Mais três pessoas assassinadas a tiro à luz do dia, em Lisboa. Recuemos duas semanas ao debate no Plenário da Assembleia da República sobre O Estado dos Estabelecimentos Prisionais suscitado pelo Partido Chega a propósito da fuga de cinco reclusos da prisão de alta segurança de Vale de Judeus (18-09-2024). Foi um momento fundamental sobre o que está a acontecer com a criminalidade em Portugal. Consideremos o básico: ou crime é em absoluto excecional ou o crime é um fenómeno social. No último caso, há responsabilidades políticas, culturais, institucionais objetivas e corrigíveis.
Vivemos o amadurecimento de um fenómeno endémico nas últimas décadas que apenas entrou na fase de invasão ostensiva do quotidiano pela mimetização de manifestações cada vez mais violentas, assassinas, socialmente destrutivas. Tal jamais aconteceria se o Parlamento não fosse o coração político dos dias que vivemos. Depois dos donos do regime terem banido o ideal de autoridade da vida social, um valor humano e civilizacional tão democratizável (a pais, professores, polícias, mais velhos…) quanto a liberdade ou os direitos humanos, a mesma casta parlamentar arrastou-se décadas a ignorar ou a instigar o agravamento da indisciplina nas escolas, a escapar ao combate frontal à pequena corrupção nas autarquias ou a agressões ao património urbano em forma artística de grafitis, a instigar o culto da desobediência à figura social do polícia misturado com acusações histéricas de racismo e xenofobia, a promover um sistema judicial em rota persistente de suavização de penas e libertação célere de condenados, entre outros sintomas.
Em qualquer tempo e lugar, quando o monstro do crime violento se vai tornando endémico é tão-só a ponta do icebergue de pequenos males de desregulação de atitudes e comportamentos. Estes são da responsabilidade de instituições identificáveis, as condicionadas pela classe política (tribunais, parlamento, autarquias, escolas, prisões, entre outras), males que se vão massificando e sobrepondo a cada nova geração. Não é possível precisar quando, mas a sabedoria popular marcou o ponto de viragem pela expressão: as prisões são escolas do crime. O pináculo da desistência do Estado de corrigir comportamentos socialmente disruptivos, isto é, do Estado que desistiu de ser Estado. O pequeno grande detalhe que falta é retirar da penumbra que tais escolas são filhas de uma universidade: o parlamento é a universidade do crime.
As prisões mais não são do que intérpretes ultrassensíveis do meio político e social envolvente. Quem tiver dúvidas, sobretudo se possuir alguma idade, que puxe pela memória para interpretar os discursos políticos que há meio século mudaram profundamente a relação das pessoas comuns com o crime e com a figura social do criminoso, sobretudo se compararem com o aconteceu, no mesmo período, à figura social do polícia. Do mesmo modo, não custa associar a omissão da opinião pública de pertenças raciais, étnicas ou religiosas de determinados criminosos à refinada universidade parlamentar do crime.
Seria impossível uma sociedade das mais tranquilas e pacíficas do mundo, dos maiores ativos civilizacionais dos portugueses, transitar de repente para um quotidiano, o atual, em que as pessoas se sentem coagidas a terem de se adaptar a uma névoa que se adensa de notícias e, pior, práticas de assaltos violentos, assassinatos, agravamento da insegurança urbana e suburbana, posse corriqueira de armas de fogo, delinquência juvenil, seis alunos esfaqueados por um colega de 12 anos, perseguição hollywoodesca na Ponte Sobre o Tejo, homem com uma faca de grandes dimensões que assalta o Minipreço da Cova da Piedade, três pessoas assassinadas a tiro à luz do dia na Penha de França (Lisboa), por aí fora.
Dentro e fora do parlamento, o que vemos são os adversários do Chega em uníssono a tentarem desfazer a relação entre o agravamento do crime, a pertença étnica cigana e sobretudo o aumento da nova imigração. O último fenómeno é, de facto, o acelerador da mudança do contexto social que mimetiza o crime e o crime violento.
Mais do que a questão cigana, já cá estava, é para a imigração que se tem de olhar. O grosso dos novos imigrantes é oriundo de sociedades tornadas violentíssimas no último meio século: sul-americanas, africanas, árabes ou indostânicas. Esse é o mimetismo mais ameaçador para onde tem de olhar que use, de facto, a moral e a razão para enfrentar e resolver problemas.
Nenhuma sociedade humana jamais poderá normalizar o roubo ou a violência com a desculpa de ser pobre. A realidade sempre impôs o inverso. Por terem normalizado essas práticas a toque-de-caixa dos ideais de esquerda contra os ricos, os povos do hemisfério sul afundaram-se na pobreza, isto é, o crime e a violência geram pobreza. Novos imigrantes apenas habituados a viver em tais contextos originários encontram, na Europa atual, níveis sem precedentes de tolerância e laxismo à violência e ao crime.
Acontece que agora chegam a uma Europa que abandonou o poder dissuasor da cesura social e, consequentemente, da repressão judicial e da repressão penal do crime e da figura social do criminoso. Por exemplo, na imprensa massificada o ilegal, ladrão, corrupto, agressor ou assassino é muitíssimo melhor tratado do que a extrema-direita (nunca percebi o que seja). Está em causa a subversão mental da velha tradição europeia imposta justamente a partir do discurso parlamentar hegemónico da esquerda, ao qual a direita fofinha se subjugou. Por ser assim, os novos imigrantes sentem-se como peixe na água, não para se ressocializarem emendando os maus vícios das suas sociedades originárias, antes para reproduzi-los e apurá-los na terra dos outros.
Tudo muito claro no debate sobre O Estado dos Estabelecimentos Prisionais, a 18 de setembro último. Não foi por acaso que o Partido Chega ficou isolado na defesa e proteção das vítimas dos criminosos como dever primordial do Parlamento, assim como por ter considerado que o humanismo e a qualidade dos serviços prisionais são aferidos pela qualidade das condições de trabalho dos guardas prisionais e, não menos, que as prisões existem para a punição justa, efetiva, sem cedências de quem comete crimes.
Contra essa que é a velha tradição portuguesa e europeia, opuseram-se de forma ostensiva todos os partido de esquerda (PS, PCP, BE, Livre, PAN), e de forma envergonhada, a direita fofinha (PSD e IL). Estes não saíram da cartilha que conduziu o país à situação atual: primordial é a reinserção social do criminoso (que se lixe a vítima!) e a rejeição da cultura punitivista de que acusam o Chega (as pessoas comuns que se habituem ao crime!). Logo, nesta universidade parlamentar do crime o valor social atribuído ao criminoso é muitíssimo superior ao valor atribuído à vítima e, não menos, ao polícia e ao guarda prisional (era o caso do último que estava em discussão).
Em tal caldo político, antes do sujeito cometer qualquer crime e, na eventualidade de no futuro isso ocorrer, são lhe dadas garantias parlamentares absolutas de que o regime irá protegê-lo com tudo o que tem. Essas garantias incluem proteger o criminoso de todo e qualquer sentimento de remorso, arrependimento e culpa, isto é, o dever primordial imposto aos sistemas judicial, policial e prisional é o de fazer com que se sinta bem consigo mesmo desde o primeiro minuto de detenção. A comunicação social ou os meios culturais e artísticos nem sequer estão moldadas para serem neutros, discretos ou plurais, antes e apenas para seguirem a lógica de pensamento único imposta pela cultura política parlamentar.
Tal superproteção torna difícil a quem comete um crime elevar-se ao nível de sujeito moral, isto é, ao nível de pessoa que procure por si e para si mesma restaurar os seus sentimentos humanos na relação com os demais seres humanos como ela. É o que hoje torna a cultura política do crime da classe parlamentar dominante (PSD, IL, PS, PCP, BE, Livre, PAN) o muro que impede a quem comete crimes atingir o que Freud designou por princípio da realidade: aprender a suportar a (sua própria) dor e adiar a recompensa (a si mesmo). O Partido Chega está em rotura com essa cultura política do crime.
Uma vez cometido o crime, sem que o sujeito tenha tido tempo de sedimentar a consciência do que passou a ser, criminoso, o Parlamento já se antecipou garantindo-lhe que é a Sociedade, não ele, criminoso, que tem de assegurar a sua reinserção. Portanto, a universidade parlamentar do crime transforma a vítima em agressora (sociedade) e o agressor em vítima (criminoso). O nome disto é subversão mental das populações.
Essa cultura política do crime transformou as prisões em reprodutoras sociais do crime porque habitua criminosos devidamente condenados a entrarem no estabelecimento prisional com a certeza inconsciente, por vezes também consciente, de que é a sociedade que está em dívida com eles. Quando saem, o racional e lógico é irem à procura de receber depressa essa dívida social, o que faz com que o sujeito se convença que esteve a acumular juros a seu favor no período de reclusão. Libertado, a via mais rápida que conhece de reerguer a sua vida social reaproxima-o da fronteira do crime cuja gravidade moral, intelectual e cívica nunca percebeu nem sequer na prisão, até porque vinha de uma escola que também nunca lhe ensinou, desde a infância, a fronteira clara entre o cumprimento de regras básicas e as respetivas consequências em caso de indisciplina escolar.
É tempo de os portugueses forçarem a universidade parlamentar do crime a deixar de o ser. Basta exigirem a renovação profunda do discurso parlamentar sobre o crime e o criminoso – em sentido inverso sobre a vítima, o polícia e o guarda prisional –, assim como o controlo severo da imigração não-europeia para que os portugueses não continuem a ver a sua vida quotidiana contaminada por hábitos importados de sociedades violentíssimas por cumplicidade da sua classe política.