Chegados à véspera das eleições é trágico constatar que esta foi uma legislatura verdadeiramente perdida. Nos últimos quatro anos o Governo falhou as suas metas de investimento público, aumentou a carga fiscal para máximos históricos, arrasou o serviço nacional de saúde e transportes públicos e foi no mínimo irresponsável na gestão dos grandes desastres. Mas porventura um dos maiores falhanços do Governo socialista apoiado pelas esquerdas, foi ter olhado para um país que estava a começar um caminho de sustentabilidade e de robustez e ter ignorado, e até revertido medidas que procuravam transformar Portugal num país de oportunidade para todos.
A desigualdade de oportunidades é visível de forma trágica no país que arde, sobretudo no interior, nos bairros de pobreza, nos jovens que não conseguem constituir família nem sair de casa dos pais e vêm os seus projetos de vida adiados, nos idosos que têm de escolher entre aquecer as casas ou comprar medicamentos.
E tudo isto se reflete nos indicadores de desigualdade de rendimento, onde Portugal continua a comparar muito desfavoravelmente com o resto da Europa. Por exemplo, em 2017 os 20% mais ricos tinham um rendimento 5,7 vezes superior aos 20% mais pobres. Portugal era o sétimo país da União Europeia onde este rácio era mais elevado. Era também o sexto país com o maior risco de pobreza no trabalho, com uma taxa de risco de pobreza entre trabalhadores superior a 10%. Ou seja, um em cada dez trabalhadores é incapaz de melhorar a sua condição de vida e não pode sequer oferecer as bases da mobilidade social aos seus filhos.
Infelizmente, nos últimos quatro anos, sob a aparência bondosa de defender algum grupo, a maioria de esquerda muitas vezes optou por medidas que não são mais do que uma forma de acentuar as desigualdades e de, ao mesmo tempo, aumentar a conflitualidade na sociedade. Muitas pretensas soluções servem apenas o propósito de implementar uma visão estatizante da sociedade, em que não pode haver nada fora do controlo desta maioria. E na mesma passada destroem as oportunidades para milhares de pessoas de conseguirem alguma mobilidade social.
É urgente abandonar esta visão e escolher um caminho diferente para Portugal. O que se exige dos políticos é que procurem ter uma intervenção eficaz e eficiente em três pilares: o acesso a bens e serviços públicos com qualidade, a promoção da eficiência dos mercados, o desenvolvimento de mecanismos de fiscalidade e de solidariedade que evitem distorcer o funcionamento dos mercados.
Os bens e serviços públicos, como a educação ou a saúde, têm de servir efetivamente as pessoas. O envelhecimento da população vai aumentar muito a procura por cuidados de saúde — o FMI estima que a despesa em saúde aumente para 5,7% do PIB até 2050, até alcançar 8% do PIB em 2100. A reversão das quarenta horas na função pública vai no sentido inverso ao que é necessário para responder ao aumento da procura destes serviços, pondo em perigo o caminho notável que Portugal realizou nas décadas desde a democracia para generalizar o acesso. A cegueira que leva a esquerda querer acabar com as PPPs nos hospitais afeta maioritariamente quem não consegue aceder a cuidados de saúde privados, adiando análises, cirurgias, tratamentos por vezes cruciais.
Por outro lado, embora o número de crianças e jovens esteja a diminuir, a crescente concorrência internacional exige que melhoremos significativamente a qualidade do nosso ensino. A esquerda unida comprometeu as oportunidades de milhares de crianças quando, de uma forma puramente ideológica, decidiu acabar com os contratos de associação na educação, que beneficiavam centenas de famílias com menos meios financeiros. Temos de quebrar o círculo vicioso nos bairros problemáticos servidos por escolas que ensinam muito pouco e criar mecanismos atrativos para os melhores professores serem incentivados a trabalhar com alunos mais difíceis.
É crucial pôr todos os meios à disposição destes desafios, por isso a separação artificial entre prestadores públicos ou privados é ideológica, sectária e perversa.
Relativamente à eficiência dos mercados, Portugal teve um desenvolvimento assinalável, nomeadamente com algumas reformas do anterior Governo. No entanto, continua muito atrás da média da OCDE em dois de seis indicadores: barreiras elevadas à entrada nos setores dos serviços e falta de eficiência e complexidade da regulação. O mercado do arrendamento é ilustrativo dos problemas gerados pelo mau desempenho nestes dois indicadores. Esta maioria de esquerda reverteu várias medidas do anterior Governo que pretendiam flexibilizar um mercado altamente distorcido, o que tem o efeito perverso de dificultar o acesso daqueles que pretensamente se quer ajudar, porque resulta em condições mais difíceis para os que procuram alugar uma casa, as pessoas com rendimentos mais baixos, os estrangeiros e jovens, são os que mais dificuldades encontram, por exemplo por serem confrontados com a necessidade de um fiador para a renda. Para além do mais, a rigidez do mercado de arrendamento desincentiva também a mobilidade dos trabalhadores, limitando a capacidade de fazer face aos choques económicos.
Quanto à eficiência da máquina fiscal, a Tax Foundation analisou os sistemas fiscais dos países da OCDE em 2018 com base em dois critérios: a competitividade face a outros países e a neutralidade do sistema, isto é a ausência de distorções como por exemplo o favorecimento do consumo em detrimento da poupança ou o favorecimento de certos grupos de atividades. Portugal é o quarto país menos competitivo globalmente e o terceiro menos competitivo na fiscalidade das empresas. O indicador aponta a complexidade do sistema fiscal como um dos principais problemas. Não só a falta de competitividade afeta o desempenho das nossas empresas exportadoras, como desincentiva o investimento estrangeiro em Portugal.
Nas prestações sociais, o custo para um desempregado português entrar no mercado de trabalho, ao perder o subsídio de desemprego e outros benefícios e apoios sociais, ainda era em 2018 superior à média da OCDE e da UE. É necessário reduzir estes desincentivos à entrada no mercado de trabalho.
Estes são apenas alguns exemplos de bloqueios que têm custos reais em termos de prosperidade e de bem-estar. Mudá-los tem um preço no curto prazo que devemos compensar, mas a dificuldade da tarefa é proporcional à sua urgência, para que Portugal possa ser um país de oportunidade e de criação de valor. Sabemos que cada pequeno passo que dermos na criação de oportunidades abre um novo caminho para um jovem, para um imigrante, para um desempregado, que irá contribuir para a prosperidade de todos. É urgente mudar o rumo, e com estas esquerdas não vamos lá.