Passaram-se 6 anos. Desde 2015, ano em que António Costa assumiu a liderança do seu primeiro governo, até hoje muito se tem dito e escrito sobre a capacidade de sobrevivência do atual primeiro ministro. A habilidade com que tem gerido um governo marcado por diversos mal-entendidos e a natural propensão para estabelecer pontes de entendimento permitem que António Costa se apresente hoje como candidato com efetiva possibilidade de reeleição nas legislativas.
Apesar dos muitos altos e baixos, próprios da condução de um governo em funções há mais de 6 anos, há que reconhecer que o primeiro-ministro tem conseguido distanciar-se dos temas mais sensíveis e dos colegas de governo mais polémicos. A resiliência demonstrada e a capacidade de se reinventar, são duas características de António Costa que merecem, por si só, um sublinhado. Nenhum outro primeiro-ministro conseguiu, ao fim de 6 anos de governação, reunir condições para disputar eleições com perspetivas de vitória como o atual primeiro-ministro.
A menos de duas semanas do acto eleitoral, impõe-se reavivar a memória sobre o que foram estes últimos seis anos de governo socialista. Como se iniciou, como decorreu e como chegamos até aqui.
A Administração Interna foi, provavelmente, a área da governação onde António Costa enfrentou as maiores provações. Desde logo, com o permanente desacerto de Constança Urbano de Sousa na gestão do “verão negro” de 2017 em Pedrógão, onde arderam mais de 500 mil hectares de floresta e mais de 100 pessoas perderam a vida. Substituída a ministra, seguiu-se um tempo marcado pela incapacidade de resposta e por sucessivas polémicas. Desde o inexplicável caso das golas anti-fumo, à morte do cidadão ucraniano às mãos de agentes do SEF, do realojamento dos imigrantes em Odemira, às reiteradas falhas no SIRESP, sem esquecer o fatídico acidente que vitimou um trabalhador em plena autoestrada. Um somatório de erros e de decisões infelizes que acabaram por ditar a saída, deveras tardia, de Eduardo Cabrita do governo.
A área da Defesa fica também marcada por episódios onde a falta de rigor e, nalguns casos, de transparência foram fazendo caminho. Desde o roubo de armamento em Tancos, até à ocultação de dados importantes sobre o tráfico de diamantes ao Comandante Supremo das Forças Armadas, o Ministério da Defesa foi sendo um foco permanente de instabilidade política que indiscutivelmente provocou desgaste ao Governo.
O dossier da TAP, onde o Estado injetou 3,2 mil milhões de euros, é provavelmente o tema mais polémico da legislatura e o que tem suscitado um debate público mais aceso. Pedro Nuno Santos, o ausente mais presente desta campanha, é o responsável pelo legado financeiramente mais pesado que este governo endossará ao vindouro. Numa bravata ideológica, reverteu o negócio da privatização da TAP, sobrecarregando o bolso dos contribuintes portugueses em muitos milhões de euros. Decisão que, não sendo reavaliada pelo futuro governo, colocará as contas públicas sob enorme pressão por muitos anos.
Recorde-se ainda a transferência direta de Mário Centeno do governo para o regulador, Banco de Portugal, até então tutelado pelo próprio. Acrescente-se o inexplicável afastamento de Joana Marques Vidal da Procuradoria-Geral da República e ainda o processo, nebuloso, que originou a indicação, para a Procuradoria Europeia, do candidato que havia sido classificado em segundo lugar.
A mestria com que António Costa tem gerido a permanência de ministros fragilizados no governo revela que a sua estratégia durante o período de governação passou por diminuir o foco da atenção dos portugueses sobre si próprio, redirecionando-a para estes atores de conveniência.
A aposta do Partido Socialista para as eleições é, agora, substancialmente diferente: concentrar as atenções de campanha em António Costa, desvalorizar os percalços ocorridos em seis anos de governação e eclipsar os membros do governo que os protagonizaram.
António Costa é, por isso, um candidato solitário em busca da sua reeleição.