Em poucas semanas, o local de trabalho da maioria de nós mudou. Teletrabalho, home office, remote work, e tantos outros anglicismos permitem caracterizar aquilo que era apenas uma realidade para poucos, utopia para muitos. As guerras obrigam a humanidade a transcender- se, a inovar rapidamente. Apesar das vítimas humanas, a II Guerra Mundial ficou marcada por vários avanços tecnológicos. A evolução dos sistemas de criptografia, indispensáveis no mundo de hoje, é apenas um exemplo. Por outro lado, a Guerra do Covid-19 será lembrada pela massificação do teletrabalho. Estará disseminado, será quase uma norma para muitas empresas, e uma prática recorrente para outras.

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Uma tendência iniciada por empresas tecnológicas e seguida por grandes multinacionais, enquanto as empresas mais tradicionais tardavam em fazer o shift para um novo paradigma. Um contexto em que a localização física de um trabalhador, para determinadas funções, será acessório, quase irrelevante. Agora, não será apenas um fator de diferenciação, será um imperativo de sobrevivência de mercado. O medo de morrerem foi o trigger chave para as empresas fazerem aquilo que nunca fizeram, que sempre adiaram ou, até, para o qual sempre se opuseram. A realidade, mesmo que dura, veio mostrar que é possível. Aquelas que já fizeram a evolução nos últimos anos beneficiam da vantagem temporal, da maturidade dos processos e de terem feito a mudança gradual por iniciativa própria, e não por imposição de um novo contexto adverso de mercado global. Mais do que um desafio tecnológico, é um desafio cultural – significativamente mais complexo.

Esta mudança será acelerada quando as empresas potenciarem-na como uma oportunidade de serem mais eficientes, de emagrecerem. E não é apenas no sentido figurativo. Ao longo de décadas, as empresas converteram os seus grandes escritórios – com inúmeros gabinetes e salas – em amplos open spaces com elevada densidade de trabalhadores por metro quadrado. Uma transformação feita, naturalmente, para “melhorar o trabalho em equipa”. Pelo menos, era isto que se tentava promover. Os benefícios para a produtividade dos open spaces são discutíveis (vários estudos questionam os seus resultados) porque, na verdade, o principal propósito foi outro, também legítimo: poupar custos, reduzindo a dimensão dos escritórios – particularmente crítico para empresas localizadas em importantes centros urbanos – e tornando-os mais flexíveis, com menos barreiras físicas. Agora, assistiremos a uma segunda fase desta evolução. Muitos open spaces também serão extintos, reduzindo ao mínimo os escritórios.

A morada das empresas será, cada vez mais, uma mera obrigação fiscal. Cada um de nós levará um pouco da sua empresa para um local diferente: o home office, o cafe office, o garden office. Primeiro, as empresas começaram por enviar os seus documentos, as aplicações e contas de email para a cloud, reduzindo o peso das suas infraestruturas tecnológicas, melhorando ainda a qualidade do serviço. Agora, são os trabalhadores que rumam para uma pseudo-cloud, reduzindo a dimensão dos escritórios e transportando parte dos custos para as suas casas: eletricidade, água, internet, desgaste de mobiliário e imobiliário.

As crises são também filtros. Passam nesse filtro os agentes económicos que se conseguem adaptar e reinventar, ficam pelo caminho os restantes. O mesmo se aplicará aos trabalhadores. Aqueles que se adaptarem, podem transformar este novo contexto desafiante numa situação win-win – benéfica tanto para as empresas como para os próprios – onde os limites geográficos no acesso ao mercado de trabalho dissipam-se. Outros, queixar-se-ão dos capitalistas que os mandaram para casa com supostas menores condições de trabalho. De que lado querem ficar?

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