No final de 1996, numa reunião anual da Sociedade de Neurociência, em Washington, o Dr. Peter Mangam, um psicólogo americano, apresentou as conclusões do seu estudo sobre a relação entre a perceção do tempo e a idade. Através de uma experiência prática com um grupo de voluntários de diferentes idades, onde era pedido aos participantes que estimassem mentalmente e em silêncio (utilizando a técnica de contagem 1000, 2000, 3000,…), um intervalo de tempo de 3 minutos, constatou que os jovens adultos, na casa dos 19 aos 25 anos, calculavam esse tempo, em média, em 3 minutos e 3 segundos, e as pessoas mais velhas, na casa dos 60 anos, deixavam passar 3 minutos e 40 segundos até afirmarem que tinham, de facto, passado os 3 minutos. Este estudo influenciou alguns que se lhe seguiram, que analisaram mais a fundo estes processos cerebrais e apontam indícios que a dopamina (o neurotransmissor que está envolvido em processos como controlo motor, cognição, compensação, prazer e humor) tem um papel importante no nosso “relógio cerebral”: adicionando dopamina, o relógio fica mais rápido, retirando-a fica mais lento. Ao que parece, na sociedade contemporânea, viciada precisamente em dopamina e no imediato, o tempo para além de ser subjetivo é, aparentemente, modificável.

Conscientemente (ou não), somos movidos a recompensas instantâneas por um lado, e, por outro, pretendemos tudo, ou quase tudo, para ontem. Se o email demora a abrir o anexo, ficamos impacientes. O botão de fecho de portas do elevador é premido várias vezes, na expectativa que a porta feche mais depressa se nele carregarmos quatro ou cinco vezes. Se uma dada inovação nos faz “ganhar” tempo, logo encontramos maneira de o “tornar mais produtivo”, descobrindo novas tarefas para desenvolver entretanto. Um exemplo clássico desta apropriação do tempo que temos vindo a realizar é a galinha e os seus ovos. Não nos limitamos a alimentar a galinha e a esperar que esta nos dê os ovos no seu tempo; ao invés, agimos sobre o crescimento da galinha, intensificando o mesmo com uma combinação de dieta e hormonas, para que esta “produza” mais cedo.

As empresas são parte central desta tendência. A permanente evolução e profissionalização, a busca pela otimização têm sido uma constante ao longo do século XX. Radica nos anos 70 a visão de que o negócio da empresa é o negócio, popularizada no célebre artigo de Milton Friedman, economista e pensador, vencedor do Prêmio Nobel de Ciências Económicas em 1976, “The Social Responsibility of Business is to Increase its Profits”, publicado na The New York Times Magazine. Neste artigo seminal, que marcou gerações de gestores a nível global, postulava Friedman que a responsabilidade das empresas é apenas a de usar os seus recursos de forma a aumentar os lucros, dentro da legalidade e das regras do jogo. Friedman argumentava que os gestores tinham um dever fiduciário para com os acionistas e a maximização do bem-estar destes devia ser a sua única preocupação. Atado por este dever fiduciário, o foco do gestor centra-se, muito naturalmente, no curto prazo. Procura-se a entrega do máximo valor possível, de forma imediata. No fundo, que a galinha cresça rapidamente e dê ovos o quanto antes.

A noção de sustentabilidade, que nunca é demais repetida, ou seja, o “desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades, garantindo o equilíbrio entre o crescimento económico, o cuidado com o ambiente e o bem-estar social”, visa uma equidade intergeracional. A maioria das pessoas deseja viver pelo menos tão bem quanto os seus pais e anseia que os seus filhos tenham oportunidades semelhantes. Esta ideia pode ser aplicada às empresas, com ligeiras modificações: a maioria dos gestores desejará que os seus negócios sejam pelo menos tão rentáveis quanto eram no passado e, idealmente, que a rentabilidade cresça no futuro. Uma empresa sustentável será então uma empresa com “a capacidade em responder às necessidades de curto prazo sem comprometer a sua capacidade (ou de outros) de prover as necessidades futuras”. O tempo é, portanto, central para a noção de sustentabilidade. Negócios sustentáveis são aqueles que gerem os inevitáveis trade-offs intemporais na tomada de decisões estratégicas, de forma a que o curto e o longo prazo sejam considerados.

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Contrariando a orientação passada para o curto prazo, tem-se afirmado um novo paradigma que reconhece a complexidade dos sistemas e os desequilíbrios que podem comprometer a sua sustentabilidade. Este paradigma desafia os tomadores de decisão não apenas a gerir os recursos num determinado momento, mas também a gerir os recursos ao longo do tempo. Incorporar o tempo é reconhecer que o futuro nem sempre é previsível e controlável, mas que a incerteza é aceitável quando o caminho é o correto. O impacto na sociedade ganha um foco mais nítido quando os efeitos de longo prazo das decisões estratégicas são considerados, porque os investimentos de longo prazo tendem a alinhar os negócios com a sociedade.

Alguns dos mais famosos investidores têm realçado, ao longo dos últimos anos, esta tendência que se procura enfatizar, isto é, a prossecução de investimentos sustentáveis e o trade-off que parece existir quando estas linhas de investimento chocam com a necessidade de apresentar resultados a curto prazo. Warren Buffet, Laurence Fink, Paul Polman e Jeff Bezos, entre outros, têm questionado publicamente a busca pelo lucro imediato nas empresas e o dano que daí pode advir em termos da sustentabilidade dos investimentos. Em 2011, Bezos, fundador e (ainda) CEO da Amazon, dizia que “se tudo o que fizermos tiver de dar certo num horizonte de três anos, então estamos a competir contra uma multidão. Mas se estivermos dispostos a investir num horizonte de sete anos, passamos a competir contra uma fração dessa multidão, porque poucas empresas estarão dispostas a fazer isso. Ao alongar apenas o horizonte de tempo, podemos considerar o envolvimento em empreendimentos que, de outra forma, nunca poderiam ser considerados. Na Amazon, gostamos que as coisas funcionem em cinco a sete anos. Estamos dispostos a plantar sementes, deixá-las crescer – e somos muito teimosos”.

Como consumidores, temos um papel central na questão da sustentabilidade, primeiro entendendo as regras do jogo, os desafios e as escolhas com que as empresas se deparam e depois selecionando aquelas que consideramos ter as melhores práticas, que de facto promovam um alinhamento de interesses com as diferentes partes interessadas, com gestores que eventualmente vão, nas suas escolhas estratégias, para além dos meros deveres fiduciários e que mantenham essas práticas ao longo do tempo.

O futuro é, por definição, infinito. Podemos procurar e incentivar o lucro imediato ou um ganho sustentável, e de ambas as formas ter razão. Será uma questão de tempo.