É com tristeza e com desolação que afirmo que somos uma carneirada e a primeira protagonista desta carneirada é a Assembleia da República.
Se escrevo sobre este tema é porque acredito que tudo isto um dia vai passar, que virão dias melhores. Ainda não batemos no fundo, mas para lá caminhamos com a imposição da eutanásia, da educação subjugada à ideologia, do endeusamento de ideias que não podem ser contestadas sem que passemos a ser acusados na praça pública de racistas, xenófobos, machistas, fascistas, etc. Mas depois de bater no fundo viremos ao de cima de novo, feridos pelos nossos próprios erros, mas determinados a curar feridas. Foi assim no pós guerra, no pós queda do muro de Berlim e será assim no pós ditadura do consenso e da linguagem.
A carneirada que refiro é a necessidade que todos sentem de se mostrar indignados com aquilo que os media dizem que é digno de indignação, é a obrigação de aceitar rótulos perante determinados comportamentos, é o medo de dizendo ou fazendo diferente ser condenado, rotulado e assim ficar acabado, morto! São exemplo disse alguns factos recentes que me levaram a escrever este desabafo:
1 O caso Joacine/Ventura: O André Ventura, perante a proposta, que do ponto de vista dele e de muitas outras pessoas é absurda, de entregar património museológico a Angola disse que seria boa ideia devolver a Joacine. Se não foi exactamente assim foi muito parecido. Não me prendo a pormenores.
Ora bem, o deus consenso a que obedece a comunicação social decretou que esta intervenção era racista. No País da carneirada, se uma afirmação é decretada racista só existem dois caminhos: ou repudiar o Ventura racista ou ser racista. Assim sendo não resta outro caminho senão repudiar o Ventura racista.
Se não vivêssemos na república da carneirada, podia haver quem dissesse que o Ventura foi malcriado, incorrecto, desrespeitador de uma pessoa eleita pelo povo ao usar de uma ironia para ilustrar o seu ponto de vista. É o que me parece que aconteceu no episódio Joacine/Ventura. Mas isso quer dizer que ao discordar do veredicto de que o Ventura é racista, se passa automaticamente a racista.
Será que podemos estar de acordo sobre outros adjectivos para o Ventura? É inconveniente, é malcriado, tendo em conta a posição que ocupa. Será que podemos ser livres de discordar do modo como fala sem sermos nós mesmos também racistas ao achar que ele não é racista?
A AR não se atreve, tem medo de contrariar o consenso. É mais fácil dizer só que também repudiam e com isso manter o nível de abstenção dos portugueses em 50% porque sentimos que não nos merecem respeito.
Ainda sobre o caso Joacine/Ventura, gostava de dizer que considero também igualmente malcriado e digno de repúdio que haja deputadas que pintem as unhas durante a sessão do parlamento, que haja muitos deputados que digam mentiras nos seus discursos, que haja deputados que finjam que lá estão, aldrabando o registo, só para não ter falta. Não vi que fosse votado um repúdio colectivo para esses casos, todos mais graves do que o caso Joacine/Ventura.
2 O caso da paridade no parlamento e nos órgãos do partido: vejo com vontade de rir pelo ridículo da situação que os mesmos que impõem a paridade (mesmo número de homens e mulheres) no parlamento votam que o número de “lugares” no casamento não obedeça à dita paridade. Sim, temos que ter tantos deputados como deputadas, mas podemos ter só maridos ou só mulheres no casamento e só pais ou só mães na família! Se isto não fosse verdade era de rir mas assim é de chorar pelo mal que nos faz e pela estupidez com que vamos engolindo toda esta palhaçada.
Neste caso que referi, tivemos um episódio recente, fora da AR, mas dentro do ambiente da política: o número de lugares atribuídos a mulheres na direcção ou órgão directivo do CDS. O Francisco Rodrigues dos Santos foi eleito de forma surpreendente. É novo, é arrojado, não está agarrado aos históricos do partido, tem ideias novas, frescas! Eu gostava de as ver questionadas, mas não, o que interessa aos comentadores políticos é o número de mulheres da equipa. E agora? Ou somos dos bons e o acusamos de machista ou somos dos maus porque também somos machistas.
O que penso que acontece, e que infelizmente nem o Francisco Rodrigues dos Santos conseguiu explicar bem, é que o líder do CDS não faz discriminação de sexo. Tem critérios de qualidade, mérito, personalidade, conhecimento que devem ser preenchidos por pessoas. Essas pessoas podem ser de qualquer dos dois sexos que a humanidade tem, podem ser de qualquer cor de pele, de qualquer estado civil, de qualquer idade e de qualquer outra coisa qualquer desde que tenham o perfil que ele definiu.
Se existem mais homens dentro do CDS com esse perfil do que mulheres, é questão das mulheres com esse perfil se inscreverem no CDS, mas isso está na liberdade de cada mulher e não na ditadura da paridade.
Julgo que estes dois casos chegam para ilustrar os tempos perigosos que vivemos e foi para deixar esse alerta que escrevi estas palavras. Estejamos atentos aos jogos de palavras, aos raciocínios viciados, aos juízos impostos por um qualquer consenso que destrói a nossa liberdade de pensar.