550 mil habitantes. Com que política é que esta génia do PS imagina pôr 550 mil pessoas a viver nas três ou quatro zonas – ou bairros, ou até freguesias – mais caras de Lisboa? O problema é que a ideia exala um cheirinho a “justiça social”, o que lhe garante a aprovação acéfala da crítica. Mas o mais grave é que ela determina efectivamente a política da esquerda em matéria de habitação, tanto no governo da República como nos governos municipais.

Durante 14 anos de seguida na câmara de Lisboa, a esquerda tentou realojar a classe média – e as classes mais pobres, e todas as classes com baixos rendimentos – nas zonas mais caras da cidade. Discutiu-se habitação pública no Restelo, na Avenida dos EUA, na 5 de Outubro – uma inacreditável residência para estudantes –, na Manuel da Maia, etc. Um forrobodó indecoroso com dinheiros públicos em que a oposição, assim que abria a boca, era acusada do proverbial “fascismo” e de “não querer deixar os pobres viver ao pé dos ricos”. Não houve jeito de explicar àquelas almas que aquela política estava errada e nunca iria funcionar.

Resultado? O fracasso clamoroso das políticas de habitação. O preço por metro quadrado naquelas zonas daria para a câmara de Lisboa vender os edifícios e construir em dobro noutras zonas da cidade. Ou reabilitar, em concreto, as próprias casas municipais, onde o governo do eng. Carlos Moedas foi encontrar pessoas a morar miseravelmente. Costa, primeiro, Medina, depois, e os vereadores do radicalismo com quem eles se entenderam, não deixaram apenas um número elevadíssimo de casas desocupadas; deixaram também casas que deviam estar desocupadas e não estavam. Vivia gente em casas da Gebalis a cair por entre as tábuas, com as estruturas e os telhados transformados em bolor por acumulação de humidade verde, com as redes eléctricas descarnadas, os revestimentos reduzidos a pó, os canos de águas e de esgotos amarrados com trapos. Sim, a esquerda deixou pessoas a viver desta maneira, em tugúrios onde nunca deveria viver ninguém.

Enquanto gastaram tempo e recursos nesta política fanática, errada, e caríssima, não fizeram o que deviam fazer, que é o inverso. Em vez de tentar pôr 550 mil pessoas a viver nas zonas mais caras, as políticas públicas podem e devem esforçar-se por revalorizar os bairros mais antigos e pobres, onde vivem pessoas com menos rendimentos, e dar-lhes condições para que se aproximem dos melhores (principalmente em Lisboa, onde as vistas para o rio são comentadas e encarecidas; onde há bairros ricos com vistas magníficas, e bairros muito pobres com vistas igualmente magníficas). É o que este executivo está a fazer. Um exemplo, para que se perceba: este ano, de entre todas as freguesias, Marvila é a que vai receber o maior volume de investimento em obras; será gasto sobretudo a reabilitar as casas da Gebalis e a corrigir problemas velhos. Moedas tem com ele uma óptima responsável da Habitação, um “safe pair of hands” que não comete erros grosseiros; a vereadora Filipa Roseta sabe de urbanismo, sabe de obras, sabe de habitação, sabe explicar-se, e tem uma cabeça política.

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