Com a guerra na Ucrânia, a escalada da tensão no médio oriente, a imprevisibilidade do resultado nos Estados Unidos, e num ano determinante para a execução do PRR – para além de uma série de outras conjunturas que exigem estabilidade política em Portugal –, ninguém entenderia que o país fosse novamente a eleições, por chumbo do Orçamento de Estado.
Aliás, a larga maioria dos partidos com assento parlamentar já vieram assumir não ser do interesse do país a realização de novas eleições. Aqui chegados, a questão que se coloca é: por que razão o governo liderado por Luís Montenegro não tem, à data, o garante da viabilização do orçamento?
Por arrogância do governo? Por falta de comunicação?
Ou estaremos por detrás de outras razões (mais conjunturais), num momento em que a política portuguesa vive num novo ciclo? Pois é justamente isso do que se trata, um novo ciclo na democracia portuguesa.
Um Partido Socialista necessitado de catarse
Alexandra Leitão, uma das pontas de lança da nova entourage do PS, em novembro de 2023 defendia que os partidos, sistemas e instituições deveriam ter feito uma autorreflexão no pós Socratismo.
Não posso estar mais de acordo. E este novo PS? Já fez a sua autorreflexão no pós Costismo?
- O legado de António Costa foi bom para a democracia portuguesa?
- A constituição da geringonça, com o alterar da norma de quem vence governa, foi bom para a democracia portuguesa, ou apenas para a esquerda?
- E sobre a decapitação do Estado Social, com as sucessivas cativações na saúde, educação e forças de segurança?
- E sobre as contrapartidas ao Bloco e Partido Comunista, como a extinção do SEF, e estoirar de 3,2 mil milhões de euros na TAP?
- O descontrolo na imigração?
- O aumento da insegurança, conforme se pode confirmar nos diversos relatórios;
- O degradar das diversas instituições do Estado quer por via da partiridização da administração pública, quer pelo nepotismo reinante em governos PS com pais, mães e filhos no mesmo governo?
- E que dizer do advento da dita extrema-direita, fruto do abrir de flanco à esquerda radical, nomeadamente ao Bloco, com as suas guerras culturais?
Nunca esquecer que foi durante o mandato de António Costa que o CHEGA nasceu, cresceu e floresceu em Portugal. Se Costa tivesse governado bem, tal não se verificaria. Sendo que, não descarto a responsabilidade do PSD, que nunca foi alternativa por força de uma atípica liderança.
O Partido Socialista minou a democracia portuguesa
Convém recordar que o PS, em apenas dois anos, perdeu mais de 500 mil votos, e mais de 40 deputados.
Convém não esquecer que após ganhar em 2022 (com maioria absoluta) o PS desbaratou a confiança dos portugueses com sucessivos casos de corrupção no seio do governo, e degradação das instituições do Estado, que culminaram com a descoberta de mais de € 75 000 na residência oficial do Primeiro-ministro.
O facto é que o Partido Socialista salda nove anos de governação com 4 milhões de portugueses em pobreza relativa, dois em pobreza absoluta, mais de 600 mil novos imigrantes (entre 2015 e 2023), mais de um milhão de jovens emigrados, um mercado de habitação inacessível à larga maioria dos portugueses, um serviço nacional de saúde em rutura, um salário médio cada vez mais próximo do mínimo, e toda uma administração pública insatisfeita.
Em suma, um país à beira do caos.
O voto de 1 milhão e 200 mil no CHEGA, numa das eleições legislativas mais concorridas dos últimos 30 anos, foi um sério aviso, não à democracia portuguesa, mas ao regime dos últimos 50, do quanto os portugueses estão fartos, não da democracia, mas deste estado de sítio onde muitos não reveem. Como é possível continuar a negar o aumento da criminalidade? e violenta.
A diabolização do CHEGA, a título de exemplo, é um dos maiores trunfos que a esquerda instituiu no mainstream político (com inqualificável compadrio dos midia) que visa apenas a perpetuação da esquerda no poder. No CHEGA criaram o seu diabo, do qual apenas eles serão a cura, quando em bom rigor, são eles a doença, sobre o qual padece a democracia portuguesa.
Porventura, uma das maiores armadilhas na história da democracia portuguesa.
E que tal um pouco de cultura democrática?
Aqui chegados, e mesmo após perder as eleições, o Partido Socialista insiste em querer governar, procurando influenciar as decisões do governo nas diversas instituições publicas e cargos de influência.
Foi assim quando Maria Luis Albuquerque foi indicada para Comissária Europeia, com a eurodeputada Marta Temido a considerar que democracia estaria em risco por o PS não ter sido consultado…
Foi assim quando o atual governo nomeou o novo Conselho de Administração do Garcia da Horta, com a presidente da Câmara Municipal de Almada em rasgar de vestes por não ter sido consultada…
E foi assim na Assembleia da República, quando conjuntamente com o CHEGA, aprovaram uma série de medidas no valor de 700 milhões deixando menos margem para que o atual governo possa impor a sua agenda no país. É uma outra forma de condicionar o PSD.
PSD, o adulto na sala
Compete ao PSD governar, e governar bem, sem os condicionalismos ideológicos instituídos pela esquerda nos últimos anos.
Sabendo de antemão do radicalismo ideológico da extrema-esquerda – que vota mesmo sem conhecer o orçamento em causa – é de se esperar mais dos partidos mais votados (PS e CHEGA) maior sentido de Estado, colocando interesses do país à frente dos interesses partidários, ou projetos pessoais.
O justificativo de estarmos perante um governo minoritário, que é obrigado negociar com os outros partidos, não colhe. Com todo o devido respeito, mas negociar mais o quê, tendo em conta que o próximo orçamento já irá comportar € 700 milhões de euros de medidas aprovadas pelo PS e CHEGA durante a presente legislatura?
Se o PS acha que o orçamento será mau (o que não acha, é mera retórica política), e se considera que não faz sentido o país ir a eleições, apenas lhe resta viabilizar o orçamento, abstendo-se.
O novo ciclo que assusta o Largo do Rato
O facto é que o Partido Socialista, ao longo dos últimos 30 anos, enquanto partido com mais tempo no poder no governo da República -, não se tem pautado pelo superior interesse de Portugal e dos portugueses. Tornou-se num partido que vive pelo poder, para o poder.
A questão é que em menos de cinco anos o PS deixou de governar nos Açores, de governar Lisboa e governo da República. Se o orçamento passa, e perspetivando-se um mau resultado do PS nas próximas autárquicas, o Partido Socialista arrisca-se a passar uma longa travessia no deserto do poder.
O PS não quer aprovar o orçamento por ser mau.
O PS teme aprovar por considerar que este poderá ser o princípio do fim do regime socialista que nos últimos trinta anos arregimentou os corredores do poder no país. Sente que o governo de Luis Montenegro está realmente empenhado em transformar o país, resolvendo os problemas que o PS não resolveu, expondo assim os anos perdidos com a governação de António Costa desde 2015, somando a bancarrota de Sócrates, e o pântano político de Guterres.
E é justamente isto o que está aqui em causa.
Mas é bom que o PSD governe bem. O CHEGA espreita….