Num momento em que o debate nacional se encontra centrado na Proposta do Orçamento do Estado, torna-se imperativo adotar uma atitude crítica. A Proposta de Orçamento do Estado está, na sua larguíssima parte, vinculada a opções e compromissos previamente estabelecidos. Este resulta da compilação das necessidades dos ministérios, definindo prioridades e delineando o rumo dos investimentos anuais.

Um dos aspetos mais cruciais a considerar é o modelo económico que estamos a promover. A nossa economia permanece, em grande medida, tradicional, linear e ineficaz, pautada pela lógica de extração de recursos, produção, distribuição, consumo e resíduos. Adicionando a esta lógica, a economia portuguesa possui problemas estruturais que se agravam devido a fatores externos à mesma, tais como a ineficiência do sistema judicial, a burocracia excessiva e leis laborais que desmotivam os empresários.

Perante este cenário, é essencial pensar em dois horizontes temporais aquando da construção da Proposta do Orçamento do Estado: (i) no imediato, precisamos de soluções que respondam às urgências do país e aos compromissos eleitorais; (ii) ao mesmo tempo, devemos projetar um rumo de acordo com os modelos considerados mais sustentáveis. O planeamento a longo prazo exige uma mudança de paradigma, que valorize a eficiência no uso de recursos e a inovação tecnológica.

A Economia Circular emerge como uma alternativa promissora, ao focar na emulação dos ciclos naturais, onde todos os materiais são reaproveitados. Uma estrutura de solução de sistemas que aborda desafios globais como as alterações climáticas, perda de biodiversidade, desperdício e escassez de recursos naturais. A economia circular não se limita à maximização do lucro, mas visa também a eficiência no uso dos recursos e a redução de desperdícios. Embora não seja uma solução perfeita e não resolva problemas que vão além do âmbito económico, representa uma evolução significativa em relação ao modelo económico linear atualmente predominante. Todos sabemos que, não é possível crescer com materiais finitos, é uma lógica simples e clara.

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Embora o objetivo final seja claro, a transição para uma economia circular não será alcançada apenas com pequenos instrumentos financeiros ou políticas limitadas. A mudança só será efetiva quando todos reconhecerem os benefícios tangíveis deste modelo. Contudo, é necessário ultrapassar obstáculos significativos, como a resistência cultural a mudanças nos hábitos de consumo, a falta de infraestruturas para a reciclagem de materiais complexos e os custos elevados que as empresas enfrentam na fase inicial de adoção de práticas circulares.

É essencial criar novos modelos de negócio, cumprir os compromissos assumidos. Para incentivar a transição, poderiam ser aplicados instrumentos fiscais específicos, como isenções de IVA em produtos reciclados ou deduções em IRS para cidadãos que adquiram produtos de origem sustentável. Adicionalmente, poderia haver apoio financeiro direto para empresas que invistam em processos circulares, como a reutilização de materiais e a produção de bens reparáveis. Só assim será possível tornar a Economia Circular atrativa, tanto para as empresas como para os cidadãos, colocando-os no centro da discussão.

Neste sentido, é imprescindível que as políticas públicas e os incentivos fiscais incorporem este modelo económico promovendo a sua implementação de maneira justa e inclusiva, e assegurando a disseminação eficaz de informação para facilitar a sua adoção nas empresas. Atualmente, uma parte significativa da indústria que afirma adotar processos de economia circular, na verdade, não os implementa, procurando, contudo, tirar partido de incentivos fiscais. Tal situação é desmotivante para aqueles que se esforçam por ir além de meras declarações, comprometendo-se efetivamente com a mudança.

A reforma económica de Portugal deve ir ainda além do Ministério da Economia, envolvendo áreas como a Justiça, Finanças, Educação, Ciência, Ambiente e Energia, com soluções que ultrapassem diagnósticos superficiais. Os decisores políticos precisam ouvir as necessidades da sociedade e reestruturar as chefias das entidades públicas, onde a estagnação favorece a corrupção, o abuso de poder e a falta de transparência.

Persistir em tradicionalismos ineficazes não pode ser uma opção. Um Portugal mais verde, inclusivo e resiliente depende da modernização económica e da resolução de problemas crónicos, como a ineficiência judicial e a burocracia.